A Fit Participações — o family office dos ex-banqueiros Tom Freitas Valle e Fernando Prado, que tem 20% da Zamp — tem questionado os motivos do Mubadala Capital para tentar retirar a dona do Burger King Brasil e do Popeyes do Novo Mercado. 

Fontes próximas ao family office disseram ao Brazil Journal que a Fit considera a proposta um “retrocesso de governança que vai gerar uma pressão vendedora no papel,” favorecendo os interesses do fundo soberano de Abu Dhabi.

A tese da Fit é de que o Mubadala estaria fazendo este movimento porque está avaliando adquirir outro ativo do setor – como por exemplo a South Rock, que opera o Starbucks e o Subway no Brasil e está em recuperação judicial – e depois usar essa companhia para incorporar a Zamp, diluindo de forma brutal os atuais acionistas.

As regras do Novo Mercado seriam um impeditivo para este plano, já que proíbem que uma empresa do Novo Mercado seja incorporada por outra que não faça parte do segmento de mais alta governança da B3.

Segundo uma das fontes, apesar de ter se tornado o maior acionista da Zamp, o Mubadala tem evitado se caracterizar como parte relacionada, não indicando nenhum nome para o conselho, o que o conflitaria na análise de oportunidades de consolidação com ativos detidos por ele. 

Os questionamentos vêm poucos dias depois da Mar Asset, que tem 6% do capital e está alinhada à Fit Part, enviar uma proposta ao conselho para que dois outros temas sejam apreciados na assembleia que votará a possível saída do Novo Mercado.

Na AGE, marcada para 3 de janeiro, a Mar propôs que a companhia adote um poison pill, obrigando qualquer investidor que ultrapassar 33% do capital a fazer uma oferta por toda a empresa. 

A outra proposta tem a ver com a saída do Novo Mercado. Nos termos propostos pelo Mubadala, alguns direitos garantidos aos minoritários pelo Novo Mercado seriam incluídos no estatuto da Zamp como forma de protegê-los – incluindo o direito de tag along e a exigência de pelo menos dois conselheiros independentes. 

Caso a saída do Novo Mercado seja aprovada, a proposta da Mar é limitar o poder de voto de todos os acionistas a 25% do capital para qualquer matéria envolvendo tentativas futuras de remoção dessas proteções.

“A pegadinha aqui é que não existe cláusula pétrea em estatuto. Tudo que você coloca, com a mesma facilidade você consegue tirar no futuro. Com a limitação do poder de voto você dificulta que esses direitos sejam removidos,” disse a fonte. 

Hoje a decisão sobre uma eventual saída do Novo Mercado está virtualmente empatada, dado que a Fit e a Mar têm 26% do capital, e o Mubadala, cerca de 30%.

O fiel da balança será a Restaurant Brands International (RBI), a dona das marcas Burger King e Popeyes e que tem cerca de 10% do capital da Zamp.

Não está claro como a RBI vai se posicionar. Na primeira tentativa da Mar de emplacar um poison pill, em setembro, a RBI votou contra, alinhando-se ao fundo soberano. (O alinhamento, no entanto, pode ter sido tático, dado que uma das duas agências de proxy, a ISS, recomendou o voto contra, sugerindo um poison pill mais alto, de 30%). 

A Fit teme que haja um conflito de interesses intrínseco entre a Zamp e a RBI, que é dona das marcas e recebe royalties sobre o faturamento bruto.

“A dona da marca ganha royalties de qualquer jeito, se a loja estiver dando lucro ou se estiver deficitária. Então para eles, o estímulo é sempre abrir mais lojas. Loja boa? Abre. Loja média? Abre. Loja ruim? Se ninguém estiver olhando, abre também,” disse esta fonte. 

O Mubadala tem defendido uma agenda de crescimento. Para o fundo, a Zamp deveria voltar a abrir de 70 a 80 lojas/ano para fechar o gap com o McDonald’s – uma visão que, pelo menos no curto prazo, favorece os interesses da RBI.

Já a Fit, a Mar e o management da companhia advogam por uma agenda de eficiência: redução do capex e fechamento de lojas deficitárias. A Fit acredita que com isso a empresa possa retornar parte da geração de caixa na forma de recompras e dividendos; a Mar acha que isso permitiria voltar ao crescimento orgânico, com uma estrutura de custos mais enxuta que permita competir em preços com McDonald’s sem perder rentabilidade.

Essa agenda, em tese, não é a da RBI, mas a companhia tem começado a mudar – nos EUA, pelo menos.

O novo chairman da companhia, Patrick Doyle (um ex-CEO da Domino’s), disse recentemente que a empresa precisa mudar seu mindset e colocar a rentabilidade dos franqueados no centro da estratégia de negócio. (Os retornos das lojas vêm caindo desde 2019 pela dificuldade de repassar a inflação dos últimos anos.)

A Fit acredita que a RBI teria pouco a ganhar com a agenda de crescimento do Mubadala — que seria prejudicial à empresa no longo prazo. 

A estimativa é que cada nova loja da Zamp no Brasil gera cerca de US$ 50 mil de royalties por ano para a RBI. Em outras palavras, 100 novas lojas renderiam US$ 5 milhões – um trocado para uma empresa com EBITDA de mais de US$ 2 bi.

Segundo uma das fontes, um executivo da Fit chegou a dizer a interlocutores que a RBI “não deveria patrocinar um retrocesso enorme de governança na Zamp por um punhado de dólares.”