William Landers assumiu a gestora do BTG ontem, no dia em que a Bolsa bateu os icônicos 100 mil pontos.
Para ele, a escalada ainda tem gás.
Com mais de 30 anos gerindo fundos voltados para a América Latina (os últimos 17 na BlackRock), Landers tem convicção de que a reforma da Previdência será aprovada, com um texto entre o que foi apresentado pelo Governo Temer e o proposto recentemente por Bolsonaro.
Nessa espiral positiva, e com a bolsa ainda muito aquém de seu pico em dólares, o Brasil será destaque entre os países emergentes, diz ele.
No BTG, Landers terá a missão de integrar as equipes locais que atuam no Brasil, Colômbia, Chile e México para construir um fundo voltado para toda a região. Ele continua baseado em Nova York, onde fica sua família, e terá cerca de 15 profissionais de investimento na equipe, entre portfolio managers e analistas. Na BlackRock, eram apenas quatro: duas analistas em São Paulo – que foram com ele para o BTG – e mais dois em Nova York.
Seu fundo na gestora americana, que tinha cerca de US$ 2 bilhões sob gestão no fim do ano passado, teve uma rentabilidade de 104% em dólares nos últimos 10 anos, contra 90% do MSCI Latam, seu benchmark.
Paulistano neto de inglês, Landers mora nos Estados Unidos desde os 14 anos, quando seu pai, um funcionário do hoje extinto banco Manufacturers Hanover foi transferido para lá. Desde 1991, passou por Bear Stearns, Lehman Brothers, Credit Suisse e BlackRock.
Landers falou com o Brazil Journal na última sexta-feira.
Na BlackRock você estava administrando um fundo de cerca de US$ 2 bilhões até o fim do ano, que já chegou a ter US$ 11 bilhões em 2011. Qual sua percepção hoje em relação ao País?
Apesar de estar em níveis recordes em reais, a bolsa brasileira ainda está 45% abaixo do pico em dólar, que foi em março de 2011, se não me engano. Então, existe um crescimento natural que vai existir quando essa recuperação gradual da economia ganhar um pouco mais de força. Na verdade, o posicionamento de investidores tanto brasileiros quanto internacionais ainda é bem leve na Bolsa brasileira. Essa nova realidade de juros mais baixos vai forçar o investidor local a buscar novas fontes de crescimento e sem dúvidas vai voltar a trazer uma base maior de investidores para a bolsa brasileira.
Para o estrangeiro é difícil porque fica aquela pressão de o Bolsonaro ser o Trump brasileiro e tudo o mais, o que faz perder um pouco o foco da realidade, que é a de que o presidente Bolsonaro trouxe um novo modo de governar, que não vai ser fácil de acontecer, mas está acontecendo. E a equipe que veio com ele, no ministério da Economia e no Banco Central, é muito boa, e está dando continuidade a um processo que começou com o Temer. Eu vejo esse governo como um governo de continuidade, que vai dar uma acelerada nesse processo que já tinha começado com o Meirelles e sua equipe.
Mas esse cenário positivo depende, em grande parte, da aprovação da reforma da Previdência, não? Como você está vendo esse processo?
O meu cenário base é que a reforma da Previdência vai passar em algum momento deste ano. Vai ser uma reforma boa. Não vai ser perfeita, mas vai ser boa: alguma coisa entre o texto anunciado pelo Temer e a que foi proposta agora pelo ministro Guedes.
Se for muito abaixo, ainda deixa muita coisa para fazer no futuro, vai ser uma conversa que não terminou. Mas se for alguma coisa nesse nível que está aí, já pode partir para outras discussões importantes.
Mas e se o texto não passar ou passar muito diluída? Qual o impacto nos preços dos ativos? Em outras palavras: o que já está embutido no preço hoje?
Se não houver reforma, o risco-país está errado, a moeda está errada, os juros estão errados. Porque sem a reforma da Previdência, o déficit vai continuar a aumentar de maneira tão grande que o governo vai ficar sem espaço de ação. O governo vai pagar a previdência e mais nada – e obviamente não funciona.
O Brasil não vai implodir, mas em vez de entrar num círculo virtuoso, vai voltar a estar num círculo vicioso e trabalhar para tentar cobrir a conta fiscal, que não vai ser coberta porque as regras não funcionam. O ponto é que os políticos parecem finalmente ter essa consciência. Não passar seria uma coisa tão irresponsável que eu não vejo como sendo uma possibilidade grande.
É claro que não é zero, mas se tivesse uma possibilidade grande de não passar, eu não estaria tão otimista com a bolsa brasileira – e ela não estaria chegando perto de 100 mil pontos e o dólar não estaria a R$ 3,70. Esses níveis já estão começando a precificar uma reforma passando neste ano, entre algum momento entre o segundo e o terceiro trimestres. Maio ou agosto, pra mim, não faz nenhuma diferença. O importante é saber que a gente está caminhando para o lado certo.
Setorialmente, tem algum setor que você está mais animado?
