Analistas do JP Morgan esquadrinharam os números das empresas de inteligência artificial e tentaram responder a maior questão na cabeça do mercado: de onde sairá tanto dinheiro para financiar os trilhões de dólares previstos para a construção de data centers e usinas de energia?
Num relatório que acaba de ser publicado, o banco estima que a construção da infraestrutura global de AI poderá custar mais de US$ 5 trilhões até 2030. A análise foi liderada por Tarek Hamid, o head da equipe de North American High Yield Research.
“O financiamento desse crescimento extraordinário provavelmente exigirá a participação de todos os mercados de capitais, assim como crédito privado, provedores de capital alternativos e até mesmo o envolvimento do Governo,” escreveram os analistas.
A questão não é, portanto, “qual” mercado financiará o boom da AI – porque esse ciclo de investimentos drenará recursos de todas as fontes disponíveis.

“A escala da demanda por computação permanece astronômica, com o crescimento real um tanto limitado por restrições físicas,” disseram os analistas, apontando como barreira a disponibilidade de eletricidade.
Pelas projeções do banco, será necessária uma capacidade adicional de 122 gigawatts entre 2026 a 2030 – energia suficiente para abastecer cerca de 100 milhões de residências nos EUA.
Com relação ao financiamento dos projetos de data centers, o JP Morgan disse que no momento a situação parece “administrável, mas haverá uma demanda maior por alternativas no futuro.”
As necessidades de financiamento em 2026 são da ordem de US$ 700 bilhões, que poderiam ser totalmente financiadas pelo fluxo de caixa das Big Techs – as hyperscalers – e por emissões no mercado high grade.
“No entanto, as necessidades de financiamento para 2030 ultrapassam US$ 1,4 trilhão, o que provavelmente exigirá contribuições de financiamento de todos os mercados,” disse o JP Morgan.
Pelas contas do banco, as hyperscalers geram mais de US$ 700 bilhões em fluxo de caixa operacional por ano e reinvestem cerca de US$ 500 bilhões em despesas de capital (capex).
Mas nessa conta não entram os US$ 250 bilhões gastos anualmente em pesquisa e desenvolvimento. Ou seja, falta dinheiro.
Os analistas sinalizaram uma possibilidade que já vem sendo ventilada entre os executivos das empresas de AI: o Governo provavelmente terá que bancar parte desse ciclo de investimentos.
Financiar projetos de longo prazo com empréstimos bancários de curto prazo resultaria em um grande descasamento entre ativos e passivos. Por isso, um “apoio financeiro mais agressivo por parte dos governos é possível, particularmente o aumento das preocupações com a defesa nacional em relação à AI.”
Para o JP Morgan, as “potenciais questões de segurança nacional serão o principal fator determinante” do maior envolvimento dos governos no financiamento.
“Além do impacto econômico e da competitividade, a AI tem implicações profundas para segurança cibernética, defesa e outros aspectos da segurança nacional,” afirmaram. “Uma ‘corrida armamentista da AI’ é uma possibilidade muito real, senão provável.”
Na semana passada, a CFO da OpenAI, Sarah Friar, mencionou a possibilidade de o Governo americano apoiar os investimentos. A Casa Branca declarou que não haverá “nenhum resgate federal para a AI” e reafirmou o compromisso de facilitar o licenciamento dos projetos de energia. Friar depois disse que sua declaração foi tirada de contexto.
Sam Altman, o CEO da empresa, postou na sequência um texto no X dizendo que “Governos não devem escolher vencedores ou perdedores, e que os contribuintes não devem resgatar empresas que tomam decisões comerciais ruins ou que perdem no mercado. Se uma empresa falhar, outras empresas farão um bom trabalho.”
Os números da OpenAI, a startup que saltou na liderança dessa tecnologia com a estrondosa popularidade do ChatGPT, escancaram as dificuldades de justificar os investimentos anunciados.
A empresa reportou recentemente uma receita anualizada de US$ 20 bilhões, ante um capex que poderá chegar a US$ 1 trilhão até 2030.
O número pode se provar muito mais do que a OpenAI precisa. Para o time do JP Morgan, o “maior receio seria uma repetição das experiências de implantação de telecomunicações e fibra óptica, em que a curva de receita não se materializou em um ritmo que justificasse o investimento contínuo,” escreveram.
Para o banco, os ganhos de eficiência nos próximos anos também podem levar a um excesso de capacidade, impactando a rentabilidade do capital investido.
No setor como um todo, o big picture é o seguinte: “Para obter um retorno de 10% sobre os investimentos esperados até 2030, seriam necessários cerca de US$ 650 bilhões em receita anual na perpetuidade, o que é um número surpreendentemente grande,” disseram os analistas. “Isso equivale a US$ 34,72/mês de cada usuário atual de iPhone ou a US$ 180/mês de cada assinante da Netflix.”
Será, mais uma vez, uma disputa ferrenha, em que “haverá vencedores espetaculares e provavelmente alguns perdedores igualmente espetaculares, dada a quantidade de capital envolvida e a natureza de ‘o vencedor leva tudo’ de partes do ecossistema de AI.”
O maior gargalo para o avanço da AI, contudo, não parece ser dinheiro (ainda) – e sim eletricidade.
Estimativas do Lawrence Berkeley National Laboratory indicam que o consumo de eletricidade dos data centers dos EUA atingirá entre 325 e 580 terawatts-hora (TWh) em 2028, em comparação com o consumo atual de aproximadamente 175 TWh.
“A necessidade de nova geração continua sendo um obstáculo, já que pelo menos ~100 GW de nova geração serão necessários para suportar o crescimento previsto na demanda,” disse o relatório.
O prazo para as concessionárias de energia elétrica receberem novas turbinas a gás natural variam de 3 a 4 anos, e as usinas nucleares nos EUA levam cerca de 10 anos para serem construídas.











