Depois de passar o último mês negociando com seus cerca de 30 mil credores – e ainda distante de uma solução – a Light pediu recuperação judicial na manhã de hoje.
Pela legislação, concessionárias de energia não podem entrar em RJ. A solução – controversa – foi fazer o pedido pela holding que controla as empresas de geração e distribuição de energia.
O pedido foi protocolado na 3a. Vara Empresarial do Rio de Janeiro.
A decisão foi tomada após a falta de entendimento entre a empresa e “um pequeno grupo de credores,” o CEO Octavio Pereira Lopes disse ao Brazil Journal.
“Dado o grau de agressividade desses credores, entendemos que a medida judicial não oferecia a proteção adequada.”
Há cerca de um mês, a Light conseguiu uma liminar suspendendo temporariamente o pagamento de dívidas e juros, com o objetivo de ganhar fôlego para montar um plano de reestruturação e negociá-lo com os credores.
Na época, Octavio havia estimado que levaria 60 dias para “coletar informações e apresentar uma proposta completa, que contemplasse os diferentes grupos de credores.” “Vamos cumprir esse prazo,” disse.
Segundo o executivo, as conversas com a maioria dos credores estavam sendo “produtivas”. “Mas há um outro grupo de credores com atuação suicida, que acha que a empresa tem de ser executada e as dívidas devem vencer.”
A dívida total da holding é de cerca de R$ 11 bilhões. Desse montante, R$ 1,6 bilhão está na geradora e não deve ter seus termos alterados, segundo Octavio.
A parte problemática, de quase R$ 10 bilhões, está na distribuidora. O executivo disse que, para ser viável financeiramente, a empresa precisa de um haircut de, no mínimo, 30%.
Somente em 2023 e 2024, a Light teria uma saída de caixa de cerca de R$ 6 bilhões, entre amortizações de dívida, pagamentos de juros e outras obrigações.
Mas a reestruturação financeira é só parte do problema. A outra parcela, igualmente complexa, são as perdas que a empresa tem ao não conseguir cobrar pela energia consumida nas áreas com “severa restrição operacional” – ou seja, locais dominados pelo crime organizado.
Hoje, a Light não recebe pagamento por 57,5% da energia que distribui no mercado de baixa tensão – apenas cerca de 40% dessas perdas são cobertas via tarifa.
A concessão vence em 2026, mas a Light busca renová-la antecipadamente “em bases sustentáveis,” disse Octavio.
A empresa busca um novo tratamento regulatório para as áreas em que tem restrição para operar, e quer incorporar nas tarifas as perdas e a inadimplência.
A negociação não vai ser fácil.
Nos últimos dias, o Ministro Alexandre Silveira, de Minas e Energia, fez declarações abertamente agressivas contra a concessionária, o que chamou atenção dos agentes que monitoram a situação da Light.
“A questão da Light é um processo muito específico. Nós não podemos admitir que empresas que não tenham eficiência na gestão continuem participando de processo de renovação ou que busquem exclusivamente a solução desses processos nos corredores da Aneel e do Ministério de Minas e Energia. A Light é um exemplo disso,” o ministro disse à CNN Brasil, em comentários que fez questão de repetir à Globonews e à Agência Infra.
A Light hoje é gerida por executivos egressos das melhores companhias do setor, como a Equatorial e Energisa. Seu vice chairman, Firmino Sampaio, foi presidente da Eletrobras e do conselho da Equatorial.
Ao invés do “problema de gestão” sugerido pelo ministro, o mais provável é que o problema que consome a Light seja o mesmo que detonou inúmeras outras concessões públicas no Rio de Janeiro: a confluência de uma população empobrecida e um Estado paralelo.
Acostumado a lidar com quem tem a caneta discricionária, Octavio foi diplomático sobre as declarações de Alexandre.
“Divido com o ministro a preocupação legítima com o setor. Mas reforço que estamos endereçando a questão do nosso equilíbrio financeiro com as medidas tomadas recentemente.”
Enquanto a Light se preparava para entrar com seu pedido de RJ, a WNT Gestora de Recursos anunciou ontem à noite que comprou 15,2% da companhia na Bolsa – uma posição construída em pouco mais de uma semana.
A atividade de compradores já fez o papel mais que dobrar em relação ao low de R$ 1,92 atingido em 5 de abril.
A ação fechou ontem a R$ 4,65, com a Light valendo R$ 1,7 bi na Bolsa.