Em 2002, a Biobrás — uma empresa mineira que na época era a quarta maior fabricante de insulina do mundo — foi vendida para a Novo Nordisk por pouco mais de R$ 100 milhões.
Na transação, no entanto, a dinamarquesa ficou apenas com a operação fabril. Pouco antes da venda, os fundadores fizeram uma cisão do restante da companhia, mantendo as patentes mundiais, a tecnologia, os pesquisadores e o know-how do processo de produção de insulina.
Rebatizada de BIOMM, essa nova companhia passou os primeiros 12 anos atuando basicamente como uma empresa de consultoria.
Foi só em 2014 — quando o non-compete acabou — que os acionistas puderam voltar ao mercado. Com R$ 350 milhões levantados num re-IPO, construíram uma fábrica em Nova Lima e bancaram uma equipe comercial. Em sua nova fase, a BIOMM passou a licenciar biomedicamentos de farmacêuticas internacionais que não têm presença no Brasil.
Agora, a empresa está colhendo os primeiros frutos dessa estratégia.
Ao longo dos últimos cinco anos, a BIOMM conseguiu aprovar cinco medicamentos licenciados na Anvisa e está com outros quatro em fase de análise da agência reguladora — incluindo uma vacina inalável para a covid.
Com esse portfólio de medicamentos, a BIOMM faturou cerca de R$ 100 milhões no ano passado, um crescimento de 35%. O EBITDA e o bottom line, no entanto, ainda estão no vermelho.
“Estamos conseguindo ganhar share muito rapidamente nesses mercados,” Heraldo Marchezini, o CEO da empresa, disse ao Brazil Journal. “Com o Glargilin [um biossimilar da insulina glargina usado para tratar diabetes] já temos 24% do mercado, mesmo competindo com duas grandes multinacionais. No Herzuma [usado para o tratamento do câncer de mama], temos 18% de share e já somos a segunda maior empresa do mercado.”
Os outros medicamentos no portfólio são o Afrezza, uma insulina inalável produzido pela americana Mannking; o Wosulin, uma insulina humana recombinante da indiana Wockhardt; e o Ghemaxan, um biomedicamento da italiana Chemi, usado para tratar a trombose venosa profunda.
A BIOMM é listada na Bolsa desde a cisão — mas seu free float é extremamente baixo, com menos de 10% das ações em circulação no mercado.
O restante do capital está concentrado nas mãos das três famílias fundadoras — os Emrich, os Gaetani e os Mares Guia — que juntos têm 24% do capital. Outros acionistas importantes são o fundo TMG, que tem 13%; o BNDES, que tem 9%; o fundo Lab, com outros 9%; e a XP, que tem mais 5% das ações.
Nos últimos anos, a BIOMM tentou acessar o mercado duas vezes. A ideia era levantar recursos para continuar crescendo – num negócio que é intensivo em capital – bem como atrair novos investidores e aumentar a liquidez do papel; nas duas vezes, no entanto, o mercado fechou, e a empresa acabou recorrendo a um private placement.
Em 2021, a empresa recrutou o BTG e o Safra para coordenar o follow-on. No ano passado, contratou a XP e o Itaú BBA.
O follow-on continua um tema recorrente no conselho, que espera a próxima janela de mercado para tentar de novo, uma pessoa a par dos planos da empresa disse ao Brazil Journal.
A tese da BIOMM é que o mercado farmacêutico está caminhando cada vez mais na direção dos biomedicamentos, que já respondem por 7 dos 10 remédios mais vendidos do mundo e 30% de toda a venda de medicamentos.
“Para surfar essa tendência, a companhia vai precisar de uma estrutura de capital adequada, que consiga suportar esse crescimento necessário,” disse a fonte.
De forma simples, os biomedicamentos são essencialmente remédios feitos a partir de um ser vivo, como uma bactéria ou anticorpos, enquanto os medicamentos tradicionais são frutos de um processo químico.
“Se a gente olhar o que os anticorpos monoclonais podem fazer, por exemplo, são ganhos terapêuticos expressivos em relação aos medicamentos tradicionais,” disse Heraldo. “É uma evolução importante dos tratamentos.”
A BIOMM pretende continuar ampliando seu portfólio com outras parcerias com farmacêuticas estrangeiras. Os contratos da BIOMM são de longo prazo — tipicamente de 15 a 20 anos — e dão exclusividade para a companhia operar o medicamento no mercado brasileiro.
Segundo Heraldo, a tese é construir um portfólio diversificado que não fique ancorado em poucos parceiros.
“Nossa ideia é ir atrás de biomedicamentos que terão necessidade alta no Brasil e que tem grande probabilidade de serem aprovados na Anvisa,” disse ele.
O modelo da BIOMM é diferente do da Biotoscana, por exemplo, justamente porque ela era muito ancorada em poucos parceiros, e acabava trazendo os medicamentos que aqueles parceiros tinham e não necessariamente os que o Brasil precisava, disse Heraldo.
Sobre o crescimento da receita, o CEO disse que é difícil projetar porque tem algumas licitações públicas que a empresa pode ganhar e aumentar muito as vendas, assim como há outras licitações que a empresa já atende que podem terminar este ano.
“O mais importante é ver o ganho de participação no segmento privado. Temos visto um crescimento sustentável do Glargilin e do Herzuma, que indicam um caminho muito positivo.”
A companhia também está prestes a começar a produzir o Glargilin em sua fábrica em Nova Lima, o que deve aumentar a escala e reduzir os custos de produção, dado que a logística da insulina é extremamente complexa. A fábrica já está pronta há alguns anos, e está finalizando o processo de certificações.
A insulina deve ser o primeiro produto que será produzido na fábrica, mas a ideia é fabricar outros biomedicamentos do portfólio no futuro.