O acordo histórico pelo qual a Vale pagará R$ 37,7 bilhões a Minas Gerais é uma vitória espetacular para o Governo Romeu Zema, que conseguiu canalizar a maior parte da indenização para obras de infraestrutura num momento de penúria fiscal no Estado.
O acordo encerra os processos contra a Vale na Justiça comum pela tragédia de Brumadinho e indeniza o Estado por danos sócio-econômicos, ambientais e morais.
Cerca de 50% dos recursos vão viabilizar obras de infraestrutura com impactos duradouros — provavelmente o maior pacote de investimentos desde que Juscelino Kubitschek governou o estado com o binômio Energia e Transporte nos anos 50.
Na estimativa do Estado, as obras, que começam ainda este ano, devem gerar 360 mil empregos diretos e indiretos ao longo de sua execução, prevista para os próximos seis anos.
A maior delas é a construção de um rodoanel na região metropolitana de Belo Horizonte que promete desafogar o tráfego, reduzir o número de mortes e aumentar a competitividade da indústria automotiva mineira.
O acordo permitirá um upgrade substancial na malha rodoviária do Estado, com a adição de uma terceira faixa e o recapeamento das vias, além de um possível investimento no metrô de Belo Horizonte.
Há ainda obras relevantes de saneamento; a construção de cinco hospitais; a reforma de dezenas de escolas na região atingida; a recomposição do meio ambiente; a compra de novas aeronaves e equipamentos de comunicação para bombeiros e polícia militar; e um fundo de R$ 1 bilhão para financiar microempreendedores na região atingida.
“A disponibilidade de investimentos do Estado de Minas para este ano é de apenas R$ 250 milhões. No ritmo atual, precisaríamos de uns 70 anos para investir o que vamos fazer nos próximos seis,” Otto Levy, o secretário de planejamento que negociou pelo Estado desde o início, disse ao Brazil Journal.
O acordo marca o fim de uma negociação intensa que começou em maio de 2019 e esbarrou por muito tempo no valor da reparação, mas também na utilização e supervisão dos recursos. Além do Governo, o acordo envolveu os ministérios públicos estadual e federal.
“Este não é um acordo do Poder Executivo — é do Poder Público de Minas Gerais com a anuência do Ministério Público Federal,” disse Otto, um ex-executivo da Magnesita pela primeira vez num cargo público.
O rompimento da barragem em Brumadinho em 25 de janeiro de 2019 foi um dos maiores desastres ambientais do país, e aconteceu pouco mais de três anos depois de uma tragédia similar em Mariana. O rompimento causou um tsunami de lama e rejeitos de minério de ferro que matou 252 pessoas. Onze continuam desaparecidas.
Nos últimos meses, o acordo — que nem de longe apaga a tragédia mas planta uma semente de esperança no futuro econômico do estado — tornou-se a principal prioridade de Zema, um empresário sem muito traquejo social que estreou na política enfrentando um dos turnarounds mais dramáticos de finanças públicas no País.
Desde que assumiu, Zema reduziu o gasto de pessoal como proporção da receita líquida corrente de 68% para 53%. Em valores absolutos, isso representa uma redução de 25% na despesa com pessoal, uma conquista inédita entre os estados.
E em que pese as críticas à sua falta de jogo de cintura, Zema também conseguiu aprovar a reforma da previdência do estado, que vai economizar R$ 25 bi nos próximos 10 anos.
O próximo desafio: aderir ao novo regime de recuperação fiscal e privatizar estatais.
Apesar dos avanços, Minas continua com capacidade de investimento zero e dificuldades de bancar seu custeio.
“Isso mostra como este acordo foi feito com espírito republicano,” diz Otto. “Se o governador quisesse, ele poderia tentar usar o dinheiro para resolver o problema de caixa dele, mas isso seria compensar os atingidos? Seria remediar a tragédia?”