“Coração Pede Socorro”, o novo single da cantora Naiara Azevedo, parecia mais uma canção sofrência de sertanejo universitário, como tantas que fazem sucesso nas baladas, quando começou a ser tocada nas rádios, no início de novembro: “Não consigo te apagar da minha mente. Ah, esse amor. Deixou marcas no meu corpo. Ah, esse amor. Só de pensar, eu grito, eu quase morroooo.”

Com seus versos românticos e duplo sentido, a canção vinha impactando milhares de pessoas até que o lançamento do videoclipe trouxe a revelação: as marcas no corpo eram violência física – e a própria canção, uma ação da agência Artplan para o Ministério dos Direitos Humanos e a Secretaria das Mulheres.

Um dia depois do lançamento, o vídeo com cenas de um casal brigando foi o quarto mais visto no Youtube Brasil. Hoje já são mais de 3,7 milhões de visualizações – somando as páginas da cantora e do governo. O ROI foi imediato – nos primeiros cinco dias, as denúncias de violência doméstica no Ligue 180 aumentaram 40% –  e a campanha virou case no Twitter global, com a hashtag #vctemvoz.

A mídia espontânea foi massiva.

A cantora lançou o clipe no dia 25 de novembro, Dia Internacional de Combate à Violência contra as Mulheres, nos programa Hora do Faro, na TV Record, e Eliana, no SBT, ambos com audiência majoritariamente feminina. Mais que uma campanha clássica, a ação virou um movimento, diz Duda Moncalvo, diretor da Artplan Brasília. “Quando as pessoas se engajam na causa, o retorno é absurdo.”

Mais de 12 mulheres são assassinadas por dia no Brasil, e manifestações implícitas – quando não explícitas – de violência frequentam com naturalidade as paradas de sucesso, do sertanejo ao funk. A lógica da Artplan: inverter os sinais e usar a própria arte para denunciar a violência.

Uma das três agências que atendem a Secom, a Artplan já vinha estudando o tema da violência doméstica pensando em propor uma ação a algum cliente quando recebeu o briefing do Ministério de Direitos Humanos.

Analisando dados sobre as causas da violência contra a mulher, a agência chegou à tríade: ciúme, possessividade e traição. Mas como entrar nas conversas sobre relacionamento para conectar a mensagem com as pessoas? Com base em mais dados, chegou-se ao insight criativo: O que é o sertanejo, senão digressões sobre relacionamento, amor, ciúme, traição?

Para a própria Naiara Azevedo, a campanha marca a volta a um tema que lhe foi central no início de carreira. Esteticista de formação, ela compôs seu primeiro sucesso – “Coitado” – em uma espécie de resposta-paródia à canção “Sou Foda” da dupla Carlos & Jader, que estourou nas paradas em 2011 com uma mensagem depreciativa às mulheres. “Naiara Azevedo, defendendo a mulherada”, era seu material promocional naquela época.

Além de compor a música a partir do briefing da agência, Naiara também deu a cara a tapa na campanha – no sentido figurado: “Infelizmente, as marcas da violência não saem tão fácil quanto essa maquiagem saiu do meu corpo. Não tenha medo, denuncie”, comentou no Instagram, sob uma foto em que aparece com a cara arrebentada (veja acima).

Abaixo, o clipe da campanha: