Logo agora, Boechat, no auge da sua forma?

Logo quando o Brasil mais precisa ouvir verdades, e com tão pouca gente disposta a dizê-las, você nos abandona para ficar caladinho no céu?

Logo quando a molecada que sai da faculdade querendo ser jornalista mais precisa de referências, de ídolos em carne e osso?

E agora, Boechat?  

Quem vai usar o microfone para atacar a injustiça?  

Quem afligirá os que estão confortáveis e confortará os que estão aflitos?

Hardware:  papel, caneta, máquina de datilografar.

Software: independência, coragem, coração.

Era raro, mas mesmo quando você escorregava, seu coração estava no lugar certo.

Você pensava o Brasil, pensava no Brasil, e ele retribuía este amor.

Sua partida é uma perda humana, mas abre também uma lacuna institucional.

O Quarto Poder está mais debilitado, porque a maior voz da consciência nacional calou-se no rádio.

Quem nos ensinará a temperança e exigirá indignação perante os ultrajes?

Quem fará a crítica dura mantendo o coração mole?

Até que faz sentido, alguém disse, que você nos deixe em meio a tantas tragédias — mas quem nos consolará na próxima?

Numa época em que o jornalismo está confuso, você manteve seu amor pelo furo e a reverência aos fatos.

E numa época de intolerância e polarização, você foi quase unanimidade.

Ah, Boechat… logo agora?

Mas obrigado, Boechat, por mostrar que o jornalismo pode, sim, ser admirado.

Por nos lembrar que há dignidade e altivez na carreira, e pegadas na areia que valem a pena seguir.

E assim, quem sabe, amanhã todo “foca” [o repórter novato] vai querer ser Boechat.

Isso não matará a saudade, mas deixaria este País bem mais perto daquele que você sonhava.