O ataque de Lula à privatização da Eletrobras mostra que o Presidente não aprendeu com a História recente do País, está descolado da opinião pública e insiste num projeto de poder que terá que ser contido pelo Congresso, o Supremo e a própria sociedade.
Historicamente, a maioria das estatais brasileiras foram fábricas de vexames e prejuízo – mas jamais deixaram de cumprir duas enormes ‘funções sociais’: permitir aos políticos empregar seus aliados e investir o caixa privilegiando sempre os amigos (às vezes, os retornos).
Nos corredores do Congresso, deputados do PT não escondem que o objetivo final do Governo com essa patacoada é promover a compra da Eletrobras pela Petrobras – e, se der, enfiar a BR Distribuidora de volta no buraco de onde, na cabeça dos petistas, ela nunca deveria ter saído.
Mas o Brasil está se cansando de estatais – e de mentiras. Uma pesquisa recente do Datafolha mostra que o apoio à privatização está disparando, particularmente entre os mais jovens: 63% avaliam que produtos e serviços privados são melhores do que os estatais. Lula, aos 77 anos, ficou para trás.
Convenientemente, o Presidente também desconsidera a história recente: todo o Brasil testemunhou a roubalheira épica que tomou conta da Petrobras nos governos do PT, e a falta de decoro (ou inteligência) em investimentos como Pasadena, Sete Brasil e refinarias que nunca se pagarão.
O Brasil também se lembra que a Eletrobras quase quebrou depois que outro governo do PT mudou as regras do setor elétrico para baixar a tarifa na marra.
E quando as roubalheiras foram descobertas, todos se lembram de Lula dizer que “não sabia”. Na história oficial do PT, a roubalheira é apagada como numa fotografia stalinista, e, quando muito, a culpa é sempre de um “outro” sem face e sem nome.
Fingindo que nada disso aconteceu, sem nunca ter pedido desculpas ao País e aparentemente sem vergonha nenhuma deste capítulo que ajudou a escrever, o Governo Lula III entra agora com uma ação de inconstitucionalidade no STF questionando o modelo de privatização da Eletrobras.
Em princípio, o governo questiona “apenas” uma cláusula colocada no estatuto que limita o voto de todos os acionistas em 10%, sendo que a União ainda tem 43% da companhia. Mas como Lula não se segura, ele confessou ontem a repórteres em Londres: “Eu não entrei contra a privatização da Eletrobras, eu ainda pretendo entrar”.
O problema é que quem privatizou a Eletrobras não foi Bolsonaro — foi o Congresso Nacional.
O modelo de privatização foi ampla e democraticamente discutido no Legislativo, e a Eletrobras se tornou a única estatal privatizada pelo Congresso, e com o aval do TCU.
Os antigos ensinam que “o combinado não sai caro,” e o STF verá que as regras da privatização foram combinadas entre Governo, Congresso e os investidores – que compraram ações da Eletrobras acreditando que a interferência dos políticos na empresa seria limitada a 10% dos votos.
Quebrar este contrato é esvaziar uma decisão de outro Poder – coisa que, diziam, só Bolsonaro fazia – e convidar ações judiciais de investidores locais e internacionais.
A hipocrisia neste assunto é do tamanho da arrogância de Lula – que continua sem entender que ganhou a eleição por causa da rejeição ao Governo anterior, e não por suas ideias econômicas naftalínicas.
A estrutura que Lula questiona na Eletrobrás foi desenvolvida a partir do modelo da Embraer, que também impõe limitação de voto. E quem implementou o sistema na Embraer em 2005? O Governo Lula – esse “entreguista”.
Na época, o Planalto queria ajudar a Previ a levantar recursos; o fundo de pensão tinha uma projeção de déficit atuarial e precisava valorizar a Embraer a fim de vender sua participação. A operação na época foi um sucesso, e um exemplo para a criação de corporações de capital pulverizado no Brasil.
Mas o Lula que se olha no espelho em 2023 não gosta daquele ‘paz e amor’ que ganhou em 2002 e abriu o caminho para oito anos de bonança.
O Lula de hoje só quer brigar com todo mundo.