José Maurício Machline era o gerente de marketing da Sharp, a empresa de sua família, quando sugeriu, durante uma reunião, a criação de um evento para comemorar a produção de música no País.

A ideia só teve o apoio de um dos conselheiros da empresa: o economista Mario Henrique Simonsen, que enxergou ali uma oportunidade para colocar a Sharp ainda mais em evidência e convenceu o velho Mathias, pai de Zé Maurício, a apoiar o projeto.

Nascia ali, nos idos de 1987, o Prêmio da Música Brasileira, que sobreviveu inclusive à derrocada da Sharp – a empresa icônica encerrou suas atividades vinte anos atrás.

O Prêmio – que já foi chamado de Prêmio Sharp, TIM e Claro – é um radar do que acontece de melhor e mais significativo na produção musical do País e está sendo relançado agora, depois de um hiato de três anos.

A cerimônia de premiação, marcada para 31 de maio, não poderia ser num local mais simbólico: o Theatro Municipal do Rio de Janeiro.

“A gente faz no Rio porque 80% da indústria vive aqui. Mas não deixa de ser uma premiação para levantar a moral da cidade,” diz o Mr. Música, hoje com 66 anos.

A devoção de Zé Maurício à música rendeu outros frutos. Um deles foi a criação, nos anos 80, do selo Pointer, responsável por obras significativas dos intérpretes Jane Duboc e Filó Machado, além de Prisma, que marcou o encontro dos pianistas César Camargo Mariano e Nelson Ayres.

O canto também faz parte de seu currículo, embora não se considere um intérprete. “Eu amo cantar porque é a melhor maneira de expressar nossos sentimentos. Se tivesse condições, acho que seria cantor,” diz.

Mas bem que ele tem seus momentos de glória nessa área. Nos anos 90, o produtor cultural lançou o espetáculo/disco Os Gordos Também Amam, ao lado da cantora paulista Célia; juntos interpretavam de Lulu Santos ao impressionista francês Érik Satie.

Três anos depois, Zé Maurício colocava no mercado Toques de Umbanda, um álbum do cancioneiro afro-brasileiro. Em 2002, foi a vez de Mania de Você, uma homenagem às cantoras e compositoras brasileiras que trazia participações de Ivete Sangalo, Fátima Guedes e até Camila Pitanga, num dueto em Desculpe o Auê, da dupla Rita Lee e Roberto de Carvalho.

A facilidade com a qual ele transita no meio musical foi vital para a criação de Por Acaso, programa de entrevistas com os principais nomes da MPB, que foi ar na extinta TV Manchete de 1991 a 2004, e que por um breve período foi revivido no Teatro Rival, no Rio de 2016.

Além da variedade musical, uma das principais qualidades do Prêmio da Música Brasileira é que ele é um retrato do seu tempo. Se antigamente era preso às gravadoras que dominavam o mercado, hoje ele espelha a pujança da produção independente.

“Tivemos um número impressionante de 10.000 inscritos,” diz Zé Maurício. “A música mundial se democratizou. Hoje se faz música de qualidade pelo computador, no banheiro da tua casa… Você cria a música e é dono dela.”

Outra mudança importante está na abolição da premiação por gênero: é intérprete e pronto, ao invés dos datados “masculino e feminino.” O aumento da popularidade do funk e do hip hop, por sua vez, fez com que surgisse a categoria “música urbana”.

A seleção dos indicados ao Prêmio é resultado de um processo minucioso. Há grupos de pesquisadores espalhados pelo País, que fazem a primeira triagem dos candidatos. Depois, eles passam por um novo processo, onde são separados por segmentos. Por fim, a remessa é enviada para os 48 jurados.

Na tarde de terça-feira, a organização divulgou a lista final dos candidatos. Chico César e a Orquestra Sinfônica Brasileira (Osb) estão à frente, com três indicações. Há depois uma lista imensa de artistas com duas: desde veteranos como Chico Buarque, Alceu Valença e Elba Ramalho, aos novatos Glória Groove, Baco Exu do Blues e IZA.

As categorias mais populares têm representantes do quilate de Marília Mendonça, Barões da Pisadinha e Maiara & Maraísa, o que fez do evento uma boa mostra da diversidade brasileira.

O relançamento do Prêmio terá apresentação de Lázaro Ramos e Felipe Neto, e fará uma homenagem à cantora Alcione.

Zé Maurício volta a dar palco para o Rio de Janeiro, que vai do céu ao inferno mas continua sendo o celeiro da música. Que ótima maneira de levantar a moral do País.