Fabiano Rios, o chefe de investimentos da Absolute, uma das maiores gestoras independentes do País, desafia o consenso de mercado segundo o qual os EUA vão entrar em recessão – e que o S&P verá uma correção.
“As pessoas me perguntam se deveriam aplicar em juros americanos,” afirma Fabiano. “Sinceramente, acho que é para estar comprado em Bolsa.”
Essa é hoje a principal tese de alocação da Absolute, contra um consenso que ele vê dividido entre “os mais pessimistas e os menos pessimistas” – com o debate em torno de quão forte será a recessão.
A gestora de fundos multimercados – que dobrou de tamanho nos últimos três anos e hoje administra mais de R$ 30 bilhões – também passou a ser mais construtiva sobre o Brasil. Na Bolsa, passou de vendida a comprada nos últimos 30 dias, e ainda aposta na valorização do real.
Segundo Fabiano, é difícil ficar pessimista em Brasil com um cenário favorável lá fora e, além disso, as ações do Governo, até aqui, “têm sido melhores do que a retórica.”
Nesta conversa com o Brazil Journal, ele detalha as razões para o otimismo e comenta os possíveis pontos de atenção.
Que avaliação você faz do ministro Fernando Haddad?
Tinha muita gente no Governo falando coisa desconexa. O Haddad, a voz mais razoável nesse Governo, vai ganhando força. Ele é mais moderado, disposto a ouvir, e parece mais forte do que as pessoas imaginavam.
O Governo estava atrapalhando. Quando deixaram o Haddad trabalhar, houve uma reação positiva do mercado. Além do mais, o real e os ativos brasileiros estavam muito desvalorizados. A Bolsa reagiu – e o mundo está ajudando também. Os ativos relacionados ao Governo tiveram uma alta forte, como ocorreu com a Petrobras.
Mas, se olharmos os Governos anteriores, sempre há uma certa desorganização no início. Não é algo exclusivo desse Governo.
Há uma questão de coordenação, algo que envolve também outros ministérios, que estavam muito desorganizados. A tendência é melhorar, e, uma vez que isso ocorra, o mercado tira prêmio dos ativos.
Com essa descompressão dos prêmios e a queda do dólar, a queda da Selic parece mais próxima. Mas a atividade segue mais aquecida do que o esperado. O que espera para a próxima reunião do Copom? Como fica o balanço de riscos avaliados pelo BC?
Os preços dos alimentos têm caído forte. Não é o ideal, do ponto de vista das expectativas, mas é algo bom. Pode influenciar os núcleos e reduzir a inércia. É algo bem-vindo. Vamos ver como aparece no modelo deles.
Conforme os dados, o BC poderá dar início ao ciclo de afrouxamento. Está próximo. Se não for em agosto deve ser em setembro.
O que pode complicar esse cenário? Uma reversão externa? Lá fora tem um debate intenso entre os bears, que preveem uma recessão para logo, e aqueles que acreditam no soft landing. Em que ponta você está?
Discordo dessa sua observação, porque todo mundo que eu leio está pessimista. Tem os mais pessimistas e os menos pessimistas, mas otimista, ninguém. O debate fica em torno de quão forte será a recessão.
Essas pessoas acham fantasioso o cenário de soft landing, mas eu acho que ele é bem possível. Estou na ponta otimista. A economia americana está muito forte, e mais recentemente a inflação tem recuado. Não ainda para trazer para a meta de 2% no próximo ano, mas a trajetória é de desaceleração.
O Federal Reserve vai acomodar essa equação num prazo mais longo. Não está com pressa de trazer a inflação para a meta, desde que esteja caminhando na direção correta. Se o Fed não acreditasse nisso, não teria feito a pausa na última semana. Ele está tentando entregar o soft landing, vejo isso como algo muito bullish.
Como você se posiciona para esse cenário em que o aperto monetário parece estar próximo do fim?
O debate mais importante não é se a alta dos juros está próxima do fim, mas qual será a intensidade da desaceleração na economia americana. Eu acredito no soft landing, e os dados vêm corroborando essa visão. Os números de inflação estão caindo, e os de atividade permanecem robustos.
A visão de consenso de mercado de que vai haver recessão aparece nas expectativas, no soft data, mas não está se concretizando. O mais importante, para mim, é que a inflação está caminhando para a meta e que o Fed vai acomodar essa convergência.
Se isso continuar acontecendo, não importa muito se ele vai subir mais 0,25 ou 0,50. Não é isso que vai fazer preço neste momento. O importante é o Fed manter a postura dele e não precisar fazer um sudden stop na economia, temendo que a inflação não fique sob controle.
As pessoas às vezes me perguntam se deveriam estar aplicadas em juros americanos. Sinceramente, acho que é para estar comprado em Bolsa. Nosso posicionamento tem sido nesse sentido. O mais importante é que a economia continue crescendo, as empresas estejam lucrativas.
