O setor de agricultura e alimentos sempre foi uma espécie de patinho feio no mundo de venture capital.
Até hoje, não são muitos os empreendedores e investidores que se aventuram nesse mercado, onde há relativamente pouca digitalização e onde os ciclos de maturação são mais longos, o que muitas vezes não bate com a expectativa dos VCs.
Foi nesse cantinho esquecido do mundo da inovação que Antonio Moreira Salles e Julio Benetti decidiram amarrar seus burros.
“Era um setor que atraía pouca atenção mas tem problemas gigantescos e várias cadeias que dependem dele,” Julio disse ao Brazil Journal. “Há desafios desde a mudança climática até as mudanças de hábitos da população, que está cada vez mais preocupada com o que está comendo.”
Com esse diagnóstico, a dupla fundou a Mandi Ventures, uma gestora de venture capital focada em alimentos e agricultura e com uma visão diferente da maioria dos VCs: um portfólio ultra concentrado e sem prazo para desinvestimento.
A Mandi começou a operar há dois anos com um fundo de US$ 30 milhões. De lá pra cá, fez apenas quatro investimentos.
“Não temos a pressão do passivo e, pela forma como fomos criados, fomos treinados a vida toda a olhar as coisas no longo prazo, fazendo um processo longo de análise e com muita paciência,” disse Antônio, cuja família é um dos acionistas controladores do Itaú Unibanco. “Quando fomos atrás dos investidores, buscamos quem pensasse desse jeito também.”
Os investidores da Mandi são principalmente family offices e high net worth individuals.
Os investimentos que a gestora fez até agora navegam por diferentes temas dentro do mundo da agricultura: do desafio da produtividade ao futuro da alimentação.
O primeiro investimento foi na Gaivota, uma startup fundada por brasileiros que fizeram Stanford.
A Gaivota começou ajudando os agricultores a entender melhor seus negócios cruzando uma quantidade enorme de dados, de imagens de satélite a dados da colheita e informações climáticas.
Depois de pivotar seu modelo, a startup hoje trabalha da porteira pra fora: atende empresas que se relacionam com o agro, como bancos que dão crédito a fazendeiros, seguradoras que subscrevem apólices para proteger a colheita e as tradings que negociam os grãos.
“Basicamente, a Gaivota tem uma solução completa que oferece diferentes informações e ferramentas para vários players do mundo agro,” disse Julio.
A segunda startup é a Farmers Business Network (FBN), uma empresa americana que entrou recentemente no Brasil com a ajuda da Mandi.
A FBN criou um ecossistema com várias soluções para o fazendeiro, da análise de dados das plantações até uma plataforma de venda de insumos, passando por uma vertical de produtos financeiros.
Fundada em 2014, a startup foi avaliada em US$ 4 bilhões em sua última rodada privada.
A terceira startup no portfólio é a francesa Les Miraculeux, que atua com a fabricação e venda de suplementos alimentares “de uma maneira mais divertida e agradável de comer,” segundo Julio.
A startup tem produtos como uma bala de goma que ajuda na digestão, outra que ajuda a dormir, e uma terceira para a beleza.
“A tese é que esse é um mercado que cresce muito, acima de dois dígitos, e esse é o tipo de alimento que as pessoas vão comer no futuro,” disse Antonio.
O investimento mais recente da Mandi é a brasileira Tarken, cujo marketplace de grãos permite que um grande comprador possa comprar em escala de vários pequenos produtores e que estes produtores tenham transparência na formação de preço.