Na Bolsa brasileira, a ação da RD Saúde sempre foi “precificada à perfeição”, dado o histórico de execução estelar da companhia.
O problema é que é muito difícil ser perfeito o tempo inteiro.
A ação da RD – a dona das redes Raia e Drogasil – despencou quase 15% hoje depois da companhia reportar resultados bem abaixo do esperado pelo mercado.
Foi a maior queda diária da empresa desde o IPO da Drogasil, em 2007, segundo levantamento feito pela Elos Ayta Consultoria a pedido do Brazil Journal.
Somente hoje, a RD perdeu cerca de R$ 5 bilhões em valor de mercado – praticamente o market cap da Vulcabras.
A maior rede de drogarias reportou uma receita bruta de R$ 10,8 bilhões no período, uma alta de 10,8% em relação a um ano atrás.
O número veio até em linha com o consenso, mas as vendas no conceito ‘mesmas lojas’ vieram bem abaixo: uma alta de 3,4%, ante um crescimento de 6,7% um ano antes. Como comparação, a Pague Menos reportou um crescimento de 17% nessa linha, surrando o consenso.
O bottom line também desapontou. A empresa teve um lucro líquido ajustado de R$ 181 milhões, uma queda de 15,2% na comparação anual e 30% abaixo do consenso Bloomberg.
A margem bruta, por sua vez, caiu 60 bps em um ano e ficou em 26,6%.
“A RD tem o mesmo problema da WEG: a expectativa com os resultados é muito alta. Quando entrega algo ‘mais ou menos’, o buraco é muito grande,” disse um gestor que está vendido na ação.
Na conferência de resultados, os executivos da RD atribuíram o resultado fraco a um mix desfavorável de produtos, muitas promoções e perdas de estoque por furtos nas lojas.
A base de comparação atrapalhou o resultado do tri, segundo a RD: entre janeiro e março de 2024 a varejista vendeu muitos repelentes (devido ao aumento dos casos de dengue) e testes de covid, itens que têm uma margem acima da média.
Além disso, houve um crescimento mais acelerado das vendas pelo digital no tri reportado ontem, o que também afetou a margem.
Olhando pra frente, o curto prazo também não é animador para a RD. Segundo o JP Morgan, as bases de comparação devem seguir difíceis até o terceiro tri, já que a empresa restabeleceu seu nível histórico de pessoal por loja, que estava abaixo no ano passado.
“Assim, a diluição dessas despesas dependerá da aceleração do SSS em lojas maduras,” escreveu o time liderado por Joseph Giordano.
O avanço da concorrência também ligou o sinal de alerta dos analistas. A RD, apesar de ter conquistado 0,4 ponto de share no primeiro tri, tem crescido menos que concorrentes como Pague Menos e Panvel.
“Ainda é cedo para determinar se esses dados são pontuais ou indicam algo estrutural, mas é importante monitorar,” escreveu o time do Itaú BBA, liderado por Rodrigo Gastim.
Para gestores ouvidos pelo Brazil Journal, nem mesmo a queda de hoje representa uma oportunidade de entrada no papel.
O problema é o valuation esticado: mesmo com a desvalorização brutal, a RD ainda negocia a 23x o lucro estimado para os próximos doze meses. Pague Menos e Panvel negociam a 12,6x e 9,6x, respectivamente.
“No começo do ano, a expectativa do mercado de lucro para 2025 era de R$ 1,45 bilhão e já caiu para R$ 1,2 bilhão. E o que parece é que vai ter mais revisão,” disse um outro gestor.
Atualmente, o Mercado Livre é a única empresa de varejo com forte atuação no Brasil que negocia a múltiplos acima da RD.
“Até Smart Fit, que é uma empresa de crescimento, está em 20x – e mesmo assim acho um valor esticado,” disse um gestor.
Para esse gestor, a RD virou um “papel de gringo” – mais especificamente o investidor europeu, que tem uma visão de longo prazo maior.
Durante a conferência, os executivos da RD afirmaram que a empresa vem tomando medidas para melhorar os resultados deste ano – como a intensificação de promoções para acelerar o crescimento do SSS em lojas maduras – e que a margem bruta do primeiro tri foi o “piso” do ano.
A varejista também disse que vem adotando iniciativas de CRM para fortalecer o engajamento com o consumidor, e que a 4Bio – sua vertical de medicamentos especiais – trocou o foco do crescimento acelerado por rentabilidade.
Mesmo assim, a empresa vai ter que entregar muito mais para convencer o investidor – especialmente o local – a apostar nas suas ações.
Hoje a taxa de aluguel chegou a 43% ao ano – e o short interest era de 76 milhões de ações.
“A RD tomou Ozempic,” disse um vendido no papel, feliz com o price action de hoje.
Depois da queda de hoje, a RD Saúde cai 35% nos últimos doze meses. A empresa vale R$ 29 bilhões na B3.