Sidônio Palmeira começou a tirar a popularidade do Governo do buraco.
Enquanto a oposição se debate com a condenação de Jair Bolsonaro, o chefe da comunicação do Planalto reorganizou a estrutura da Secom, introduziu parâmetros técnicos nas entregas, e respondeu às sanções da Casa Branca embrulhando o Governo na bandeira nacional.
Desde que assumiu, há nove meses, o ministro recauchutou as redes sociais do Governo e transformou dois temas espinhosos — a proposta de aumento do IOF e as tarifas de Trump — em bandeiras do Lula 3 e da campanha de um possível Lula 4: “justiça social” e “soberania”.
Uma pesquisa da Genial/Quaest divulgada hoje mostra o Governo com seu maior nível de aprovação do ano: 48% dos brasileiros aprovam a gestão do petista e 49% desaprovam. Fortaleceram o Presidente a reforma do Imposto de Renda, o encontro com Trump na ONU e as manifestações contra a PEC da Blindagem.
No mês passado, uma pesquisa da AtlasIntel/Bloomberg também mostrava o Governo com aprovação em ascensão, na casa de 51%.
Agora, o baiano de Vitória da Conquista graduado em engenharia na UFBA — onde começou também a militar na esquerda — terá o desafio de manter relevantes até a eleição do ano que vem as pautas que deram sobrevida ao Governo, enquanto lida com um problema ainda maior: a alta rejeição do Presidente.
Após comandar campanhas presidenciais do PT (Haddad em 2018 e Lula em 2022), Sidônio se tornou um conselheiro informal de Lula e o auxiliou episodicamente durante a primeira metade deste mandato.
Quando o Presidente ficou insatisfeito com a atuação de Paulo Pimenta na Secom, o telefone do publicitário tocou, e ele se tornou o primeiro marqueteiro do partido a assumir a principal cadeira de comunicação do País. (Seus conterrâneos Duda Mendonça e João Santana tocaram o marketing eleitoral, mas nunca deram expediente no Planalto.)
Sidônio tomou posse dizendo que o “segundo tempo” do Lula 3 havia começado e que era preciso melhorar a divulgação das realizações do Governo, centralizar a comunicação em torno da figura do Presidente e ampliar a presença em redes sociais, principalmente Instagram e TikTok.
Para isso, transferiu mais recursos para o digital, criou um núcleo especializado em redes e investiu de forma mais sistemática no chamado marketing de influência, recrutando influenciadores de médio porte ou personagens inusitados, como o apresentador João Kleber.
A ideia era aproximar o Governo dos jovens e dos eleitores menos engajados com explicações acessíveis, diretas e até levemente irônicas — um estilo muito utilizado nos EUA e que a direita vinha capitalizando melhor no País. Uma inspiração é a comunicação de João Campos na prefeitura do Recife.
Segundo um publicitário com trânsito no Governo, outro ponto importante da estratégia consiste na regionalização da comunicação institucional: adaptar tom, linguagem e estética para cada público e região do País.
“O ministro da Secom era um político e passou a ser um técnico. Com isso, a entrega passou a ser técnica antes de ser política,” disse um marqueteiro.
Antes de conseguir implementar suas ideias, no entanto, Sidônio precisou gerir uma lista interminável de crises do Governo: as fake news sobre o PIX; as fraudes no INSS; a demissão do ministro Juscelino Filho; e até falas de Lula que estavam pegando mal com seu próprio eleitorado.
Com a aprovação do Presidente nas mínimas, a oposição chegou a se referir ironicamente a Sidônio como “craque do jogo”.
Apesar disso, as sucessivas gestões de crise deram força ao ministro internamente, permitindo-lhe centralizar decisões de comunicação e anúncios enquanto ampliava o nível de engajamento das redes do Governo.
“Ele tentou mostrar um Lula de peito aberto primeiro, mas aprendeu rápido,” disse um consultor político. “Hoje o Presidente está muito mais disciplinado e o Sidônio parece ter poderes de chefe de Governo. Participa de todas as agendas, dita o timing de lançamento de programas e exerce uma influência muito forte sobre as decisões de comunicação. Para ele, a comunicação do negócio é o negócio.”
