A empresa de análise de dados Atlas Intelligence acertou em cheio o resultado do plebiscito chileno de agosto, foi a mais certeira na eleição na Colômbia em junho, e apareceu entre as melhores nas eleições da França em abril. Em 2020, nos EUA, a consultoria previu os resultados nos principais swing states – e sua margem de erro ficou abaixo de 2 pontos percentuais, contra mais de 6 pontos nos institutos tradicionais.
Agora, saber dizer se no Brasil vai ter segundo turno… aí também já seria demais.
“Existe um empate técnico entre a possibilidade de ocorrer um segundo turno ou não,” o cofundador e CEO da AtlasIntel, Andrei Roman, disse ao Brazil Journal. “Nos próximos dias, teremos que avaliar o voto útil e a capacidade de mobilização de eleitores dos candidatos.”
Mesmo com seu track record impecável, a magnitude da polarização brasileira é tal que nem a AtlasIntel se atreve a cravar os rumos dessa eleição – e a dez dias do pleito.
Segundo Andrei, a abstenção tende a ser maior entre os eleitores de esquerda, enquanto os bolsonaristas são extremamente fiéis – o que pode dar fôlego ao atual presidente. O voto útil, entretanto, migra com maior intensidade para Lula.
Ao contrário dos institutos à moda antiga, a AtlasIntel não faz entrevistas presenciais nem por telefone. Uma espécie de terceira via das pesquisas, a startup desenvolveu uma metodologia própria, a partir da análise de dados de alta frequência.
Na prática, a AtlasIntel compra anúncios online e pede que as pessoas respondam ao questionário – um processo semelhante ao que faz a britânica YouGov. Os números passam por calibragens e ajustes, mitigando vieses e distorções da base de respondentes – e é assim que tem conseguido antecipar com maior exatidão os resultados.
Os últimos números da AtlasIntel mostram uma grande estabilidade: Lula dez pontos à frente de Bolsonaro. Na pesquisa mais recente, publicada ontem à noite, o petista aparece com 48,4% das intenções, contra 38,6% do segundo colocado.
A novidade das últimas semanas, afirma Andrei, foi uma “não novidade”. Havia a perspectiva de um avanço de Bolsonaro, essencialmente por causa de três razões: a melhora na economia, a força dos palanques regionais e a imagem negativa de Lula em decorrência da Lava Jato. Esses fatores talvez tenham maior influência nos próximos dias, mas até agora mexeram pouco no ponteiro.
O spread de 10 pontos coloca o levantamento da Atlas numa posição intermediária entre os principais institutos, abaixo do Ipec (16 pontos) e em linha com Datafolha (12), Quaest (10) e FSB (9), mas acima de PoderData (7).
Além das análises eleitorais, Andrei desenvolve modelos preditivos de análise de risco político e realiza consultorias empresariais com base em big data. É um estudioso dos comportamentos de massa, tema que se dedicou nos anos de pesquisa em Harvard.
Nascido na Romênia, ele se mudou para os Estados Unidos ainda na adolescência para fazer colégio e depois faculdade. Sempre se interessou pela América Latina e em especial pelo Brasil. Em 2006, num intercâmbio, morou em Fortaleza.
Em seu doutorado em Harvard, seu orientador foi Steven Levitsky, um dos co-autores do bestseller “Como as Democracias Morrem”. Sua tese tratou da escalada de protestos populares ao redor do mundo. Andrei trabalhou em consultorias internacionais, viveu um tempo na Índia, e, em 2010, retornou ao Brasil.
Ao lado de Thiago Costa, também de Harvard e seu atual sócio, Andrei lançou em 2014 o projeto Atlas Político, que teve financiamento da Fundação Lemann, entre outros. A ideia era ser uma ferramenta para os eleitores acompanharem a atuação dos congressistas.
Agora, a Atlas vem trabalhando em parceria com a Arko Advice. As pesquisas são bancadas por instituições financeiras e empresas e campanhas políticas Brasil afora.
O tracking das intenções de voto é ininterrupto, com boletins atualizados a cada seis horas. Essa sondagem circula restritamente para os clientes. Já as pesquisas públicas são registradas no TSE e os dados ficam públicos.
Na avaliação de Andrei, Lula cristalizou uma liderança confortável por causa de sua ampla vantagem no Nordeste. Bolsonaro até deverá ter mais votos entre os nordestinos do que obteve em 2018, mas esse ganho será anulado por uma perda: eleitores mais ricos e de maior escolarização no Sul e Sudeste. Andrei diz que a presença de Geraldo Alckmin como vice de Lula ajudou na atração desses eleitores arrependidos do voto em Bolsonaro.
Caso haja segundo turno, a campanha será ainda mais polarizada e “feia”, diz Andrei, com os candidatos investindo pesado na destruição da imagem do adversário. No retrato de momento, Lula bate Bolsonaro no segundo turno por 53% a 41%. A maioria dos votos de Ciro e de Simone Tebet deve ir para o petista.
Andrei não acredita na possibilidade de uma ruptura institucional, ao contrário de Levitsky, seu ex-professor. “Vejo as instituições brasileiras funcionando, com o fortalecimento de pesos e contrapesos,” diz. “Steve tem boas intenções ao falar dos riscos, mas exagera em sua análise.”
Para ele, “a democracia brasileira provavelmente nunca foi tão forte como agora.”
Daqui a 10 dias, o track record olímpico da AtlasIntel será testado pelo País onde até o passado é incerto. Andrei vai precisar de sorte.