Uma das características do modo de pensar contemporâneo é compartimentar as questões em caixinhas: a caixa da revolução tecnológica, a da sustentabilidade ambiental, a do mercado financeiro e assim por diante.

À primeira vista, a segunda etapa da revolução tecnológica, com todas as enormes potencialidades da inteligência artificial para o aumento de eficiência e produtividade, parece um tema distante do importantíssimo e crucial compromisso que todos temos de ter com a preservação do planeta. Mas a expansão da IA e a floresta viva estão muito mais próximas do que se imagina, e não deveriam ser vistas em caixas separadas.

Um exemplo prático: um estudo da Agência Internacional de Energia (AIE) mostra que, em 2022, os data centers espalhados pelo mundo consumiram 460 terawatts/horas de energia elétrica. A agência prevê que a demanda por energia por esses centros vai dobrar até 2026 como consequência do crescimento da contratação de serviços de nuvem, inteligência artificial e o investimento em criptomoedas. 

Hoje a infraestrutura física usada pela nuvem já responde por mais emissões de gases do efeito estufa do que aviões comerciais.

É onde entram a compensação ambiental, o Brasil, o Pará e a Amazônia: os créditos de carbono são a solução mais barata e rápida para que a expansão necessária da IA aconteça com a compensação ambiental devida, permitindo que a revolução tecnológica se impulsione e ao mesmo tempo preserve o planeta e produza inúmeros benefícios para o Brasil. E o Pará está na linha de frente dessa janela de oportunidade.

Os desafios são enormes na nova revolução tecnológica em curso. Em apenas dois anos, segundo a AIE, a demanda de energia pelos data centers aumentará 1 mil terawatts/horas ao ano, o que equivale a praticamente o consumo total de eletricidade do Japão com seus 125 milhões de habitantes.

A demanda por energia das Big Techs deve aumentar de 15% a 20% ao ano no período 2022-2026, resultando em produção adicional de gases do efeito estufa.

Só em 2018, por exemplo, os 5 bilhões de hits no YouTube da música Despacito usaram a mesma quantidade de energia necessária para aquecer 40 mil casas nos Estados Unidos.

As plataformas trazem entretenimento e informação, mas aumentam ainda mais a pressão sobre o meio ambiente.

Em 2019, a Amazon se tornou a primeira Big Tech a se comprometer com emissões líquidas zero de carbono até 2040. Em janeiro de 2020, a Microsoft assumiu o compromisso de ser ‘negativa’ em carbono (remover CO₂ da atmosfera ou sequestrar mais CO₂ do que é emitido) até 2030. Apple, Alphabet e Meta logo seguiram o exemplo, comprometendo-se com a neutralidade de carbono até o mesmo ano. Todas essas metas foram definidas antes da explosão de demanda por serviços de IA.

Soluções baseadas em novas tecnologias são caras e podem levar anos para ser implementadas. O boom da IA ​​está acontecendo agora. Portanto, as empresas precisam urgentemente encontrar outras formas de reduzir a sua crescente pegada de carbono.

A solução mais rápida, fácil e econômica para mitigar a produção de gases de efeito estufa das Big Techs é investir em mecanismos de compensação utilizando soluções baseadas na natureza – o poder de sequestrar carbono através de preservação e reflorestamento das florestas tropicais.

Os mecanismos de compensação de carbono existem há vários anos. No Brasil, o Pará está liderando o caminho, implementando legislação e arcabouço para criar mercados jurisdicionais de comércio de carbono que atendam aos mais altos padrões necessários para cumprir as metas estabelecidas nos Acordos de Paris.

Os chamados créditos jurisdicionados já se provaram detentores do mais importante atributo quando se fala em compensação ambiental: integridade. Isso quer dizer absoluta garantia de que a floresta efetivamente existe, o crédito é autêntico e o recurso arrecadado será aplicado exclusivamente para atender a populações ribeirinhas, quilombolas, indígenas, a agricultura familiar, e o restante em projetos de combate às mudanças climáticas.

A legislação do Pará surge antes de o Brasil ter concluído sua própria legislação nacional, mas as nossas estruturas jurídicas e a supervisão robusta, além da enorme escala das reservas florestais do próprio Pará, fazem do Estado um parceiro atraente para o setor das Big Tech.

 Ainda este ano, o Pará vai fazer sua primeira emissão de créditos de carbono jurisdicionais.

A estimativa é que o Estado tenha um volume de mais de 150 milhões de toneladas para comercialização, acumuladas entre 2023 e 2026. Os créditos de carbono gerados pelo Pará podem fazer parte da solução para que as Big Tech consigam ampliar seus data centers e manter seus compromissos de emissões zero. E como consequência, essas empresas de tecnologia ajudam a financiar a preservação da Amazônia e o Brasil na sua transição para uma sociedade mais sustentável e de baixo carbono.

Na COP30, que acontecerá em Belém em 2025, o Pará vai mostrar ao mundo que uma bioeconomia baseada na floresta é possível e que isso permitirá o aumento de renda para os povos da Amazônia, uma vida com mais oportunidades e harmonia e, acima de tudo, a mitigação das mudanças climáticas.

Helder Barbalho é governador do Pará.