BRASÍLIA — “Vamo lá, falta apenas um tempo de jogo, tá certo? Eu sei que tá todo mundo cansado, mas todo mundo quer ganhar. Agora é mão no peito e cabeçada no queixo, e vamos passar por cima igual a um trem. E vamos ganhar. Pode falar pra todo mundo.”

10735 e2b65791 c98e a3b5 3f86 9f16da7d4447A mensagem de áudio bateu no celular de um seleto grupo de deputados em Brasília pouco depois das 6h de sexta-feira, 12 de julho, quando ainda se tentava estimular o Congresso a terminar o segundo turno da votação da reforma da Previdência. O dono da voz inconfundível era o deputado Alexandre Frota, que, por sua militância aguerrida em prol da reforma, já havia se tornado nome de grupo no Whatsapp.

“Coach Frota”, o grupo que inclui parlamentares do PSL, do centrão, e integrantes da linha de frente da equipe econômica na batalha pela aprovação das novas regras previdenciárias, recebia na reta final da tramitação do texto na Câmara áudios motivacionais diários do deputado. 

O ex-ator — que fez 12 novelas, além de filmes pornô, antes de ser eleito deputado por São Paulo com o discurso anticorrupção — está se revelando uma grata surpresa da política nacional: uma voz independente numa política cada vez mais sectária, um polo de moderação num Congresso de extremos.

Frota foi um dos principais avatares no jogo de forças da Câmara no primeiro semestre de 2019.

O protagonismo — e a relação com o ministro da Economia, Paulo Guedes — começou logo depois da fatídica sessão da Comissão de Constituição e Justiça em que Guedes foi alvejado por deputados de esquerda e abandonou a sala ao ser chamado de “tchutchuca” por Zeca Dirceu (PT-PR). 

A sessão foi tão confusa que o deputado de 1,88m e 120 quilos, foi escalado pelo PSL para ser uma espécie de guardacostas do ministro e organizar todas as suas idas à Câmara desde então.

“Organizei de forma militarizada”, disse Frota em uma das conversas com o Brazil Journal ao longo dos últimos dias, relatando como acabou sendo alçado ao posto de coordenador da bancada de seu partido no tema da Previdência. 

Frota se certificava  que o PSL e a base pró-reforma chegassem cedo para ocupar as primeiras fileiras do auditório e se inscrevessem para falar antes da oposição. A estratégia fez sucesso com o ministro.

“Passamos (Guedes e eu) a falar quase diariamente no celular. Ele me passava diretrizes, enviava textos, tirava dúvidas,” conta Frota. 

Num áudio gravado por Guedes, o ministro diz que o deputado ajudou a mudar a estratégia de comunicação da reforma da previdência, sugerindo trocar o termo ‘capitalização’ por ‘poupança garantida’, no que foi acatado.

Na época desta sessão na CCJ, início de abril, a rotina do deputado já lembrava a de um soldado no quartel. Desde fevereiro, quando tomou posse, Frota ficava em Brasília de segunda a sexta. Assim como Guedes, escolheu um hotel para morar. Acordava por volta das 4h30, fazia uma caminhada de 40 minutos, tomava café enquanto via um canal de notícias e já começava a disparar mensagens no Whatsapp. 

Chegava antes das 8h na Câmara, às 10h tinha aulas sobre o regimento da Câmara e assuntos econômicos com assessores do PSL e outras pessoas que, segundo ele, Guedes enviava para pautá-lo sobre os temas espinhosos da agenda.  

Almoçava cedo, por volta das 11h30, e partia no início da tarde para as comissões. Ele é membro permanente da Comissão de Cultura, mas se diz decepcionado com o andamento da área. A experiência tem servido para se aproximar de colegas da esquerda, que elogia pela coerência.

“Se a gente não abrir diálogo, fica difícil. Mas tem uns que não dá para engolir,” diz ele, citando a presidente do PT, Gleisi Hoffmann.

Para a líder do governo na Câmara, Joice Hasselmann, com quem Frota se atritou durante a campanha de 2018, o ex-ator hoje é um grande aliado.

“Eu quero tê-lo sempre ao meu lado. Também não é muito inteligente tê-lo como inimigo não, porque quando ele vai para cima, ele vai pra guerra, ele vai para vencer”, diz ela, em um áudio gravado a pedido do deputado.

A relação entre os dois melhorou tanto que Joice é hoje a candidata de Frota à Prefeitura de São Paulo em 2020.
 
“O Eduardo (Bolsonaro) quer o (apresentador de TV José Luiz) Datena, mas ela é minha candidata”, diz ele.

O entusiasmo de treinador e a facilidade para se relacionar, apesar do estilo provocador, o ajudou a se tornar vice-líder do PSL, o que o colocou nas reuniões com políticos mais experientes, como os do Centrão — que Frota prefere chamar de “os moderados”.

“Exerço uma liderança nata, tenho independência. Amado por muitos, odiado por muitos, mas respeitado por todos.”

Passou a comparecer a reuniões na residência oficial do presidente da Câmara, onde acontecem as articulações e são traçadas as estratégias de votações. 

“Fui bem recebido na Câmara. Ouvi tanto do presidente da Câmara quanto do Senado que eu sou a pessoa, dentro do PSL, com quem se pode abrir diálogo”, relata.  

De crítico do presidente da Câmara, passou a defendê-lo.

“O passado do Rodrigo Maia não me interessa”, diz. 

