CARTAGENA, Colômbia – O clima quente desta cidade, onde a sensação térmica chega a ultrapassar 40ºC até mesmo à noite, combina bem com o momento da indústria de aço na América Latina.
As principais siderúrgicas da região estão se unindo para mirar em um inimigo comum: o aço chinês.
“O que está em jogo não é apenas o setor, mas o futuro industrial da América Latina,” Jorge Oliveira, o CEO da ArcelorMittal no Brasil e presidente da Alacero, a Associação de Aço da América Latina, disse ao Brazil Journal.

A fala aconteceu durante o Alacero Summit, em que o foco deixou de ser a inovação e temas de ESG na siderurgia (como visto em outros anos) para se tornar uma guerra aberta contra o principal parceiro comercial da região.
Não faltam motivos. As exportações de aço chinês para a região dispararam 54% entre 2022 e 2024, o que contribuiu para uma queda brutal dos preços. O preço médio de exportação da China caiu de US$ 580 em 2023 para US$ 460 este ano.
Segundo Ezequiel Tavernelli, o outro presidente da Alacero, a produção da China está em cerca de 1,2 bilhão de toneladas por ano, enquanto o consumo interno fica em 800 milhões de toneladas. O consumo global é de 1,8 bilhão de toneladas.
“Em 11 horas, a China produz o que a Colômbia faz em um ano. Em 12 dias, chega ao total produzido no Brasil,” Tavernelli disse ao Brazil Journal.
Segundo ele, a penetração do aço importado nunca foi tão alta na América Latina: atualmente, quatro em cada dez quilos de aço consumidos na América Latina vêm de fora – e a maior parte tem origem na China.
Essa aceleração teve início em 2021 com o estouro da bolha imobiliária na China. Ao perder seu principal motor de crescimento, Beijing inundou o mundo com seus produtos para sustentar a atividade econômica.
Segundo Margaret Myers, uma managing director do Johns Hopkins Institute, o 15º Plano Quinquenal do governo chinês consolidou essa guinada, e o país passou a exportar seu excesso de capacidade enquanto reorientava suas políticas industriais para fora.
Essa transição também foi impulsionada por novas estratégias como o Made in China 2025 e a política de “new infrastructure” – inundando o mundo com carros elétricos e pás para energia renovável. Tudo com muito aço.

Resultado: as exportações chinesas dispararam. No ano passado, a América Latina recebeu 12% do total, atrás do Sudeste Asiático (30%), Oriente Médio (18%) e África (16%).
Esse fato provocou uma combinação de queda de preços, perda de mercado e desaceleração da produção em toda a região, levando as siderúrgicas a operar com capacidade ociosa.
Em alguns países, como a Argentina, a produção industrial chegou a cair 10% no ano passado; em outros, como Colômbia e Brasil, o impacto se traduziu em estagnação e risco de desindustrialização.
Agora o consenso é que, sem medidas coordenadas, a pressão chinesa tende a ampliar o desemprego e o fechamento de plantas na região.
A ArcelorMittal, por exemplo, está em discussões se vai seguir com um plano de investimentos de até R$ 12 bilhões no Brasil no ciclo 2026-2030.
“Temos apetite para continuar investindo. Mas isso depende do ambiente. Se o governo tomar as medidas ideais, reduzindo a importação por cotas e aplicando maiores tarifas, seria uma alternativa,” disse o CEO da ArcelorMittal.
O discurso uníssono entre os empresários e executivos aqui no evento é de união.
Segundo Tavernelli, “não há tempo a perder”, e as medidas precisam ser rápidas e suficientemente profundas. “Uma tarifa não pode ser de 5%, mas de 50%, por exemplo, como fizeram os Estados Unidos,” disse o presidente da Alacero.
Martin Rappallini, o presidente da União Industrial Argentina, disse que “o problema com a China é que ela quer avançar em todas as cadeias” – do aço ao plástico, e em todas as matérias-primas.

“A China está presente em todos os países, fornecendo ou sendo a indústria do mundo. Por isso, todos os países precisam impor limites a esse avanço, que ameaça o emprego e a geração de valor,” disse o argentino.
Representante de outro setor que vem sofrendo com a competição chinesa, o CEO da Ford na América do Sul, Martin Galdeano, disse ao Brazil Journal que é necessário um envolvimento maior entre os países e a iniciativa privada.
Para ele, não se trata apenas aumentar as tarifas para os produtos chineses, mas também criar mecanismos em que haja uma relação de ganha-ganha entre o público e o privado.
Galdeano disse que na China há uma série de parcerias entre os estados e as montadoras.
“Não sou a favor de fechar o mercado, mas a regra do jogo tem que ser equivalente. Não queremos jogar uma Copa do Mundo com uma mochila de chumbo nas costas,” disse Galdeano.