Nessa linha, o ministro adotou o hábito de consultar previamente interlocutores para antecipar possíveis problemas na comunicação.
“No passado, o Lula gravou um vídeo sobre economia que repercutiu mal no mercado. O Sidônio impôs filtros rigorosos e agora nada sai sem checagem prévia com pessoas de áreas correlatas ao que será comunicado,” disse o sócio de uma grande casa de análise política.
Depois da Câmara derrubar a proposta de aumento do IOF de Haddad, Sidônio começou a sair da defensiva e transformou uma pauta historicamente problemática para o Governo em algo aproveitável.
Foi buscar uma estratégia clássica (e com DNA petista) — o “nós contra eles” — e a envelopou como uma busca por “justiça tributária e social”, a despeito de um Congresso que, segundo essa narrativa, só pensa nos ricos.
Quando os esforços do Governo migraram para a tentativa de aprovação da MP 1303, a Secom meteu-lhe a alcunha de Taxação BBB (bilionários, bancos e bets).
“Mesmo se não conseguir avançar com as medidas, o governo está conseguindo transformar suas tentativas em narrativa,” disse um cientista político.
Segundo pessoas a par da campanha, uma agência de marketing político contratada para ajudar a batizar a MP vinha trabalhando mais com governos de direita num passado recente, mas foi recrutada pelo Governo mesmo assim. “Ele traz quem tem talento, sem preconceitos,” diz uma pessoa com trânsito na Secom.
Sob o guarda-chuva da “justiça social”, a Secom também investiu em comunicações descomplicadas sobre a isenção do IRPF até R$ 5.000, programas como o Luz para Todos e o Gás do Povo, e um possível fim da escala 6×1.
Um vídeo com cachorros dançando enquanto um narrador elenca as pautas acima, por exemplo, foi um dos que mais geraram engajamento nas redes do Governo em julho, acumulando cerca de 500 mil likes, segundo um levantamento da AtlasIntel cedido ao Brazil Journal.
As PECs da Blindagem e da Anistia também serviram de combustível anti-Congresso, mas ainda faltava a Sidônio imprimir uma marca nova na comunicação do Lula 3 — e ele abraçou a oportunidade que se apresentou quando Trump sobretaxou o País atendendo ao lobby de Eduardo Bolsonaro.
A “defesa da soberania nacional” ganhou protagonismo nos discursos, nas redes e nas peças publicitárias do Governo, e não demorou para Lula e seus ministros desfilarem em público com um boné semelhante ao MAGA de Trump — só que na cor azul e com os dizeres: “o Brasil é dos brasileiros”.
Quando a oposição abriu uma gigantesca bandeira dos EUA durante manifestação na Paulista, Sidônio aproveitou a deixa e voltou a incorporar o verde e o amarelo — antes renegados pela esquerda — nas campanhas de Lula.
Tudo isso culminou na atualização do slogan do Planalto para “Governo do Brasil: do lado do povo brasileiro”.
Em pleno 7 de setembro, Sidônio publicou um artigo na Folha de S. Paulo em que citava Darcy Ribeiro e dizia que o novo lema é “um compromisso assentado em três pilares: a defesa do Brasil, a luta contra os privilégios dos super-ricos e o cuidado com as pessoas.”
Enquanto isso, no Instagram e no TikTok — redes em que o Governo já ganhou 1 milhão de seguidores na gestão Sidônio — a “soberania” foi pauta de um vídeo apresentado por João Kleber. No centro de Osasco, o comunicador conduziu um “Teste de Fidelidade ao Brasil”, perguntando aos transeuntes se preferiam coisas brasileiras ou estrangeiras.
No atual contexto de polarização extrema, everything communicates, e o Governo parece ter encontrado um caminho para lutar em 2026.
“Mas falta muito tempo até a eleição. O fator rejeição segue central, assim como a economia, a inflação e o desempenho da oposição,” disse um analista político.