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Quatro métricas fáceis de entender dão a dimensão do sucesso do Pokémon Go, o joguinho para smartphone que ex-plo-diu nos EUA, Austrália e Nova Zelândia — os únicos mercados onde está disponível no momento — beatificando a ação da Nintendo (alta de 72% em uma semana) e recolocando uma empresa com sérios desafios estruturais de volta no mapa dos investidores.

1) Nos EUA, o Pokémon Go já tem mais que o dobro de downloads do Tinder (um outro tipo de jogo, muito mais perigoso e de resultados imprevisíveis…);

2) 60% dos usuários de Android que tem o Pokémon Go instalado jogam todos os dias;

3) Cada usuário tem gasto 43 minutos por dia no joguinho japonês (chegando perto dos 50 minutos que as pessoas gastavam no Facebook);

4) ‘Pokémon Go’ chegou a ser mais buscado essa semana no Google do que qualquer termo pornográfico, incluindo este que você pensou aí agora.

Em suma: o sucesso do Pokémon Go chega a ser obsceno.

Se você tem mais de 40 anos e não tem idéia do que é Pokémon, segue uma breve explicação.

(Se você já conhece, pule este parágrafo.)

Originalmente chamado “Pocket Monsters”, Pokémon é um série de videogames iniciada em 1996 com o lançamento de dois jogos para o Game Boy (o primeiro videogame portátil da Nintendo). No game, o jogador é um menino que viaja por um mundo em que existem monstrinhos, os pokémons, que podem ser capturados jogando-se bolas (as “Poké Balls”). Cada pokémon possui habilidades específicas de sua espécie, e ele se torna mais forte conforme é treinado pelo seu dono; os pokémons treinados podem então ser usados em batalhas contra outros treinadores de pokémons (jogadores). O ‘pulo do gato’ do Pokémon inicial foi o lançamento simultâneo de dois jogos diferentes, cada um contendo monstrinhos únicos, obrigando os jogadores a batalhar com seus amigos para completar sua coleção de pokémons.

O Pokémon Go segue a mesma lógica do Pokémon original, com uma grande diferença: agora, o jogador precisa caminhar no mundo real para capturar seus pokémons, apontar e lançar a Poké Ball sobre o monstrinho a partir da câmera de seu celular.

A Nintendo era dada como carta fora do baralho até a semana passada. Depois de ter sido a vencedora da primeira geração dos videogames (a Sega, sua grande concorrente nos anos 1990, parou de vender consoles em 2001), a empresa passou a ter vida dura com a chegada do PlayStation da Sony e o Xbox da Microsoft. Em 2006, a Nintendo conseguiu respirar: o lançamento do Wii reenergizou a empresa, que conseguiu empacotar velhas franquias como Mario, Zelda, Donkey Kong e o próprio Pokémon para novos usuários. 

Nos últimos anos, a empresa vinha buscando uma forma de participar do entretenimento familiar, mas deu murro em ponta de faca ao produzir jogos exclusivamente para seus consoles (a maioria deles verdadeiros fracassos comerciais). Muitos analistas tinham como certa a falência da empresa, e apostavam que concorrentes como a Rovio (dona do Angry Birds) e a Zynga (desenvolvedora do FarmVille, jogo do Facebook) iam desferir o golpe de misericórdia numa Nintendo decadente.

Com o Pokémon Go, tudo muda. Aqui nos EUA, já é normal encontrar crianças, pais, e até executivos de terno e gravata caçando monstrinhos no meio da rua, a qualquer hora do dia e da noite. Como é necessário caminhar bastante (em alguns casos, vários quilômetros) para se evoluir no jogo, há quem diga que o Pokémon Go é a melhor resposta já encontrada contra a ‘epidemia de obesidade’ mundial.

Para além da hype envolvendo o Pokémon, seu sucesso oferece duas lições para o mundo da tecnologia e da estratégia empresarial.

A primeira é de que, sim, ‘content is king’: a alta de 72% na ação fez a Nintendo ganhar US$ 12,5 bilhões em valor de mercado (hoje, a empresa vale US$30 bi).

Como a companhia é dona de um terço da The Pokémon Company, dona dos direitos sobre a franquia, há quem diga que a franquia Pokémon, sozinha, teria sido avaliada em US$ 37,5 bilhões pelo negócio – ou seja, que somente a franquia Pokémon vale mais que uma Nintendo inteira.

Mas esta conta seria muito simplista. Além do mercado reconhecer o valor da propriedade intelectual, a valorização da ação mostra o quanto a Nintendo destruía valor – ou, na melhor das hipóteses, deixava de criar – ao insistir em sua fórmula obsoleta de tentar dominar todos os canais de distribuição.

A segunda lição é um corolário da primeira: o mercado recompensa uma empresa corajosa o suficiente para se reinventar. Com o Pokémon Go, a Nintendo acertou ao dar acesso a uma de suas franquias premium por plataformas (como o mobile) que não são dominadas pela própria companhia. Existe aqui uma lição contra a teimosia das empresas donas de ecossistemas fechados, que acham que podem forçar o consumidor a engajar com seus produtos em termos ditados de cima pra baixo, a despeito da existência de alternativas mais baratas e/ou convenientes.

O grande perdedor ainda não mencionado desta explosão pokemônica é o Facebook, que antes sugava as horas ociosas que agora estão sendo dedicadas ao jogo. Como, no entanto, tudo ainda é muito recente, é difícil estimar as repercussões deste sucesso sem precedentes.

O certo, no entanto, é que, em apenas alguns dias, o Pokémon Go obteve um nível de engajamento que gigantes da internet levaram anos (e bilhões de dólares) para conseguir. Estima-se que o app gerou pelo menos US$4 milhões em compras (dentro do aplicativo) apenas no primeiro dia de funcionamento. O maior sucesso de lançamento de um jogo na história terá repercussões profundas na evolução da economia digital.