A Oi levantou ontem mais de R$ 8 bilhões num aumento de capital, vendendo novas ações aos investidores a R$ 2 cada.
Is-to é u-ma vergonha, como diria Boris Casoy.
Para se ter uma ideia da destruição de valor sofrida pela empresa, no início do ano passado as ações da Oi valiam cerca de R$ 8, ou seja, quatro vezes mais do que o preço de ontem.
Em outubro, quando a oferta foi anunciada ao mercado pela primeira vez, as ações ainda valiam R$ 4,44.
Outra comparação: Nos últimos 12 meses, enquanto o Ibovespa perdeu 5% — contaminado pelo outro desastre do momento, a Petrobras (-14%), e pela fraqueza da Vale graças à China — a Oi implodiu 54%.
Ora, se nem a Petrobras caiu tanto (com o preço da gasolina congelado e o preço das refinarias pelas alturas…), por que a Oi teve que vender ações a um preço mais barato que uma ligação interurbana?
A resposta pode parecer complexa, mas é simples.
Na maioria das ofertas de ações, todos os atores envolvidos têm um incentivo para jogar o preço para cima: os bancos coordenadores, porque recebem um percentual do total levantado como comissão; e a empresa, porque, quanto maior o preço, menos ações ela tem que emitir, portanto “diluindo” menos seus atuais acionistas.
Mas a oferta da Oi estava longe de ser como a maioria das ofertas. O desenho da operação visava resolver os problemas de todos os controladores: o desejo da Portugal Telecom de se fundir com a Oi, e o desejo dos outros controladores — Andrade Gutierrez e La Fonte Telecom (família Jereissati) — de se livrar de uma dívida gigante na holding que controlava a empresa. O interesse dos minoritários era apenas um detalhe na paisagem.
Assim, desde o início, o desenho da operação incentivava todos os envolvidos a buscar o maior desconto possível no preço da oferta.
Os bancos, por exemplo, tiveram sua comissão fixada num valor nominal, e não como percentual do total da oferta. A outra possível interessada, a Portugal Telecom, estava (como parte da operação) “vendendo” ativos para a Oi a um preço pré-estabelecido e em troca de ações, ou seja, quanto mais baixo saísse o preço das ações na oferta, mais ações da Oi a Portugal Telecom receberia. Por fim, o BTG Pactual, líder do consórcio de bancos coordenadores, também tinha um conflito: um fundo de investimento gerido pelo banco se comprometeu desde o início a comprar R$ 2 bilhões em ações da Oi. (De novo, quanto mais baixo o preço, melhor para o comprador.)
Abaixo, quem ganhou e quem perdeu com a oferta que vai entrar para a história do mercado de capitais brasileiro como mais um daqueles “nunca antes neste País”…
Os “comprados”: Perderam as calças. E ainda estão em estado de choque. São os investidores que estavam “comprados” nas ações há mais tempo porque acreditavam na empresa e/ou não entenderam que a estrutura da operação estimulava todo mundo a botar o preço pra baixo. Nos últimos 12 meses, perderam metade do patrimônio.
Bancos de investimento: Sur-pre-sa! Ganharam muito. R$ 154 milhões para ser exato. Já comentamos aqui a alegria dos bancos que coordenaram a operação , particularmente num ano de vacas magras nos IPOs.
Acionistas minoritários no Brasil: Perderam segurança. E confiança. Instada pelos minoritários a impedir a operação, a CVM decidiu que era impossível dizer, a priori, se os controladores da Oi — a Andrade Gutierrez e a família Jereissati) — auferiam “benefício particular” com a transação, pela qual a Oi incorporou ativos da Portugal Telecom a preços considerados inflados pelos minoritários da Oi, enquanto a dívida dos controladores desaparecia como um Boeing do radar, absorvida pela empresa resultante da fusão. Os minoritários da Oi dizem que a CVM errou feio, e falam em um retrocesso de 20 anos .
BNDES: Ganhou. Apoiador de primeira hora de todos os “campeões nacionais”, o banco era o maior credor da holding que controlava a Oi e que tinha uma divida em torno de R$ 4 bilhões. Analistas de mercado achavam que as chances do BNDES de receber eram baixas, porque a holding devia muito mais do que o valor da participação que detinha na Oi.
Os “vendidos”: Ganharam horrores. Pouca gente que não trabalha no mercado financeiro entende o que é “fazer um short“, isto é, apostar na baixa de uma ação. Primeiro, o investidor tem que achar outro que tenha a ação na carteira e esteja disposto a emprestá-las, mediante pagamento de um aluguel. Fechado o contrato, o tomador das ações as vende no mercado (fica “vendido”), esperando recomprá-las mais tarde a um preço menor, lucrando a diferença.
No caso da Oi, parecia tão fácil ganhar dinheiro apostando que o papel ia cair (pelos motivos acima) que quem tinha a ação para alugar cobrava os olhos da cara. Nas últimas duas semanas, a taxa de aluguel chegou a mais de 100% ao ano. Muito provavelmente, os “vendidos” devem ter recomprado as ações nos últimos dias — ironicamente, colocando uma ordem de compra junto aos bancos coordenadores.
“Uma parte da demanda foram os locais comprando para zerar o short“, disse um gestor, que estima que quase 90% das ordens de compra tenham vindo de investidores internacionais.
Passada a oferta, o CEO da Oi, Zeinal Bava, um jovem executivo com claras ambições globais, terá que focar nos problemas estruturais que desafiam o setor e que fazem o futuro das operadoras de telefonia incerto.
“Hoje, com Netflix e Apple TV, ninguém mais precisa pagar caro por uma seleção de canais a cabo”, diz um analista que acompanha o setor. “Aí vem o Whatsapp e mata a mensagem de texto, e o Skype fez o resto. E como a telefonia celular já tem uma penetração bastante alta no Brasil, tudo que as operadoras podem fazer é uma ficar roubando cliente da outra.”