O cara nem tinha nada com isso.  Não foi culpa dele, e ele podia ter ficado em casa.

Mas Mano Brown resolveu proclamar sua verdade — e fez, ontem à noite, a melhor sugestão de autocrítica para o PT, o partido historicamente incapaz de admitir qualquer erro.

Chamado ao palco de um comício pró-Haddad na Lapa, no centro do Rio, Mano Brown precisou de apenas três minutos e meio para explicar como e por que o PT está destinado a perder esta eleição para Jair Bolsonaro, o candidato cujo maior mérito é ser o anti-PT.

Ao final do primeiro turno, muita gente esperou que o PT corresse para o centro o mais rápido que pudesse.  

 
Esperaram sentados.

Em vez de entrarem correndo pela porta deixada entreaberta por Fernando Henrique, em vez de fazerem o mea culpa do petrolão, em vez de reconhecerem que sua agenda na economia prometia desenvolvimento mas entregou desemprego, em vez de aprenderem com tudo isso e criar uma agenda nova, Lula e Haddad escolheram continuar vestindo o mesmo figurino de sempre: os radicais donos da verdade dogmática.

Para azar do PT, o radicalismo e o dogma são um cantinho cada vez mais solitário — assim como será a vida do próximo Presidente se ele insistir em vestir o figurino da direita raivosa, que funcionou bem na campanha mas não lhe servirá de nada no Planalto.

No final, a sabedoria política de que o Brasil precisa não morava em Higienópolis nem no Leblon — e sim no Capão Redondo, o berço de Mano Brown, a periferia sofrida que o PT deixou de representar, e que agora aposta suas poucas fichas em Bolsonaro.

A fala de Mano Brown vai entrar para a História:

“Boa noite.

Eu vim aqui representar a mim mesmo.  Não vim representar ninguém.

Eu não gosto do clima de festa.  A cegueira que atinge lá atinge nós também.  Isso é perigoso.

Não tá tendo motivo pra comemorar.

Tem — sei lá — quase 30 milhões de votos para alcançar aí.  Não temos nem expectativa nenhuma para alcançar aí, para diminuir essa margem. Não estou pessimista, sou realista.

[Referindo-se à demonização de eleitores de Bolsonaro] Eu não consigo acreditar que pessoas que me tratavam com tanto carinho, pessoas que me respeitavam, me amavam, me serviam o café de manhã, que lavavam meu carro, que atendiam meu filho no hospital, se transformaram em monstros.  Eu não posso acreditar nisso.  Eu não posso acreditar.

[Apontando para trás, onde estavam Haddad e Manuela] Se em algum momento a comunicação do pessoal daqui falhou, vai pagar o preço. Por que a comunicação é alma.  Se não tá conseguindo falar a língua do povo vai perder mesmo, certo?

Falar bem do PT pra torcida do PT é fácil, [mas] tem uma multidão que não tá aqui que precisa ser conquistada… ou a gente vai cair no precipício.

E eu tinha jurado pra mim mesmo nunca mais subir no palanque de ninguém!  Entendeu?  Porque política não rima, não tem swing, não tem balanço, não tem nada que me interessa.  Eu gosto é de música.

Mas… eu tou vendo casais se separando.  Amigos de 35 anos deixando de se falar…. Tenho amigos [aqui, o público começa a vaiar] — se eu puder falar vai ser bom, senão vou parar também, já era e foda-se, certo? — tem amigos que eu não tenho mais como olhar no rosto deles por causa de política.  

Não vim aqui pra ganhar voto, porque eu acho que já tá decidido.

Agora, se falhou, vai pagar.  Quem errou vai ter que pagar mesmo.  Certo?  Certo?

[As vaias se intensificam]

Não gosto do clima de festa.  O que mata a gente é a cegueira e o fanatismo. Deixou de entender o povão, já era.

Se nós somos o Partido dos Trabalhadores, o partido do povo, tem que entender o que o povo quer!  Se não sabe, volta pra base e vai procurar saber.

A minha ideia é essa. E fechou.”