Quando Alexander Vik levou o filho para conhecer a avó uruguaia, nos anos 2000, não imaginava que aquela viagem mudaria tudo.
O empresário, investidor e filantropo sueco, conhecido por seus empreendimentos nos setores financeiro e tecnológico, nunca havia visitado o país de origem de sua mãe.
Apaixonou-se por José Ignacio, um balneário ainda adormecido no litoral uruguaio, onde comprou uma casa de praia. Quatro mil acres depois, nascia o hotel Estancia VIK, inaugurado em 2006.
Mas foi em 2004, no Chile, que a história começou, com o lançamento do projeto VIK, uma aposta ousada de produzir um dos melhores vinhos do mundo.
O casal lançou uma busca quase científica pelo terroir perfeito na América do Sul. Reunindo enólogos, geólogos e agrônomos, mapearam a América do Sul até encontrar o terroir perfeito em Millahue, no Vale de Cachapoal — “lugar de ouro” na língua mapuche. Ali, plantaram as primeiras vinhas em 2006. Duas décadas depois, a VIK transcendeu o vinho: tornou-se um ecossistema de arte, arquitetura, gastronomia e hospitalidade que se estende de Millahue às dunas uruguaias, das colinas paulistas de Araçoiaba à Galleria milanesa.
No comando técnico da vinícola está o chileno Cristian Vallejo, um enólogo que já passou pelo Château Margaux, em Bordeaux, e que hoje defende Millahue como uma das novas fronteiras para a Cabernet de classe mundial.
É ele quem elabora vinhos que unem rigor técnico e práticas sustentáveis, com destaque para o VIK 2021, um tinto musculoso e refinado de Cabernet Franc e Cabernet Sauvignon que recebeu 100 pontos do crítico James Suckling, e o disruptivo STONEVIK 2024, que alcançou 98 pontos e foi considerado um dos vinhos mais inovadores dos últimos tempos.
Este último é talvez a expressão mais radical do projeto: fermentado em ciclo lunar em barricas criadas pela própria VIK, amadurecido em sete ânforas de argila da propriedade, semienterradas na floresta, no topo da montanha La Robleria. Um vinho criado “na natureza e pela natureza”.
Pude comprovar a inovação, uma marca da VIK, na minha visita por lá, há poucos meses. Destacam-se o Barroir (tosta com carvalho local que imprime o terroir aos barris), o Amphoir (vinificação em ânforas de argila do próprio vale) e o uso de leveduras nativas. A colheita noturna manual preserva a fruta e reduz o consumo energético. Tudo isso em uma vinícola que protege 2 mil hectares de corredores biológicos.
Os vinhos encontram eco no extraordinário Hotel VIK Chile, pousado no alto de uma colina com vista para os vinhedos. Ali, arquitetura escultórica e obras de arte se espalham pelos espaços. É um destino que entrelaça vinho, paisagem, arte e gastronomia.
No Uruguai, a VIK desenhou um quarteto de hospitalidade em José Ignacio – sinônimo de sofisticação despretensiosa na América do Sul – com três hotéis e um parador. A Estancia VIK, projetada por Marcelo Daglio, é uma casa de campo em estilo colonial espanhol, imersa no campo e a poucos minutos do vilarejo. A Playa VIK, assinado por Carlos Ott, ergue-se na Playa Mansa, com arquitetura escultural e a monumental porta de bronze do artista Pablo Atchugarry. A Bahía VIK espalha quartos e bangalôs nas dunas da Playa Mansa, cada um com design e obras de arte únicos, dissolvendo as fronteiras entre dentro e fora.
Ao lado, o La Susana é o parador pé-na-areia na Playa Mansa, que traduz o espírito solar e descomplicado de José Ignacio, com sunsets que já fazem parte da história local.
O mapa se expandiu recentemente para o Brasil, onde a VIK lançou o projeto de seu primeiro hotel dentro da Fazenda Vista Verde, em Araçoiaba da Serra, a cerca de 100 km de São Paulo, com inauguração prevista para 2027. Estive por lá e fiquei impressionado com o empreendimento.
E a VIK também cruzou o Atlântico: em Milão, o hotel Galleria VIK Milano ocupa lugar de destaque na Galleria Vittorio Emanuele II, trazendo seu repertório de arte e design, enquanto o restaurante VIK Pellico Otto apresenta uma gastronomia que conecta Itália, França e América do Sul.
Em pouco mais de vinte anos, o casal transformou sua busca por terroir em uma revolução silenciosa. A VIK mostra que o vinho pode ser o fio condutor de um ecossistema que combina arte, arquitetura, gastronomia e lifestyle.
Ao celebrar a identidade latino-americana com sofisticação e ousadia, Alexander e Carrie Vik colocaram a América do Sul no centro do mapa – não como coadjuvante, mas como protagonista.
Luiz Gastão Bolonhez é especialista em vinhos. Compartilha suas experiências no Instagram e é curador de vinhos nos leilões da Blombô.