O texto abaixo foi escrito em 16 de março, no início daquilo que, esperava-se, seria uma breve pausa na vida normal.
Era para ser uma segunda-feira como qualquer outra.
Mas a necessidade de ficarmos em casa, “unidos” na luta contra o Covid-19, fez com que eu acreditasse que iria trabalhar em “home office” e ao mesmo tempo passar esse tempo importante com as crianças em casa.
Logo de manhã, precisei levar a baby ao pediatra, pois estava desde sábado com tosse, coriza e uma febrinha que vinha todas as manhãs. Saí de casa com ela por volta de 9:30 acompanhada da minha doce ajudante, que logo ao chegar em casa trocou de roupa, lavou as mãos e como sempre, correu para ver os meus filhos, que a amam incondicionalmente.
Chegando no prédio do pediatra, já uma cena nos fez praticamente fazer xixi nas calças de tanto que rimos.
Enquando eu fazia o cadastro na recepção, segurando minha baby no colo, uma mulher chegou e ficou atrás de mim aguardando sua vez. De repente a Charlotte, que está super gripada, soltou um espirro no meu colo, e sem pensar duas vezes a tia atrás de mim saiu correndo pra rua como se tivesse visto o capeta! Ficamos olhando uma para a cara da outra e rindo do desespero dela, que simplesmente desapareceu! A nêga deve ta correndo até agora.
De volta à casa, claro que encontro os outros três filhos “de férias” de pijamas: um com a cara no videogame, outra no celular e outra no computador. A ordem foi clara: “Todos pra mesa almoçar e depois, LIÇÃO!”
Lógico que todos reclamaram que não deveria ter lição “nas férias”…. “Não é justo, mamãe!”
Logo após o almoço, organizei a fila e comecei pela minha filha do PYP6. Com a ajuda das queridas mães consegui encontrar no meio dos 6.437 emails da escola o link com a programação das lições. Quando bati o olho, juro que achei que aquela lista de lição era para o semestre. Mas para minha tristeza era só a lição “do dia”.
Vi que a escola sugeriu a altura da mesa e da cadeira para que as crianças se instalassem corretamente para fazer as lições. A minha primeira meia hora foi só tentando manter minha filha sentada. A cada 30 segundos ela se enrolava feito um tatú-bola na cadeira, choramingando, reclamando de dor no olho e fazendo com que minha paciência fosse pro ralo. Três horas e quarenta minutos depois, eu já tinha repensado minha vida, me arrependido das minhas escolhas, lido um texto sobre “green school”, respondido a questões sobre o texto, estudado tudo sobre eletricidade, desenhado um mental map (nem sabia que porra era essa), feito exercícios de fração (aprendi que o número de cima se chama numerador e o de baixo denominador.
Pausa para xixi e bolo de chocolate. Na volta, mais exercícios, mais leitura de textos, mais tatú-bola enrolado na cadeira.
Pausa para respirar no saco e vamos para o filho número 2.
A porra do link não abre, mando email pra professora, peço um novo login, não funciona de novo, o moleque foge pra sala e vai jogar Minecraft. Fico puta, faço a louca, escondo os dois controles da TV, faço ameaças. De volta ao link do capeta que não abre. Desisto! Resolvemos fazer a outra lição. Spelling, leitura do texto e nada de abrir o link.
Encerramos por hoje e chamo a filha número três, que estava desde cedo “apodrecendo de tédio,” segundo ela mesma, e pedindo para ir pro shopping ‘kasamiga’ como se o mundo estivesse em festa e eu sendo a mãe malvada que quer manter uma adolescente em cárcere privado. Finalmente às 17:45 encerrei minha jornada e fui me dedicar à filhotinha número quatro, que a essa altura já tinha colado massinha em todas as paredes da casa e muito provavelmente comido um pouco de cada cor.
Só para constar, ao longo do dia recebi umas 417 mensagens do meu marido, cada uma contando uma desgraça mundial, e entre uma mensagem e outra ele ligava pra perguntar se alguém tossiu!
Fim de noite, já estou com taquicardia pensando que hoje foi só o primeiro dia.
E como percebi que estava falando sozinha durante o banho e fazendo desenhos no box do banheiro, começo a achar que o lugar mais seguro para as crianças nessa época de coronavirus é mesmo na escola.
Luzia Engelhard é mãe de quatro e está perdendo a cabeça.