Vinicius Roveda passou a juventude dentro de um motel. 

No final dos anos 1970, seu pai fundou o primeiro estabelecimento deste tipo em Santa Maria, no interior do Rio Grande do Sul, onde ele dividia o tempo entre a recepção e a lavanderia do pequeno Bangalô (o nome do motel).

Lá — entre casais apaixonados e lençóis usados — começou sua paixão pelo setor, e Roveda passou a acompanhar a ascensão e as mudanças dos motéis no Brasil.

Nos anos 2000, depois de se formar advogado e largar brevemente a carreira de moteleiro, Roveda abriu uma consultoria de gestão de motéis e criou a Drops, a primeira rede de franquias do setor no Brasil, hoje com sete unidades. 

Agora, o empreendedor decidiu transformar sua paixão num livro. “Como os motéis se tornaram um negócio bilionário no Brasil” é apenas a segunda obra sobre a indústria de motéis brasileira — a primeira foi “Arquitetura dos Motéis Cariocas”, um tratado sociológico escrito em 1980 e que analisa o surgimento dos motéis no Brasil.

O entra e sai dos motéis movimenta mais de R$ 4 bilhões por ano, e Roveda está prevendo uma nova “década de ouro.”

Nos últimos dois anos, o setor de motéis cresceu em média 5% no Brasil. A Associação Brasileira de Motéis estima um crescimento de 30% ao longo dos próximos três.

O Brazil Journal conversou com Roveda sobre esse nicho da indústria do prazer.

O que mudou nos móteis nas últimas décadas? 

Os móteis começaram no Brasil no final dos anos 70, no Rio de Janeiro (o primeiro motel do País foi o Holiday que ficava no centro do Rio e que fechou há alguns anos) e se expandiram pelo País inteiro. No início dos anos 80 tivemos a década de ouro do setor, quando surgiram muitos motéis e se ganhou muito dinheiro com isso. Era uma época onde o liberalismo sexual no Brasil tava em alta, em parte pelo final da ditadura e pelo movimento dos hippies… E isso fez com que os móteis ganhassem aquela cara de uma certa vulgaridade, um lugar pra você ir com a amante. Era uma visão bem diferente do setor. Lá pra 1995 mais ou menos, a indústria começou a entrar numa certa decadência, com muitos motéis fechando, até que em meados dos anos 2000 o segmento começou a passar por uma grande transformação  de conceito principalmente  e que começou pelo Nordeste. 

Como foi essa transformação?

Alguns motéis começaram a investir em ambientes melhores, com uma proposta de valor e serviço mais sofisticada e principalmente foco nos casais com relacionamentos estáveis. Isso começou a dar muito certo e foi se espalhando. Hoje, isso está virando pouco a pouco o padrão: mais de 15% a 20% dos móteis já são focados nos casais estáveis, e 71% dos fãs de carteirinha dos motéis (aqueles que vão pelo menos uma vez por semana) tem esse perfil. 

Olhando um quarto de motel hoje e um dos anos 70, o que mudou?

O ambiente mudou completamente. Antigamente era muito comum ter aquela cama redonda, um carpete vermelho, um espelho com um desenho erótico, sensual. Isso sumiu. Hoje, os ambientes são mais modernos, com um design arrojado, peças de decoração, e sem essa questão da vulgaridade. É um ambiente que é quase como um hotel boutique. O motel hoje tem que funcionar como uma ilha, um oásis onde o casal vai para ter um tempo só para eles, longe dos filhos, da família e das preocupações, para ter duas, três, quatro horas de lazer.

Você acha que os motéis vão continuar existindo daqui a 20, 30 anos?

Eu acho que grande parte dos brasileiros não vivencia e às vezes nem sabe desse novo conceito de motel, principalmente porque ainda faltam em algumas regiões motéis com esse tipo de serviço e estrutura. Além disso, o mercado hoje é muito pulverizado, não tem nenhuma grande rede como vemos no mercado de hotelaria, o que representa uma oportunidade enorme de consolidação. 

Nos próximos dez anos eu acho que não só os motéis vão continuar existindo como vamos viver uma nova década de ouro dos motéis no Brasil, com novos motéis surgindo e com uma certa consolidação do setor. Mas olhando para 30 anos é mais complicado de prever, porque o pessoal que é bem novo hoje vai crescer num mundo completamente diferente. Acho que isso pode ser um desafio pro setor: os quartos vão ter que ter novos atrativos, um ambiente que proporcione uma experiência diferente pra convencer essa geração — que inclusive está fazendo menos sexo — a sair de casa. O setor vai ter que continuar evoluindo, como evoluiu nas últimas décadas.

Quais são as principais tendências do setor para os próximos anos?

Vejo quatro grandes tendências, que descrevo no livro. A primeira delas é o autoatendimento: já vemos isso ocorrendo na hotelaria de forma incipiente, e em alguns poucos motéis tem começado a experimentar. Do cliente chegar e conseguir fazer o check-in na entrada com um totem, sem ter que falar com o atendente. 

A segunda tendência seria a reserva por aplicativo. Hoje, mais de 90% do volume de clientes dos motéis faz as reservas na hora, no ponto físico. Mas isso deve mudar bastante nos próximos anos. O Guia de Motéis lançou um aplicativo recentemente, que se chama Guia Go, que é como se fosse o “Uber dos Motéis”. Com esse app o cliente consegue reservar e pagar a suíte de diversos motéis pelo aplicativo: ele faz a reserva de qualquer lugar, já paga e só vai ter que chegar lá e pegar a chave. No futuro, o consumidor vai poder fazer isso tudo sem nenhum contato com funcionários. 

O terceiro ponto, que já tem uma ligação com o segundo, são os marketplaces. Os motéis vão começar cada vez mais a vender seus serviços em plataformas como Hotel.com, Booking, Hotel Urbano… E a quarta é a arquitetura das suítes. Acho que os motéis vão trabalhar cada vez mais essa questão da arquitetura dos quartos, do design interior e das experiências — agregando novos serviços.