Holofotes, especialmente em situações de crise, são um desafio para toda instituição, pública ou privada. Mas a controvérsia é também uma janela de oportunidade. 

Com o julgamento de Jair Bolsonaro, todos os olhos estão voltados ao Supremo Tribunal Federal, que tem uma excepcional oportunidade de comunicação: de fortalecer e revisitar sua identidade institucional.

Qual é o desafio do Supremo neste julgamento? Ser e parecer Judiciário, cujo papel é aplicar a lei. Seu desafio é mostrar que, com o julgamento de Bolsonaro, não está perseguindo o dissenso político, mas apenas aplicando a Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito, aprovada pelo Congresso e sancionada pelo próprio réu.

O desafio do STF não é agradar a maioria da população ou determinados segmentos da sociedade. É aplicar de forma racional, independente e impessoal – de forma republicana – a lei. Decisão penal exemplar não é aquela que dá punição máxima, tampouco a que distribui impunidade. É aquela que respeita os princípios e garantias fundamentais.

Responsabilidade penal é sempre pessoal. Não há condenação por baciada: é preciso analisar a conduta de cada pessoa, em seus elementos objetivos e subjetivos. Se essa análise é feita com seriedade, é razoável, por exemplo, que as punições sejam diferentes, que haja absolvições. Como será o quadro final deste processo? De uma só tonalidade?

Outro ponto inegociável num Estado Democrático de Direito: delação sozinha não é prova. Deve haver outros elementos probatórios para condenar uma pessoa.

Esta é a melhor resposta que o STF pode dar a seus críticos nacionais e internacionais: atuar como Justiça, apenas aplicando a lei, sem cálculos ou modos políticos. Mais do que com uma nota oficial, a independência entre os Poderes existente no Brasil é reafirmada com a ação: com o Judiciário atuando como Judiciário – o que inclui rigorosa, clara e breve fundamentação de suas decisões.

Eis a grande oportunidade do Supremo com o julgamento dos atos golpistas. Reafirmar a democracia é mais do que uma simples bravata (e, por óbvio, muito diferente de agir voluntariosamente). É fortalecer as instituições, assegurando que elas atuem dentro de seus limites e regras. É, entre outros elementos, prover previsibilidade, segurança jurídica, impessoalidade. Não há atalho para o fortalecimento da democracia.

Não tenho dúvida. Se o STF atuar como Judiciário, no dia seguinte ao julgamento de Jair Bolsonaro, investidores nacionais e estrangeiros terão maior disposição para investir no Brasil. Terão maior apreço e confiança nas instituições nacionais. Com todos os holofotes sobre si, o Supremo vai aproveitar ou desperdiçar a oportunidade?

Nicolau da Rocha Cavalcanti é advogado criminalista, mestre e doutorando em direito da USP.