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Talvez por não terem mais tanto a perder — já que suas ações mergulharam entre 30% e 60% depois que o Governo mudou abruptamente as regras do FIES — as empresas de educação listadas em Bolsa tem sido mais honestas com os investidores, pelo menos a portas fechadas.

Em conversas com múltiplos gestores, algumas empresas têm dito o seguinte:

1) O site do FIES continua espalhando confusão. Até duas semanas atrás, os alunos iam ao site do FIES para renovar suas matrículas e recebiam a seguinte mensagem: “Você conseguiu sua renovação, agora vá até sua faculdade para confirmar.” Só que, para as escolas, o Ministério dizia outra coisa. “Para muitos alunos, o sistema respondia que aquele aluno não estava aprovado, seja por causa de preço ou de qualquer outra coisa. Quem tinha que dar a notícia da não-aprovação ao aluno era a faculdade, que ficava numa saia justa.”

Mas a pior situação é a do aluno, que fica vítima do jogo de empurra. Uma faculdade disse que chegou a ter mil pessoas dormindo na fila para renovar a matrícula.

Na segunda e terça da semana passada, o sistema passou a liberar matrículas — mais ou menos. O site passou a dizer que a matrícula havia sido aprovada, mas ainda estava “sujeita a cancelamento.” Slogan do momento: Brasil, Pátria Enroladora.

2) As empresas não sabem se conseguirão repassar os aumentos. Como parte das mudanças de regras do FIES, o Governo limitou os aumentos de mensalidades no ano letivo 2015 em 6,4% (a inflação oficial do ano passado). Como resultado dessa política, o Ministério está bloqueando automaticamente as matrículas de novos alunos em cursos que tiveram mais de 6,4% de aumento. Mas, quanto aos alunos já existentes, o Ministério tem aprovado as matrículas em alguns casos, mas acrescentando que aquela aprovação pode ser revista mais adiante.

Para cursos com reajustes maiores, as escolas pensam em incluir no FIES o aumento de 6,4%, e cobrar o que exceder este limite diretamente dos alunos.

“Cada empresa vai avaliar se acha isso adequado ou não,” diz um investidor que teve conversas com o setor. “Como atualmente os alunos pagam 50 reais por trimestre, não é necessariamente fácil fazê-los pagar algum valor todo mês, principalmente num cenário de inflação maior e desemprego em alta.”

3) O Ministério está olhando os contratos com lupa. Cada vez que os alunos se matriculam para um novo período, as empresas têm que fazer um aditamento ao contrato. Este é um documento oficial que valida a continuidade do aluno no curso. Mas muitas faculdades menores, não listadas na Bolsa, não cumprem esse processo. Até o ano passado, o Governo repassava os recursos do FIES normalmente para estas escolas, mas agora, a coisa mudou. “Para as empresas que não fizeram aditamento, o Ministério está dizendo que os contratos são inválidos,” disse o executivo de uma empresa.

Qualquer pessoa séria é a favor do cumprimento de contratos e de todas as formalidades técnicas — mas, de novo, como fica o aluno?

4) A relação entre as empresas e o Ministério está péssima. Em sua breve gestão, Cid Gomes nunca atendeu as empresas diretamente para discutir as mudanças drásticas no FIES, publicadas no apagar das luzes de 2014. Para piorar, há muito ruído na interlocução entre as empresas e o secretário-executivo do ministério, agora ministro interino.

Mas, para as empresas, já ficou claro que as mudanças no programa não são má vontade do Ministério, e sim uma parte do ajuste fiscal. “O Levy chegou lá e disse, ‘tem que cortar isso, pronto e acabou’, e o que houve foi desorganização do Ministério em como operacionalizar o corte.”

É evidente que em casa que falta pão, todos brigam e ninguém tem razão. Mas neste caso, o mínimo que se poderia esperar do Ministério era mais organização e um tratamento digno aos alunos.

E, quanto às empresas, em vez de contarem as verdades apenas aos investidores, elas deveriam se organizar e vir a público explicar à sociedade a bagunça em que se meteram.