Quando anunciou em abril que deixaria o comando da CPFL Energia, Wilson Ferreira Jr. parecia mais disposto a se dedicar à sua coleção de 32 carros antigos do que a encarar uma bucha da envergadura da Eletrobras, empresa que vai assumir no final deste mês. Pelo jeito, sua vontade de continuar sendo um protagonista no setor elétrico (e um ego proporcional ao desafio da estatal) falaram mais alto.Wilson Ferreira Jr.

Não há, nem na Faria Lima nem em Brasilia, a menor dúvida de que Ferreira é o melhor nome que o Governo poderia conseguir para a Eletrobras. David Zylbersztajn, ex-professor de Ferreira na USP e responsável por sua nomeação como diretor de distribuição da Cesp lá se vão 20 anos, diz que Ferreira era “um aluno brilhante.”  O aluno brilhante virou um chefe exigente e duro no mundo corporativo.

Nascido em São Paulo, Ferreira se formou em engenharia elétrica e administração no Mackenzie. Deu conta das duas faculdades quase ao mesmo tempo. Terminou a engenharia em 1981 e a administração em 1983. Colocou o pé no setor público em 1986, quando foi para a Cesp, e entrou na CPFL em 2000, quando a empresa acabara de ser privatizada, já no cargo de presidente. Nos dois anos anteriores, comandou a Rio Grande Energia, criada com a desestatização da distribuição de energia elétrica no Rio Grande do Sul.

Nos últimos 16 anos, Ferreira reestruturou a CPFL e expandiu sua atuação, fazendo da empresa o maior grupo privado do setor elétrico, com 13% do mercado de distribuição, e a mais admirada do setor. 

Ferreira também expandiu seu poder para além dos transformadores da CPFL. Recebido por ministros e influente nas decisões do setor — onde era o CEO favorito de Dilma Rousseff — sempre gostou de ser protagonista. “A energia elétrica ficou pequena para ele, agora ele quer ser visto como uma liderança da área de infraestrutura”, diz um executivo que trabalhou com Ferreira, que hoje preside o conselho de administração da Abdib, a associação que represente as indústrias de base e infraestrutura.

No começo do ano, foi sondado para ser ministro das Minas e Energia. Dizia aos mais próximos que nunca pensou em aceitar o cargo, mas ficava evidente que queria muito ser chamado, ainda que fosse para recusar.

Avesso a rodeios, não poupa ninguém quando desaprova um trabalho. “Se fosse para fazer isso, era melhor nem ter feito” é o tipo de comentário que ele faz quando acha que um funcionário deixou a desejar. É impossível sair de uma reunião com ele sem cheirar a cigarro. Fumante inveterado, acende um cigarro atrás do outro dentro da própria sala, não importa se está sozinho ou acompanhado.

Na Eletrobras, o executivo precisará sanear as finanças o quanto antes, encabeçando um processo de privatização de parte da holding. Ao mesmo tempo, terá que injetar ordem e eficiência na gestão da companhia, hospedeira de interesses políticos desde a redemocratização. Hoje, cada empresa da Eletrobras trabalha de forma independente, fazendo o que bem entende. Ferreira deverá fazer uma reorganização interna, se livrar dos ativos deficitários, e recolocar a empresa no caminho do lucro.

Anos de intervencionismo insano — guiados pessoalmente pela presidente Dilma desde seus tempos de ministra de Minas e Energia — deixaram a Eletrobras em situação falimentar.  Sua dívida líquida chegou a R$ 25,5 bilhões no primeiro trimestre deste ano.  No ano passado, deu prejuízo de R$ 14,5 bilhões. O último ano em que o balanço viu a cor azul foi 2011, quando o lucro foi de R$ 3,7 bilhões.

Embora tenha conseguido modernizar a CPFL e colocá-la no rol das empresas sérias e bem administradas, Ferreira é visto como um gestor antiquado. Preza pelo respeito à hierarquia e estimula o conflito entre os funcionários. Gosta de semear a discórdia e a competição. “Ele é o tipo de chefe que fala: esse cara está dando mais resultado que você, vai deixar por isso mesmo? Ou: tem certeza de que esse problema não é seu? Vai deixar outro resolver por você?”, diz essa mesma fonte.

Para o mercado, a grande interrogação é se um ‘CEO imperial’ do setor privado pode conseguir os mesmos resultados numa estrutura tão inchada, paquidérmica e hiperregulada quanto a da Eletrobras. Ferreira vai precisar de muitos cigarros e doses inéditas de paciência — ou scotch.

“Na CPFL, quando ele queria alugar um helicóptero para ir visitar uma planta, era só ligar para a secretária e pronto,” diz um funcionário de outra estatal do setor elétrico.  “Agora, a secretária dele vai ter que checar se um avião da FAB está disponível e esperar três dias pela resposta.  E, se a resposta for negativa, vai ter que fazer uma cotação entre várias empresas para achar o vôo mais barato.  As coisas do lado de cá não são tão simples quanto numa empresa privada.”