10840 8249f74b 383d 55da 4d5f fdf842313377Tarsila do Amaral, “Operários”

O Brasil que brota hoje à noite das urnas é um País mais maduro politicamente, mas perigosamente dividido, ganhe quem quer que seja.

Os filhos da Pátria agora pertencemos a um de dois grupos (não há terceira opção). Ou somos aecistas — criaturas elitistas, perversas, e que ‘nunca fizeram nada pelo Brasil’ — ou dilmistas — seres desprezíveis, ‘burros demais para ver a verdade’ ou que estão atrás de uma boquinha na máquina pública.

Nos últimos dias, amigos brigaram por causa da política. Relações se estremeceram.

Durante o debate da Globo, na sexta, eleitores apaixonados gritavam os nomes de seus candidatos das janelas de suas casas no Rio, Belo Horizonte, São Paulo.

Até em namoros envolvendo eleitores em lados opostos, o tempo fechou.

“Parece que de repente o Brasil foi dividido entre o lado do bem e do mal,” escreveu no Whatsapp um eleitor de Aécio, em tom de queixa, ao namorado, que votará em Dilma. “Mas é isso mesmo,” respondeu o outro, sancionando o racha ideológico que encerrou a conversa e sepultou o amor.

O nós-contra-eles se transformou em depredação com os “manifestantes” que apareceram na porta da Editora Abril em São Paulo para protestar contra a capa desfavorável a Dilma. Como se o problema fosse o mensageiro, e não a mensagem.

O clima é de Fla-Flu, mas o retrato que sorri na parede é o de Benito Mussolini e seus camisas negras. (A própria candidata, que lutou contra a ditadura, condenou o episódio como “barbárie” e disse que “não é assim que se faz um País civilizado.”)

Contra o veneno que corre nas ruas, contra a transformação de adversários em inimigos, vale o velho conselho que muitos pais dão aos filhos adolescentes: “Não brigue com os amigos por causa das namoradas. As namoradas vão, mas os amigos ficam.”

Na mesma linha, o colunista Ricardo Noblat tuitou: “Político profissional (quase todos) não briga de verdade. Faz figuração. Quem briga são seus eleitores. Pq são uns tolos.”

Feliz é o País que exerce sua democracia com as mesmas doses de veemência e de civilidade.

Cada brasileiro chega a uma preferência eleitoral a partir de suas experiências pessoais, os livros que leu (ou não), e influências tão diversas quanto as cores do espectro político.

Vale a pena tentar convencer quem está no campo oposto, mas, se isto for impossível, o respeito pelo outro tem que prevalecer, ainda que se discorde de sua opinião.

Existe uma linha clara que separa corruptos de pessoas honestas, mas não uma que separa as pessoas entre “do bem” e “do mal” no campo da opinião política.

Imagine uma amizade que tivesse acabado nos anos 80 porque um amigo gostava do Sarney, e o outro, do então-oposicionista Lula. No final, os políticos se adaptam e você fica sozinho, no meio da rua, sua bandeira em punho, sem saber pra onde ir.

Na campanha que termina hoje, mais ou menos metade do Brasil vai votar em Dilma Rousseff. Parte destes eleitores acha que o PT foi o grande responsável por lhes dar acesso a uma faculdade, a uma casa, a dignidade. Este voto pode ser discutido, mas tem que ser respeitado. Outra parte dos dilmistas votam por achar que “esquerda” é, por definição, o lado certo onde os “bons” devem ficar no espectro político. Desde quando ser ingênuo é crime?

A outra metade do Brasil vai votar em Aécio Neves. Parte destes eleitores acham que Aécio é o melhor candidato, com o melhor time técnico para consertar o que está errado no País. Outra parte nem liga muito para Aécio, mas não aguenta mais o PT depois de 12 anos de Poder. Como uma pessoa razoável pode condenar este sentimento quando até petistas históricos o compartilham?

Em VEJA desta semana, Roberto Pompeu de Toledo escreve que cabe ao vencedor “não aprofundar a desunião até os limites fatais, como na Venezuela.”

Essa responsabilidade é das lideranças, mas também de cada brasileiro que nos últimos dias militou para um lado ou para o outro.

E a receita para a união pós-urna é simples: pensar no seu País, antes de pensar no seu Partido.