Aleksandar Mandić, um dos precursores da internet no Brasil e uma das figuras mais admiradas do ecossistema de tecnologia, morreu hoje aos 67 anos depois de complicações graves de saúde.
No ano passado, Mandić contraiu covid em Portugal, onde estava morando, e chegou a se curar da doença. Mas logo depois teve problemas na medula.
Ele voltou ao Brasil para o tratamento e estava há seis meses hospitalizado à espera de um transplante.
Poucas pessoas foram tão conectadas à história da internet brasileira quanto Mandić — que, em 1990 largou uma carreira bem-sucedida na Siemens para fundar a Mandić BBS, um sistema de comunicação que ele criou em casa usando duas linhas telefônicas.
Sete anos depois, vendeu a empresa por R$ 40 milhões para um grupo argentino para em seguida participar da criação do portal iG, onde ficou por cerca de dois anos.
Quando saiu do iG, Mandić resgatou a marca de sua primeira companhia e criou a Mandic Mail (depois rebatizada de Mandic Cloud Solutions), que vendeu em 2012 para a Riverwood Capital por R$ 100 milhões. Há duas semanas, a gestora vendeu 100% do negócio para a Claranet.
“Ele tinha personalidade muito forte e pavio curto, mas era extremamente verdadeiro e carinhoso,” lembra Paulo Veras, o fundador da 99, que conheceu Mandić desde sua primeira empresa. “Era um cara que todo mundo gostava.”
Foi nos happy hours organizados por Mandic que muitos empreendedores da internet de hoje se conheceram pela primeira vez.
Amigos próximos lembram de uma história que resume ao mesmo tempo a excentricidade e coração mole deste filho de mãe bielorrussa e pai sérvio. Todos os anos, quando ligava para desejar feliz aniversário, Mandić terminava a ligação com um caloroso ‘Hercúleos Amplexos’ (uma forma hermética e efusiva de dizer ‘um grande abraço’).
Tinha paixão por frases motivacionais e de efeito — algumas delas absurdas.
Na primeira vez em que Veras visitou seu escritório, em 1995, todas as paredes da sala estavam cobertas com folhas sulfite com frases impressas. A favorita era: “Não sabendo que era impossível, foi lá e fez.”
Mais tarde, Mandić transformaria essa paixão num livro, o único que escreveu em vida. Batizado de “Mandicas”, o livro reunia as 167 frases preferidas do empreendedor, incluindo “Não fale em estatísticas em casa de morto por raio“, e “Se mentir, seja breve.”
Na criação do portal iG — que teve investidores como Jorge Paulo Lemann, Daniel Dantas e Carlos Jereissati — Mandić exerceu papel fundamental. Nizan Guanaes, que foi CEO da empresa, lembra que no início eles não estavam conseguindo a velocidade necessária para lançar o portal. Para resolver o problema, Mandić foi bater na porta de um concorrente para pedir para usar uma parte de sua capacidade ociosa.
“Não sei como ele conseguiu aquilo, mas deu certo, e o iG nasceu numa barriga de aluguel dentro de um concorrente,” diz Nizan, que descreve Mandić como um “cara singular, mas genial.”
“Você estava andando no prédio do iG e olhava pro lado e o chefe de TI estava tomando vinho e andando descalço… Mas do nada ele tinha um insight e te dava uma ideia brilhante que mudava todo o rumo da empresa.”
Segundo Nizan, Mandić “era um fazedor de dinheiro, mas não era uma pessoa que o dinheiro engoliu. Ele veio ao mundo pra se divertir.”
Na época do iG, Nizan criou o bordão que talvez melhor resuma o legado de Mandić — e que agradou tanto o empreendedor que virou sua assinatura de email.
“Mandic, a internet em pessoa.”