Na minha cabeça, se o Fed der mais 0,25 agora e depois mais 0,25, não será ruim para a Bolsa necessariamente. Não vai fazer a economia bater contra a parede. Mostra que a economia permanece resiliente.
Mas a alta da Bolsa americana tem sido muito concentrada em algumas poucas empresas de tecnologia. A valorização deverá se disseminar para outros setores?
Já estamos vendo isso acontecer. A alta era realmente puxada pelas techs, pelos ativos que podem ter uma alta expressiva dependendo de como ocorrer o desenvolvimento da inteligência artificial. Mas agora vai se espalhando para outros setores.
No primeiro momento, o dinheiro é o mesmo. Precisa vender alguma coisa para comprar outra. Mas diante da subalocação que existe lá fora em ações, acredito que vai começar a entrar mais dinheiro em Bolsa. Ainda não entrou.
No Brasil, até onde vai o fôlego da Bolsa se as taxas de juros reais se mantiverem acima de 5%?
O argumento é o mesmo. Se o juro real for 4% ou 5%, não é necessariamente ruim. Depende de quão forte está a economia. Se a economia crescer, e em um cenário em que não vemos o hiato muito aberto, o espaço para queda de juros é limitado.
Estamos num cenário em que, se tudo der certo, talvez – talvez – vamos para um juro real neutro que na nossa cabeça é algo ao redor de 4,5%.
Para a Bolsa subir, não precisamos de um juro superestimulativo. Podemos ter um equilíbrio saudável, com juro real perto de 4,5% e economia crescendo. Esse é o cenário bom.
A preocupação que todos nós brasileiros deveríamos ter é como fazer para que esse juro neutro caia. Não vejo tanto essa preocupação no debate nesse momento, mas esse é o bom debate.
Você acha que isso vai entrar em discussão, depois da votação do arcabouço fiscal e da reforma tributária?
O modelo tributário é algo que prejudica muito a produtividade, então, dependendo de como vier a reforma, poderá contribuir. Acho que existe essa preocupação em pessoas dentro do Governo, de aumentar a produtividade, então precisamos ver as ações. A reforma tributária seria um bom passo.
Mas precisamos ver também como vai agir o BNDES, quais as atitudes no parafiscal, todo esse tipo de coisa que altera o juro neutro. Houve indicações no outro sentido. Mas de concreto, mesmo, ainda não vimos coisas tão ruins nesse aspecto.
Está preocupado com o risco de uso político das estatais? Vocês têm posições em Petrobras e Banco do Brasil?
Temos sim posições nessas estatais, achamos que elas estão muito baratas. Somos otimistas. Precisamos ficar de olho e ver se o Haddad vai prevalecer como voz sensata dentro do Governo. Se isso se mantiver, o carrego é muito positivo. Justifica o risco de estarmos comprados nesses ativos.
Enquanto o cenário for esse, o potencial de alta é grande. Mas precisamos ficar atentos e ver se essa relação continua saudável – de risco e retorno.
O que pode trazer o mau humor de volta?
Em geral, as ações têm sido melhores do que a retórica. Devemos tentar filtrar um pouco esse jogo político. O que tem sido feito foi melhor do que a expectativa, por isso essa melhora, em um cenário em que há espaço para os ativos continuarem ganhando – a Bolsa e ainda mais o câmbio.
Quais as suas principais posições e como mexeram na alocação nos últimos meses?
Em renda fixa temos uma posição mínima. Até erramos, porque estávamos tomados em juros no começo do ano, achando que os cortes que estavam na curva eram maiores do que a inflação permitiria. Não que a gente achasse que não haveria cortes, mas já tinha muita coisa precificada – e acabou precificando mais.
Vemos uma melhora no câmbio, então temos posições compradas em real. Na Bolsa brasileira, de um mês para cá viramos de posição vendida para uma comprada. Não é uma posição enorme, mas uma posição razoável.
Mas nossa principal posição é comprada em Bolsa americana. Achamos que a percepção tem sido muito diferente da realidade – e a alocação é muito diferente da realidade. Já subiu razoavelmente, mas ainda tem potencial de alta.
E, claro, se o mercado lá fora for benigno, isso influencia os ativos brasileiros também. Difícil eu ficar pessimista com o Brasil com este cenário global tão positivo.
Mas está tão positivo assim? Não está preocupado, por exemplo, com os efeitos de uma crise no setor de imóveis comerciais?
Um dos destaques na Bolsa americana são as empresas de construção. Esses caras estão voando. A economia americana está forte. Os lucros devem seguir os lucros de uma economia forte, não de uma economia em recessão, que é o que as pessoas estão esperando. Esse é o nosso call contra o consenso, de que a economia será mais resiliente do que as pessoas imaginam.
Você tem um alvo para o S&P 500 e para o Ibovespa?
Não tenho números para te dar, mas achamos que é muito acima de onde estão agora.