Um dos fundadores da antiga Hedging-Griffo ao lado de Luis Stuhlberger, Leo Figueiredo e Eduardo Brenner, André Freitas montou e comandou por 10 anos a área de real estate da gestora — mais tarde adquirida pelo Credit Suisse. 

10675 34ab39fb c4d6 f2df 0df1 71aadc9f826eEm 2015, Freitas propôs ao CS o mesmo negócio que o banco fizera com Stuhlberger quando este fundou a Verde: um vôo solo, tendo o banco como sócio minoritário.  

O Credit Suisse declinou, e Freitas saiu de lá levando 10 pessoas para fundar a Hedge, que hoje tem R$ 3,4 bilhões de ativos sob gestão.

Fora do banco, Freitas se provou um concorrente incômodo.

Dono (na pessoa física) de uma fatia relevante dos FIIs de shoppings que o CS administrava, Freitas começou a pressionar por taxas de administração menores nos fundos. O movimento não lhe fez amigos na concorrência, que teve que baixar suas taxas também.

“Para performar — e ele performa — ele age com truculência, ele não é de passar a mão na cabeça de ninguém não,” diz um concorrente.

Mais tarde, pelo menos quatro FIIs que o CS administrava transferiram sua administração para a Hedge.

Hoje, a empresa gere e administra nove FIIs, incluindo o Hedge Brasil Shopping (HGBS11), o maior fundo do setor de shoppings.
 
O Brasil tem hoje 173 FIIs listados na Bolsa. O valor de mercado desses fundos mais que dobrou: de R$ 25 bilhões em 2015 para R$ 54 bi em fevereiro deste ano.

 
Despejados da zona de conforto pela queda da Selic, hoje mais de 285 mil brasileiros investem em fundos imobiliários; há um ano, o número não chegava a 150 mil.
 
Para Freitas, o mercado ainda vai acelerar. 


Qual o diferencial da Hedge no mercado de FIIs?

São três. O primeiro — que é o nosso grande diferencial — é que nós também investimos no produto junto com o cliente. Se o fundo for mal, eu sou o cara que mais vou perder dinheiro. Não só eu, mas toda a minha equipe de gestão. O segundo ponto é que nós realmente fazemos gestão ativa: procuramos extrair o máximo de cada ativo que temos e buscar sair de posições se percebemos que aquilo pode ser um detrator de rentabilidade mais para a frente. Tem muito gestor que diz que faz gestão ativa, mas só faz emissão e compra… faz emissão e compra… e nunca vendeu nada! O terceiro é que a gente realmente está procurando a estratégia que melhor se adeque ao momento. 
 
Você vê um problema em novas emissões?
 
As pessoas fazem novas ofertas com desconto de 15% sobre o valor patrimonial e vendem isso como o grande atrativo da oferta. “O meu produto está na Bolsa a R$ 100, mas nessa oferta você pode comprar a R$ 85.”  Mas e o cara que já pagou 100 na oferta anterior? Como ele vai fazer?  Você vai vender o mesmo portfólio e vai diluir esse sujeito, que é seu cliente anterior?  Aqui na Hedge, não fazemos emissões com desconto em relação à oferta anterior.
 
 
Uma das principais variáveis para um investimento imobiliário é a taxa de juros. A Selic hoje está em 6,5%, mas, com o risco político que temos aí, essa taxa em outros tempos estaria em 16,5%…. A taxa não pode estar errada?

Essa é uma dúvida que vamos ter a vida inteira e o gancho do que está acontecendo hoje. Se você olhar uns oito meses para trás, a gente perguntava para o investidor: “você vai continuar com um fundo de renda fixa, dando 0,4% ao mês?” E ele achava que a taxa de juros a 6,5% era algo temporário, que ia voltar a subir rápido e que por isso não precisava mexer no portfólio. Hoje, caiu a ficha. O investidor percebeu que o 6,5% veio para ficar (se não for cair ainda mais) e que ele precisa fazer alguma coisa a respeito. Qual o resultado disso? Em 31 de dezembro do ano passado o mercado de fundos imobiliários chegou a 200 mil investidores. Em 31 de março deste ano subiu para 287 mil e eu acredito que em 30 de junho vai chegar a 350 mil investidores. Ou seja, você vai sair em seis meses de 200 mil para 350 mil investidores.

Enquanto não tiver um choque de juros vai continuar subindo?

Se é que vai ter um choque. E com a Bolsa é a mesma coisa. Pega o investidor estrangeiro: year to date eles tiraram líquido US$ 250 milhões da Bolsa. Os institucionais, se você pegar os multimercados, todos eles reduziram a exposição. Entraram em janeiro com uma exposição de Bolsa e tem uma bem menor hoje. Quem está comprando Bolsa então? O investidor pessoa física. O que está acontecendo é uma migração forte da renda fixa para a renda variável, porque o investidor percebeu que os juros podem ficar baixos por um bom tempo. Na minha opinião, até pode cair mais: se a reforma da Previdência for aprovada, eu acho que a Selic deve cair mais 0,5 ponto. O que efetivamente está acontecendo é que o Brasil, que era o país da renda fixa, percebeu que as coisas mudaram. 

Nas últimas décadas, o Brasil talvez tenha feito a maior transferência de renda da história: do governo para o sistema financeiro. Ou melhor, do governo para qualquer pessoa que tinha renda. Não é à toa que você tem bancos hoje que valem US$ 60 bilhões no Brasil e que há 20 anos valiam US$ 1 bilhão. Como eles saíram de US$ 1 bilhão para US$ 60 bilhões? O País se ferrou inteiro. A culpa não é deles: lhes foram dadas condições para isso. Por isso que eu falo: será que os nossos juros hoje estão errados ou estavam errados antes? Será que precisávamos pagar esse prêmio todo que foi pago desde a redemocratização do País, desde os primeiros planos econômicos, quando tivemos juros reais às vezes de 15% ao ano? Nesse período, quem era rico ficou milionário e quem se endividou quebrou.

