Desde que voltou ao comando da Technos em maio de 2019, o CEO Joaquim Ribeiro tem empreendido um turnaround para salvar a fabricante centenária de relógios, dona das marcas Technos, Dumont e Condor.

Na semana passada, os primeiros frutos começaram a aparecer.  

11369 45c45203 f8e2 e97e 7677 fa6780283f41Depois de um primeiro semestre catastrófico, a Technos teve o melhor semestre em cinco anos. O EBITDA do trimestre, que cresceu 74%, foi maior que o EBITDA que a empresa fez nos anos inteiros de 2019, 2018 e 2017.  

Tanto a queda da Technos quanto seu turnaround ora em curso oferecem lições valiosas sobre como um ambiente de recessão econômica pode mascarar erros de estratégia e execução — além de ilustrar como a leitura errada dos impactos de uma inovação pode comprometer até um negócio que sempre rodou redondo.

Antes uma companhia prestigiada por gestoras como Dynamo, Victoria e Gávea — que compraram o controle da empresa em 2008 e fizeram seu IPO em 2011 — a Technos é hoje uma ‘microcap’ que vale apenas R$ 118 milhões na Bolsa, menos que muitas startups sem receita.

Joaquim entrou junto com as gestoras, deixou o cargo em 2014 — no início da Grande Recessão — e voltou cinco anos depois, quando que a Technos já havia sido arrasada por erros estratégicos e pelo pânico dos investidores em relação ao Apple Watch, que, muitos acreditavam, aposentaria os relógios tradicionais.

“Olhando em retrospecto, tentamos fazer uma transformação profunda num negócio cujo ‘core business’ era mais resiliente e tinha um futuro mais brilhante do que a gente imaginava,” Joaquim disse domingo ao Brazil Journal. “Na prática, começamos a diversificar produto e canais de distribuição, dando muito menos atenção ao nosso negócio e canal ‘core’.” 

Dona de seis marcas próprias e licenciadora de outras 11, a Technos chegou a projetar uma fábrica de jóias em Manaus e começou a comercializar óculos para diversificar seu negócio e reagir a um mundo em que o Apple Watch supostamente se tornaria dominante.

Os projetos não vingaram, mas fizeram a companhia perder o foco no seu negócio core, que entrou em declínio.  

Em 2019, Joaquim começou a colocar a empresa nos trilhos, mas “quando estávamos quase prontos para a mudança de chave, veio a pandemia.” 

Quando a covid deixou a China para invadir o mundo, a Technos se viu diante de um desafio existencial: tinha caixa para apenas dois meses e uma dívida de R$ 150 milhões, com boa parte vencendo no curto prazo.

A situação dramática acabou acelerando o turnaround da empresa. 

A Technos cortou o quadro de funcionários em 33%; terceirizou toda a área de assistência técnica; fechou sua fábrica em Manaus de abril a setembro; e renegociou com fornecedores. Além disso, fez uma reengenharia de produtos para adequar seus custos e margens à nova realidade de câmbio.

O resultado apareceu. A empresa conseguiu reduzir sua queima de caixa em 70% e alongar a dívida para um prazo médio de 4,3 anos.  

Renato Goettems, um dos fundadores da Technos, tornou-se chairman quando Joaquim voltou. Hoje, os administradores são os maiores acionistas da companhia, com 16,6% do capital. Fundos estrangeiros têm outros 11% num swap com o Morgan Stanley. A Dynamo, que já foi o maior acionista, tem vendido nos últimos meses e agora só tem 4,8%. 

Um acionista recente é o francês Aymeric Chaumet, um investidor e empreendedor do setor que começou a comprar ações da empresa nos últimos meses e já tem 10% do capital. Chaumet, hoje no board do grupo italiano Morelatto, conhece a Technos desde 2012, quando explorou uma parceria com a empresa.

(Não confundir Monsieur Chaumet com os herdeiros da Chaumet, aquela maison que, pouco depois de ser fundada em Paris em 1780, tornou-se a joalheria oficial da imperatriz Josephine, mulher de Napoleão Bonaparte.) 

O próximo passo de Joaquim é a transformação digital da Technos. Hoje, a companhia tem 90% de sua receita no B2B: são mais de 9 mil clientes, de grandes redes como a Renner e a Riachuelo até pequenas relojoarias. Os 10% restantes vêm de lojas próprias (outlets e franquias) e do ecommerce.  

“Essa transformação digital não é só de canal, mas também de produto. Tão importante quanto falar de ecommerce é falar dos smartwatches,” diz Joaquim. “Essa companhia já viu os smartwatches como ameaça, hoje vê como oportunidade.”