Eu não digo que estou desanimado com nenhum setor hoje, porque o Brasil está num momento muito interessante. Mesmo as exportadoras continuam sendo competitivas com o real onde está. Não vai ser o foco do nosso portfólio quando a gente começar, mas continua sendo ok.
As companhias estatais, com todo esse governo pró-mercado, focado em melhorar a eficiência, dá pra ficar muito animado. Mas, sem dúvida nenhuma, com os juros baixos no Brasil – altos na comparação internacional, mas baixos para o histórico brasileiro – inflação baixa, emprego crescente e confiança do consumidor aumentando, quero ter exposição a setores domésticos. Eles vão se beneficiar dessa melhoria do emprego, dos salários e da retomada da classe de média que a gente viu na década passada.
A minha cabeça é que um portfólio Latam tem que ter bastante Brasil, então tem espaço para várias histórias diferentes, setores diferentes, que é a cabeça que eu estava há dois meses atrás [ainda na BlackRock].
Num fundo Latam é natural que o Brasil tenha um espaço relevante pelo tamanho do País e a liquidez das ações. Mas dá para dizer que o Brasil é o destaque da região?
Com toda certeza. O Brasil vai ser o mercado que vai performar melhor dentro de Latam, e Latam como um todo deve performar melhor que outros mercados emergentes por causa de Brasil. A América Latina como região não funciona como uma classe de ativos se o Brasil não funcionar.
A gente viu isso nessa década quando o México estava indo super bem, mas o México não era grande o suficiente, não tinha liquidez suficiente, e o número de companhias suficientes para dar a força necessária para Latam voar. Mas agora, com o ativo Brasil funcionando, a região deve se beneficiar.
E agora como você está vendo o México?
O México está na contramão do movimento de centro-direita da América Latina, com a eleição de um presidente de centro-esquerda, populista, querendo fazer mudanças que na minha cabeça não seriam ideais para um país que estava indo relativamente okay. O país estava crescendo 2,5%, alguma coisa assim, com uma relação muito próxima dos Estados Unidos, pro bem ou pro mal. E o que acontece agora é que, por causa dessas influências do governo dentro da economia mexicana, apesar de a economia americana continuar a ir bem, o México não está se beneficiando tanto. O crescimento potencial está abaixo do Brasil, mas mesmo assim tem algumas oportunidades, alguns setores e companhais que vão continuar a performar bem. Aí é que entra a equipe com experiência: através de stockpicking dá pra adicionar ideias que vão trazer valor para o portfólio, mas certamente com peso menor do que teriam em outro momento.
E como está sua visão para outros países da América Latina?
Na região andina, o grande problema é a falta de liquidez. São pouquíssimas companhias que negociam mais de US$ 1 milhão ou US$ 2 milhões por dia em países como Colômbia ou Peru e talvez uma meia dúvida no Chile. São mercados em que há uma grande dificuldade de se criar exposição grande no portfólio.
A Colômbia é muito ligada ao petróleo – se o petróleo está subindo, a bolsa combinada tende a subir. E os investidores locais tem uma presença maior do que em qualquer outro mercado latino, então tem um pouco mais de volatilidade. Mas são uma meia dúzia ou no máximo oito companhias investíveis.
No Peru o número de empresas é até menor, mas é um país que tem um potencial muito grande pela necessidade de infraestrutura. O presidente que era de centro-direita caiu por conta de escândalos relacionados à Odebrecht e a Lava-Jato e a economia peruana sofreu no período de transição, com uma diminuição muito grande dos investimentos de infraestrutura – e isso num país que é um Brasil há 25 anos atrás nesse quesito.
E a Argentina?
Se olhar o mercado argentino, até a metade de 2018 foi um dos melhores mercados do mundo, exatamente pelas mudanças que eles estavam fazendo com o governo Macri, mas conforme o Fed foi aumentando os juros, ficou difícil rolar a dívida, a pressão subiu e eles fizeram alguns erros de tentar defender a moeda, num momento de pressão global de precificação de moedas e aí eles se complicaram. Foi toda essa conjuntura que resultou no acordo com o FMI.
Eles estão no caminho certo, mas é o único país que tem uma eleição super importante este ano, que é uma eleição presidencial no terceiro trimestre. Até há pouco tempo, o Macri era visto como o ganhador sem grande competição, e agora tem pelo menos uma duvida se ele vai ser reeleito ou não, se vai ser alguém do partido dele, ou talvez a oposição.
Em termos de liquidez, não é difícil criar uma posição de 3%, 4%, 5% em Argentina num fundo Latam e alguns fundo tiveram até posições maiores, que foram super bem em 2017 até meados de 2018. Mas vamos ver…
Você tem ideia do que seria o tamanho do fundo Latam?
A gente vai apresentar a ideia para clientes e ver qual vai ser a aceitação. Não vai ter nenhum orçamento específico de na data X ter Y de ativos. Na BlackRock eu estava com US$ 2 bi, poderia ser US$ 5 bi ou US$ 6 bi com a liquidez atual.