O que você diria a uma pessoa que ainda não investe, mas está interessada em colocar dinheiro em fundos imobiliários? 

O principal ponto é entender que real estate é igual commodities, é oferta e demanda e ciclos econômicos. Eu trabalhei um tempo com café e sempre acontecia o seguinte: o preço começava a melhorar, o cafeicultor começava a ganhar dinheiro, comprava o vizinho, depois comprava o outro vizinho e começava a produzir mais. Quando o cara ia ver ele já tinha o triplo da posição dele. Até o momento em que o café despencava e ele não entendia o porquê. Despencava porque eles produziram mais do que o consumo. Aí o café, que era o melhor negócio do mundo, se transformava no pior negócio do mundo. Fundo imobiliário é isso: tem a ver com ciclo econômico e com o ciclo do produto e se você entrar no topo do ciclo sua chance de ganhar dinheiro é mínima. 

Hoje, a tese para se comprar um fundo imobiliário ou uma BR Properties na Bolsa é exatamente essa: de que não vai ter supply novo chegando nos próximos três anos, a vacância vai reduzir e os aluguéis vão crescer.  O ciclo do produto já está claro, mas e se não houver uma boa reforma da Previdência e a economia embicar para baixo? Nesse caso, mesmo não havendo entrada de oferta, o imóvel que está pronto não vai ser ocupado….

Isso vai determinar a inclinação da curva, mas não vai frear o ciclo imobiliário. Se não tiver uma reforma da Previdência ou se chegarmos numa situação em que o investidor não acredita que o governo terá solidez fiscal no médio prazo, a Bolsa também vai cair. E é aí que entra um ponto interessante: os fundos imobiliários têm muito menos volatilidade, porque menos de 2% dos investidores são estrangeiros. Então, você falar que não terá mais reforma da Previdência não afeta tanto as cotas dos FIIs. Tem vários dias que você olha o IFIX e ele está estável ou para cima, enquanto a Bolsa está caindo 3%. 

Mas num cenário de crise é claro que tem um impacto grande: os juros vão subir e você vai ter uma acomodação de preços diferente por causa da taxa de juros. A cota dos FIIs tem uma correlação negativa de mais de 90% com a taxa de juros. Se a taxa de juros sobe, há um impacto negativo, mas menor que o impacto nas ações.

O ponto é esse. Se o País der certo, os FIIs vão subir parecido com as ações, mas se der errado, vão cair bem menos. E agora o investidor está pegando o ciclo imobiliário a seu favor, não vai entrar no topo do pico. A maioria dos preços hoje, em termos nominais, está abaixo dos preços de 2012. O aluguel do Infinity, onde fica o Credit Suisse, em 2012 era de R$ 180/m², hoje talvez tenha voltado para esse patamar, mas ficou muito tempo a R$ 140, R$ 130. O Pátio Malzoni chegou a negociar a R$ 220/m², hoje não tem locação nova nesse nível e deve estar perto de R$ 180. Passamos os últimos três anos conseguindo emitir apenas fundos de fundos (FOFs) ou de CRIs. Hoje, o mercado finalmente começa a conseguir fazer emissões primárias de fundos ‘de tijolo’. 
 
Dentro da classe de ativos ‘fundo imobiliário’, onde está a melhor oportunidade hoje?  Shoppings, escritórios ou logística?
 
O segmento que eu recomendo é shopping.  Um relatório da consultoria Fila mostra que no ano que vem serão entregues 900 mil metros quadrados de galpão. A resposta do mercado de galpão [à expectativa de melhora da economia], veja como ela é rápida.  Galpão é quase montar um Lego.  Com quatro ou cinco fornecedores, você monta. E se as licenças não te atrapalharem, você faz em oito ou dez meses. Então o mercado se ajusta muito rápido. Shopping não. É um aparelho diferente, e hoje a própria lei de zoneamento vai te criar dificuldade de abrir um shopping. O ciclo deste tipo de ativo é mais longo. “Pensei em fazer um shopping no Jabaquara.” Talvez, daqui a seis anos, você vai visitar esse shopping lá, mas seguramente não vai haver três desses. [Hoje, a Hedge gere fundos de shoppings e de logística, e não tem produtos específicos de lajes corporativas.]
 
Você não imagina como um filme como Vingadores — que vendeu US$1,2 bi no mundo todo nos cinco primeiros dias — muda a dinâmica de um shopping. Um shopping vendeu 1.800 ingressos antecipados para este filme.  Isso é receita de estacionamento, receita na praça de alimentação….  Você tem shoppings com sete salas de cinema: todas passando Vingadores.  Isso mostra como o shopping é a melhor forma de monetizar a retomada do consumo. 
 
O investidor de varejo — a sua tia aposentada — deveria investir num fundo de fundos ou num fundo com ativo específico?
 
A minha tia aposentada deve investir no fundo de fundos, porque ela vai ter alguém profissional fazendo as escolhas por ela. Mas se ela tiver um sobrinho esperto, ele aprende e depois faz suas próprias escolhas de ativos.  Mesmo uma fundação — que vai ter que investir mais nessa classe de ativos depois da nova regulação da Previc — ela deveria começar com fundo de fundos. O fundo de fundos antecipa sua curva de apendizado.