Uma empresa do Recife desenvolveu uma tecnologia de geolocalização de precisão inédita — com aplicações em marketing, CRM e prevenção de fraude — transformando o smartphone num ‘super GPS’ e aumentando o potencial de monetização para anunciantes.

Usando tecnologias já embarcadas no smartphone, a In Loco, fundada por ex-alunos de ciência da computação da Universidade Federal de Pernambuco, permite conhecer e prever o comportamento dos consumidores com grau de precisão e assertividade inéditos.

10410 1a4780da 783f 0000 0000 d9856751342ePara ganhar capilaridade, a In Loco fez acordos com os aplicativos mais baixados do mercado para embutir sua tecnologia:  quando um usuário baixa o app, a In Loco pega carona.

Para entender onde o usuário está, a In Loco usa o wifi e outras tecnologias embarcadas no celular que a maioria dos usuários sequer sabem existir: o acelerômetro (que entende o número de passos que a pessoa deu, o tamanho de cada passo e a direção), o giroscópio (sensor que entende para onde o celular está apontando nas três direções), e o magnetômetro (um subconjunto da bússola).

“Cada local físico tem um conjunto de distorções magnéticas que é único — uma espécie de impressão digital daquele local,” diz André Ferraz, que fundou a In Loco com amigos de faculdade há cinco anos.  

A tecnologia desenvolvida pela In Loco agrega, processa e determina a localização do usuário com uma precisão de dois ou três metros.  Para efeito de comparação, trata-se de uma precisão 30 vezes maior que o GPS usado pelo Waze ou pelo Google Maps.  Mais: a tecnologia consome 3.000 vezes menos bateria que um GPS tradicional, permitindo que o algoritmo fique rodando non-stop. Ao longo de um dia, a aplicação da In Loco consome 0,5% de uma carga de bateria.

A In Loco está fazendo avanços num terreno que tem sido pedregoso para as maiores companhias do Silicon Valley.  

O Google chegou a ter 150 engenheiros trabalhando para desenvolver uma tecnologia de indoor location, mas o projeto foi descontinuado em 2017. Agora, o Google está investindo em outra tecnologia chamada beacon, que depende da instalação de um dispositivo bluetooth para viabilizar a localização.  Há dois problemas: o custo do hardware e o fato de menos de 5% das pessoas com smartphones usarem o bluetooth o tempo todo. Segundo André, para conseguir o mesmo mapeamento (em quilômetros quadrados) que a In Loco tem hoje, a tecnologia beacon demandaria um investimento de US$ 10 bilhões.  

No ano passado, o Facebook abriu uma competição para desenvolvedores de indoor location e teve 6 mil inscritos: o melhor deles obteve 60% da precisão da In Loco.  Finalmente, a Apple comprou duas empresas de indoor location technology — uma americana em 2011, e uma israelense em 2014 — mas ainda não lançou nenhum produto.

Hoje, a tecnologia da In Loco está embarcada em 60 milhões de smartphones no Brasil (por meio de mais de 600 apps), mas a ambição da companhia é global.  A In Loco já está em 3,5 milhões de smartphones nos EUA, e deve chegar a 10 milhões em março.

Até agora, a In Loco desenvolveu três aplicações para sua tecnologia. A primeira delas, a In Loco Media, permite a anunciantes obter mais assertividade em suas campanhas e já tem clientes como Pizza Hut, Jeep, Coca-Cola, Mondelez e Boticário. A ideia da In Loco é passar a cobrar dos clientes um CPV — custo por visita à loja física —  em vez do famigerado CPM (custo por mil) cobrado nas campanhas do Google e Facebook. O cliente só paga à In Loco se o usuário for atraído até sua loja e ficar ali mais de cinco minutos.

“Um cliente nosso comparou o CPV a um contrato de ‘success fee’ em que os dois lados ganham,” diz Adrian Ferguson, que se juntou à In Loco Media no ano passado depois de 27 anos no mercado publicitário.

A segunda aplicação, o Engage, é uma ferramenta de CRM que permite a companhias identificar o contexto ideal para interagir com seus clientes por meio do aplicativo. Por exemplo, a partir dos insights da In Loco, um aplicativo de táxis descobriu que não estava engajando seus clientes em locais como aeroportos e bares. De posse do diagnóstico, o app começou a fazer promoções usando a geolocalização e conseguiu aumentar o número de corridas. O CRM do aplicativo não conseguiria chegar ao mesmo diagnóstico porque a tecnologia da In Loco consegue ‘ver’ onde os usuários se encontram mesmo quando eles não estão usando o app.

A terceira aplicação, o In Loco ID, previne fraude a partir do conhecimento dos hábitos do usuário, e já está sendo usado por dois bancos digitais. Como dependem de fotos de documentos para abrir contas, os bancos estão suscetíveis a fraude.

Como quase toda startup, a In Loco já flertou com o desastre.  Quando foi fundada em 2013, a companhia levantou recursos junto à Naspers para durar dois anos, mas acabou focando sua tecnologia num produto com uso limitado: serviços de geolocalização, tendo shopping centers como o cliente final. Quando faltavam dois meses para o dinheiro acabar, a In Loco fez o ‘pivot’ que a salvou da extinção:  lançou um novo produto, focado em publicidade, que começou a gerar caixa quase imediatamente.

Em 2015, a companhia faturou US$ 1,5 milhão.  No ano seguinte, US$ 5 milhões e, ano passado, US$ 12 milhões.

No Carnaval, Ferraz vai para São Francisco conversar com fundos de venture capital para uma nova captação, que deve financiar o crescimento nos EUA.  Já disse aos sócios que só volta quando a rodada estiver garantida.

Ele diz ser quase impossível para empresas como Google e Facebook fazer o que a In Loco está fazendo.  O motivo: o paradigma de privacidade.

“Todo o modelo de negócios do Google e do Facebook está baseado neles saberem exatamente quem é o usuário deles. Já a nossa tecnologia enxerga padrões mas não enxerga o RG que está lá na ponta. Na medida em que a sociedade aumentar sua demanda por privacidade, eles teriam que abandonar toda a sua base de usuários e começar do zero” para replicar o que a In Loco faz hoje.

O avanço nas tecnologias de geolocalização — assim como a chamada Internet of Things — marcam a transição da computação para um novo estágio chamado ‘Computação Ubíqua’.

Um pesquisador da Xerox PARC, Mark Weiser, propôs o conceito num artigo em 1991.  Weiser previu que a computação um dia será, na vida cotidiana, igualzinha à energia elétrica.

Invisível.