No momento em que a BM&F Bovespa tenta fortalecer o Novo Mercado, Marcelo Mesquita, sócio fundador da Leblon Equities e um veterano do mercado de capitais, é mais radical: chegou a hora de acabar com o segmento e seus primos pobres, o Nível 1 e Nível 2. 

Ele argumenta que as regras do Novo Mercado — um diferencial de governança quando foram lançadas há 16 anos — hoje são o mínimo que uma empresa deve adotar, e que a barra precisa subir.

“Acho que não deveria ter mais Novo Mercado”, Mesquita disse hoje em um painel do Congresso Nacional do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). 

Em troca, ele propõe um ‘rating de governança’ que funcionaria assim: cada empresa divulgaria as práticas que adota dentro de uma lista pré-estabelecida de padrões recomendados. A partir disso, seria possível estabelecer uma nota: aquelas que estivessem mais perto da máxima receberiam um selo de diferenciação, enquanto as que não atingissem um mínimo não poderiam sequer ser listadas.

“Muitos dos princípios que antes eram diferenciais, como o próprio ‘one share, one vote’, hoje são considerados triviais,” disse Mesquita. “O investidor não paga mais prêmio por quem está listado no Novo Mercado. Se não for listado lá, ele simplesmente não entra.”

Mesquita disse que suas sugestões são uma tentativa de quebrar o impasse entre a BM&F Bovespa — cuja proposta de reforma fortaleceria a governança, na visão dos investidores — e a oposição à reforma liderada pela Abrasca, a entidade que representa as empresas listadas na Bolsa.

Durante o painel, ele ressaltou as deficiências do Novo Mercado tal como ele existe hoje. 

A primeira é a dificuldade de aplicação da regra do ‘tag along’, a obrigatoriedade de extensão aos minoritários do mesmo preço oferecido ao controlador em caso de mudança de controle.

Além das diversas estruturas formais que algumas empresas usam para escapar da regra, o problema está nas empresas de controle compartilhado, nas quais uma mudança no bloco controlador acaba não disparando omecanismo. 

A segundo crítica é quanto à facilidade de se abandonar o Novo Mercado. Pelas regras atuais, para sair do Novo Mercado, uma empresa precisa lançar uma oferta para todos acionistas a valor de mercado, mas não há necessidade de adesão mínima.

“Na hora do IPO, a empresa vende as garantias do Novo Mercado,” disse Mesquita. “Depois que o dinheiro já foi levantado, ela pode quebrar esse compromisso, sem nenhuma sanção. É gravíssimo”, disse, fazendo alusão a um “caso recente muito estranho”.

Ele não citou nomes, mas a indireta foi clara: a Leblon foi acionista da Dasa, cuja saída do Novo Mercado, no ano passado, foi vista como uma forma de pressionar os minoritários a aceitar uma oferta dos controladores para fechar o capital.

Na reforma do regulamento, a Bovespa agora quer que haja uma adesão mínima de 50% do float na oferta pública de aquisição (OPA) para que as empresas possam deixar o segmento. Mesquita acredita que a regra tem que ser tão restrita quanto a aplicada para a deslistagem: adesão mínima de dois terços das ações em circulação.

O gestor afirmou ainda que as regras do Novo Mercado hoje são muito simplistas e acabam não contemplando os diferentes tipos de empresas. Segundo Mesquita — conselheiro da Petrobras desde agosto — as estatais têm problemas muito diferentes das companhias privadas de controle definido, que, por sua vez, têm questões diversas das de controle difuso.

“Nas estatais, questões como definição de tarifas são muito mais importantes do que a remuneração do management, por exemplo”, disse. 

Outra questão é o custo das estruturas exigidas pela Bovespa para manter o selo de governança. Na reforma do Novo Mercado, a Bovespa quer que as empresas tenham comitês de auditoria, compliance e auditoria interna. “Isso pode não valer a pena do ponto de vista de custo/benefício para empresas menores”, disse Mesquita.

No modelo de ‘ratings’, mais flexível, essas companhias poderiam dizer que decidiram não adotam essas estruturas exatamente por causa do custo – e caberia ao investidor avaliar se a justificativa é boa ou não.  “É impossível que o mesmo sapato caiba em todo mundo”. 

Esta é a segunda tentativa da Bovespa de reformar o Novo Mercado.  A anterior, em 2010, fracassou em meio à oposição das empresas listadas no segmento.  

A Bovespa tem até o dia 7 de novembro para apresentar uma minuta final da reforma. O texto ficará disponível até fevereiro, quando será batido o martelo – cada uma das propostas é analisada em separado e só passa se contar com o aval de dois terços das companhias.

Durante o período de audiência pública, encerrado em setembro, houve 39 manifestações de pessoas físicas, empresas e entidades. A Abrasca já se manifestou de forma contrária à necessidade de realização de oferta pública caso algum investidor atinja 30% de participação em empresa de controle difuso e contra a obrigatoriedade de divulgação da remuneração mínima, máxima e média dos administradores.

Esse último ponto já é obrigatório por uma resolução da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) desde 2009, mas diversas empresas fazem uso de uma liminar obtida pelo Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef) do Rio de Janeiro, que sustenta que ela viola o ‘direito à privacidade’.