“O pai (da reforma da Previdência) é o Paulo Guedes, mas essa reforma foi do Rodrigo Maia. Esta reforma só saiu porque nós fomos os articuladores,” diz, citando nominalmente como responsáveis pela tarefa, além de Maia, os líderes da Maioria, Agnaldo Ribeiro, do PMDB, Baleia Rossi, o vice-presidente da Câmara, Marcos Pereira, e o líder do PP, Arthur Lira, a quem chama de ‘Rei Arthur’.  

A relação de camaradagem é tanta que no auge da votação dos destaques do texto da Previdência, na noite de quinta-feira, 11 de julho, Frota passou exultante pelo líder da Maioria, Agnaldo Ribeiro, que falava com o Brazil Journal no plenário da Câmara, e cobrou: “Já votou, Agnaldo?”, arrancando uma risada do discreto deputado paraibano.  

“Sou um cara de ação, eu vou pra frente. Não uso meu mandato pra fazer uma vitrine para daqui a 4 anos. Eu hoje vivo um dia de cada vez, eu sofro um dia por vez. Não faço planos. Meu plano é o dia de amanhã”. 

A improvável transição de Alexandre Frota — de um nome do entretenimento adulto para legislador versado nos graves assuntos de Estado — talvez tenha a ver com uma outra travessia ainda mais difícil, mas igualmente bem sucedida: a superação dos 18 anos que passou como dependente químico. 

“Consegui sobreviver a um momento terrível”, diz ele, que hoje se dedica a projetos que ajudem pessoas na mesma situação.

Aos 55 anos, Frota vive uma fase pessoal boa. Neste sábado, batizou a filha de 5 meses. Está casado há 10 anos e tem um filho mais velho, Enzo, de 12 anos. Mora em São Paulo desde 91.

Começou a se envolver em manifestações em 2013, com o Vem Pra Rua. Passou pelo Revoltados Online e criou seu próprio movimento, bradando contra a corrupção e gravando vídeos com críticas ao ex-presidente Lula, ao governo Dilma e a favor do então juiz da Lava Jato em Curitiba, Sérgio Moro. Suas transmissões chegaram a atingir 15 milhões de visualizações. Rapidamente passou a receber convites para se filiar a partidos pequenos.

“Constatei que era o caminho certo, pessoas que já transitavam na política me viam como um bom candidato,” diz. 

Frota afirma que não ganhou “nem um real” do PSL para a campanha, gastou apenas R$ 10 mil para fazer santinhos e percorrer 35 mil quilômetros do Estado. Recebeu votos em 643 dos 645 municípios paulistas. Teve 155 mil votos, mais do que políticos tradicionais do Estado. 

Eleito na onda Bolsonaro, Frota se diz no direito de criticar o atual governo porque foi um dos maiores apoiadores do presidente. 

“As pessoas têm que entender que quando o Bolsonaro não era nada, eu estava lá gritando e brigando por ele,” diz o deputado, que apoiou a candidatura do ex-capitão desde 2014. 

Frota conta que organizou diversas viagens de Bolsonaro a São Paulo, levando-o a programas de TV e pedindo a seus “amigos de academia” para fazer a segurança do então candidato. 

O principal ataque é desferido no guru do bolsonarismo,  Olavo de Carvalho.

“O cara que mais atrapalha o governo Bolsonaro é esse ‘veinho maluquinho’, o Jim Jones brasileiro, charlatão. Hoje ele tem um governo paralelo, indicando ministros, fazendo chacota de deputados, agredindo verbalmente com a militância dele. Infelizmente, o Jair Bolsonaro tem deixado que isso aconteça,” diz Frota, alvo constante daqueles que chama dos ‘olavetes’. 

“(Bolsonaro) errou ao deixar o Olavo de Carvalho fazer este governo paralelo, errou com os filhos dele (que) emitem muitas opiniões que atrapalharam articulações do governo, toda esta encrenca com os militares que tem sido um tema que tem atrapalhado muito.”

Mesmo assim, diz que sua relação com Bolsonaro continua boa. 

“A gente vive momentos de amor e ódio entre os dois porque eu talvez seja muito parecido com ele, falo o que eu penso e às vezes eu sou aquele que fala para ele o que ele não quer ouvir.”

Frota vem sendo assediado por outros partidos. Diz que recebeu convite para ir para o DEM e mostra um áudio de João Dória chamando-o de “amigo Frota” e convidando-o para mudar para o PSDB.

“Ninguém acreditava que o Alexandre Frota pudesse entrar (na Câmara) e que depois o Alexandre Frota pudesse se tornar esse deputado destemido, ousado e que tem ganho as batalhas. Eu sei que tenho surpreendido. Não é questão de não ter humildade. Eu estou trabalhando pra isso,” diz o deputado.

Frota já traçou suas metas para os próximos meses. Vai ser o coordenador da bancada do PSL na comissão especial da reforma tributária. Além dos temas econômicos, trabalha com a deputada estadual Janaína Paschoal em um projeto para mulheres e ainda quer fazer algo para ajudar os dependentes químicos. 

“Eu tô aprendendo dia após dia. Diferente de outros, eu virei essa página do mundo artístico e hoje eu sou o Alexandre Frota se tornando e se construindo (como) político. Está sendo uma experiência incrível.” 

 

Na foto acima, Alexandre Frota entre os deputados Agnaldo Robeiro (à esquerda) e Arthur Lira (à direita).