Na semana passada, uma foto viralizou no Instagram mostrando um senhor com seus 80 anos, usando máscara e segurando uma placa que dizia: “Ajude-me a sair da falência”.

Quase ao mesmo tempo, no Twitter, um outro vídeo contava a história de um menino de seus 12 anos, morador da zona rural, que havia demonstrado o desprendimento máximo.

Um grupo de ciclistas pedalava fora da cidade quando um deles perdeu o pedal próximo à casa do menino pobre; não havendo conserto possível, o menino ofereceu o pedal de sua única bicicleta. 

“Pode tirar o da minha, tem nada não. Deus me dá em dobro.”

Nos dois casos, a reação das pessoas às circunstâncias de terceiros mostrou um Brasil solidário que tem sido pouco lembrado nesses anos de polarização, gritaria e divisão, um câncer que é amplificado por alguns políticos e se retroalimenta.

11048 6a9f5f7b e0f9 3329 f1e3 abf7257abbcbO senhor da foto era Nelson Simeão, que há 50 anos transformou uma chácara no Brooklin numa loja de plantas que vende de orquídeas e rosas até temperos e acessórios para o jardim. 

Por décadas, o “Jardins Modelo” prosperou e tornou-se o grande orgulho de Seu Nelson, um apaixonado por paisagismo e jardinagem que sabe de cor os nomes, preços e características de todas as espécies que vende.

Mas a pandemia, que fechou sua loja por 70 dias, colocou o negócio em risco. 

Localizada na Avenida Portugal, num terreno que antes era da Eletropaulo, a loja já sofria com uma dívida bancária crescente. Mas conseguia se manter de pé com uma clientela fiel e a garra de Seu Nelson, que toca o negócio com a ajuda de apenas dois funcionários.

A reação da internet começou com Luciana Medeiros, uma agente de celebridades que se comoveu com a história e arregaçou as mangas: criou um perfil no Instagram para a loja, que em cinco dias ganhou mais de 70 mil seguidores.

“Ele não aceita doações em dinheiro e quer apenas que as pessoas comprem suas plantas,” disse Luciana. 

A loja — que antes da covid atendia cerca de 25 pessoas por dia — recebeu mais de 80 clientes no primeiro dia após a divulgação. Na quinta, quase 500.

“Nunca na minha vida eu imaginei que alguém fosse fazer isso por mim,” Seu Nelson disse ao Brazil Journal. Aos 83 anos e recém curado de um câncer, ele não pensa em parar de trabalhar. “Isso aqui é a minha vida, se eu parar eu paro de viver.” 

Ao mesmo tempo em que Seu Nelson se surpreendia com a solidariedade dos paulistanos, os ciclistas de Feira de Santana voltaram à casa do garoto que abriu mão de seu único pedal, desta vez munidos com um arsenal de presentes.

Quando deu seu pedal aos ciclistas, eles tentaram dar dinheiro em troca, mas Márcio Vitor das Neves recusou: “Não precisa. Deus me deu um, Deus me dá dez vezes mais.”

A atitude de não querer nada em troca não saiu da cabeça dos ciclistas, que voltaram com cestas básicas, roupas, capacete, luva — e uma bicicleta novinha em folha.

“A gente se comoveu muito com o que você disse pra gente em relação ao pedal,” disse um dos ciclistas.

O Brasil de Luciana, Seu Nelson, Márcio Vitor e os ciclistas precisa urgentemente ser resgatado.

 

Em vez de passar seus dias pensando no que nos separa, este Brasil forte mobiliza sua energia para fortalecer seus mais vulneráveis.  Um Brasil da empatia, que se coloca no lugar do outro.

 

Afinal, um país só tem futuro se, em vez de “nós” e “eles”, houver apenas “nós.”