O mundo já está relativamente bem servido de biografias de Adolf Hitler.  Já houve a de Alan Bullock, a de Joachim Fest e a de Ian Kershaw, publicada no Brasil pela Companhia das Letras.
 
Mas é impossível deixar de apreciar o senso de oportunidade dos editores que acabam de lançar “Hitler: Ascent, 1889-1939”, que aborda especificamente a ascensão do monstro genocido-populista.
 
Você não precisa nem ler as 998 páginas da obra do historiador Volker Ullrich para entender o porquê.  Pode ficar apenas com a resenha feita por Michiko Kakutani, a crítica literária do The New York Times.
 
Segundo Kakutani, o livro tenta responder às seguintes perguntas:  “Como Adolf Hitler — descrito em 1930 pelo editor de uma revista como ‘um patife meio maluco’, ‘um imbecil patético’, um ‘falastrão’ — subiu ao poder na terra de Goethe e Beethoven? O que persuadiu milhões de alemães a abraçar Hitler e sua doutrina do ódio? Como o mais improvável pretendente a um alto cargo público conseguiu poder absoluto em um país outrora democrático e o colocou numa trajetória de horror monstruoso?” 
 
Kakutani nota que biógrafos anteriores “formularam teorias sobre a ascensão de Hitler, e a dinâmica entre o homem e seu tempo. Alguns focaram nas condições sociais e políticas da Alemanha pós -Primeira Guerra, que Hitler explorou com inteligência — amargura em relação aos termos do Tratado de Versalhes e o desejo de um retorno à grandeza alemã; desemprego e dificuldade econômica em meio à Depressão mundial do início dos anos 1930; e preconceitos étnicos históricos e medo de ‘estrangeirização.’”
 
Neste livro, Ullrich foca em Hitler como um político que subiu ao poder “por meio da demagogia, performance teatral e apelos nacionalistas às massas,” e lista os fatores “que ajudaram a transformar um simples ‘agitador de Munique’ — considerado por muitos como ‘um palhaço obcecado por si mesmo’ — no senhor e mestre do Reich.”
 
Antes e durante sua ascensão ao poder, “Hitler era frequentemente descrito como um egomaníaco que ‘ama apenas a si mesmo’ — um narcisista com gosto pela auto-dramatização e o que Ullrich chama de ‘um pendor característico por superlativos’.  Seus discursos maníacos e tendência a tomar riscos tudo-ou-nada geravam dúvidas sobre sua capacidade de auto-controle, e até sobre sua sanidade. Mas Ullrich ressalta a astúcia de Hitler como político — com um ‘olho afiado para os pontos fortes e as vulnerabilidades das pessoas’.”
 
O livro cita um ex-ministro das finanças que escreveu que Hitler “era tão completamente falso que ele já não podia distinguir entre a verdade e a mentira”, e editores do seu “Mein Kampf” descreveram o livro como um “pântano de mentiras, distorções, insinuações, meias verdades e fatos reais.”
 
Hitler “se apresentava em termos messiânicos, prometendo ‘liderar a Alemanha em uma nova era de grandeza nacional’, embora fosse vago sobre seus planos reais. Ele sempre evocava uma época de ouro para o país, e, segundo Ullrich, pintava o presente ‘em tons mais escuros’. “Onde quer que você olhasse, havia (no discurso de Hitler) apenas declínio e decadência.”
 
Segundo Kakutani, o ditador “não apenas se tornaria, nas palavras de Ullrich, ‘um porta-voz do pessimismo cultural’ que crescia nos círculos de direita na República de Weimar, mas também o avatar do que Thomas Mann identificou como um afastamento da razão e dos princípios fundamentais de uma sociedade civil — ‘liberdade, igualdade, educação, otimismo e crença no progresso’”.
 
Vou parar antes de infringir alguma lei de copyright por copiar tantas aspas, mas deixo aqui uma pergunta retórica:

Onde foi que eu já vi e ouvi isso antes?