Numa mansão na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, Bruno Bittencourt (o PlayHard), Pedro Gelli (o Gelli Clash), e Carol Azeredo (a Fun Babe), dividem as alegrias e angústias da fama precoce.

Os youtubers — verdadeiras celebridades no mundo dos games — moram na Gameland, uma “casa dos sonhos” de 1,5 mil metros quadrados que funciona como estúdio e pertence à Final Level, a plataforma de conteúdo gamer lançada há um ano para se tornar o ponto de encontro dos fãs de jogos eletrônicos no Brasil.

Ali, os jovens de 20 e poucos anos 
ganham dinheiro de gente grande recebendo convidados, fazendo ações com patrocinadores e gravando vídeos que são assistidos por mais de 20 milhões de fãs. Os temas vão desde lives de jogos e tutoriais até desafios e “trollagens.” 

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(O hit do momento é o “Free Fire,” um joguinho de tiro no celular). 

Por trás da vida dos sonhos dos três está a Go4it, a gestora de Marc Lemann e Cesar Villares que trabalha como marketing agent de Gabriel Medina e já investiu em empresas como a Fazenda Futuro e a Strava

A Final Level possui outros sócios de peso como Felipe Neto, o quinto maior youtuber do mundo, e João Pedro Paes Leme, o ex-diretor executivo de esportes da Rede Globo.

A audiência é de dar inveja a muito canal de TV aberta e ilustra o potencial de um mercado que movimentou US$ 135 bilhões no ano passado, no mundo todo — mais que as indústrias de cinema e música somadas.

Mais de 2,5 bilhões de pessoas em todo o mundo jogam algum jogo eletrônico — no celular, no PC ou em consoles e os chamados eSports já têm uma audiência global de 450 milhões de pessoas.

PlayHard tem mais de 9,5 milhões de seguidores no Youtube — quase o dobro dos 5 milhões que o Presidente Bolsonaro tem no Twitter — além de alguns outros milhões no Instagram. Gelli Clash tem 6,7 milhões divididos em dois canais, e Fun Babe, 2,1 milhões. Em apenas um ano no ar, o canal de Youtube da Final Level chegou a 3,4 milhões de inscritos.

Na hora de vender os patrocínios, a Final Level opera como um hub de conteúdo, oferecendo aos anunciantes pacotes que incluem inserções da marca nos vídeos da Final Level e nos canais pessoais dos três youtubers, além de postagens nas redes sociais e branded content.

Antes de entrar no ar ano passado, a Final Level fechou com quatro grandes patrocinadores — Oi, Smartfit, Subway e Reserva — que acabam de renovar o contrato por mais 12 meses. 

“As marcas enxergam valor porque os resultados vêm acima da expectativa,” Fernanda Lobão, a CEO da Final Level, disse ao Brazil Journal. “Recentemente, o iFood fez uma ativação com a gente com o objetivo de gerar uma conversão de 10 mil novos clientes. Em 30 dias, chegamos em 18 mil.”10779 8fa0fb77 a43a 492b 21c1 e87298302f52

Outra fonte de receita é a publicidade do próprio Youtube, que paga um valor mensal pelas visualizações de todos os vídeos. Nesta vertical, quanto maior o inventário de conteúdo, maior a receita, já que os vídeos continuam monetizando mesmo depois do lançamento. 

“Este é um universo novo e muito pulverizado: tem times, ligas, plataformas globais e locais, serviços de streaming, parcerias online e offline… ,” o chief marketing officer de uma multinacional disse ao Brazil Journal. “É difícil para os CMOs entrarem de cabeça porque se trata de um universo mais próximo dos seus filhos do que deles mesmos, mas eles estão tateando.”

Fernanda, que já trabalhou na área de marketing e comunicação da Oi, Claro e do SportTV — e que já era uma das sócias da Go4it — virou CEO da Final Level em abril. 

Desde então, afinou o modelo de negócios, cortou custos e mudou o formato de remuneração dos influenciadores, que agora são “sócios do resultado da empresa.” 

O objetivo é motivar e reter os talentos.

Há alguns meses, a Gameland sofreu baixas importantes na linha de frente: “Sheviii” e “Robin Hood Gamer” deixaram a casa para tocar outros projetos. Dos quatro moradores atuais, apenas PlayHard está desde o lançamento — Gelli Clash e Fun Babe entraram há alguns meses, assim como Gabriel Araújo, o quarto morador e o diretor de conteúdo da Final Level.

“Toda a receita que a Final Level ganha é dividida com eles de acordo com o contrato e a relevância que cada um tem no negócio,” diz Fernanda. “Já no canal pessoal, a gente participa apenas dos resultados que foram gerados pela Final Level. Os negócios que eles geram diretamente — por exemplo o AdSense do Youtube — são só deles.”

Fernanda diz que o negócio vem multiplicando de tamanho todos os meses e que chegou ao breakeven em julho, depois de meses de investimentos pesados. Até o fim de 2020, a expectativa é triplicar a receita. 

A Final Level quer internacionalizar a empresa — replicando o modelo em outros países da América Latina — e entrar em novas verticais. No caso da internacionalização, os vídeos seriam feitos em parceria com influenciadores locais.

A Go4it já investe em outros ativos de games. Em parceria com a Globo, a gestora lançou há dois anos o prêmio eSports Brasil, uma espécie de Oscar dos jogos eletrônicos. Além disso, investiu na européia G2, também de eSports, e na Gamers Club, que organiza competições de Counter Strike (outro jogo de tiro online) no Brasil. 

A ascensão dos três youtubers da Final Level foi rápida até para os padrões das redes sociais — que criam e destroem celebridades quase diariamente.

PlayHard, que até um ano atrás morava em Viçosa, no interior de Minas Gerais, ainda não acredita na proporção que a brincadeira tomou. Ele diz que criou o canal apenas para matar o tédio e “desestressar” da rotina de faculdade/trabalho. 

Gelli Clash tem uma trajetória tão despretensiosa quanto: gostava de um jogo de celular e começou a postar tutoriais e dicas para ajudar os “novatos”.

Hoje, são vistos e tratados como celebridades. Na Game XP, um dos maiores eventos de games do Brasil, foram ovacionados e recebidos como pop stars por uma plateia de dezenas de milhares de fãs. Na hora de deixar o palco, tiveram que sair escoltados por seguranças em meio ao choro de alguns seguidores. 

Mas a fama também tem suas dores — e o sucesso de um youtuber pode ser tão efêmero quanto uma partida de “Free Fire”.

“Nossa principal angústia é que somos reféns de uma plataforma ou de um comportamento da sociedade,” PlayHard disse ao Brazil Journal. “Se as pessoas decidirem que o jogo que eu gosto não é mais legal ou se aparecer alguém mais interessante do que eu, meus números podem cair drasticamente.”

“A internet é muito instável,” completa Gelli Clash. “A gente acha que está por cima, mas pode descobrir daqui um ou dois anos que não está mais.”