O grupo JBS adiou os planos de fazer o IPO da JBS Foods, seu negócio de aves cuja principal marca é a Seara.
A JBS tomou a decisão de suspender a operação, com a qual pretendia captar cerca de 4 bilhões de reais, depois que os investidores emitiram sinais de incerteza em relação às margens da JBS Foods.
Depois de se debruçar sobre os números, alguns investidores questionaram o impressionante ganho de margem da empresa no último trimestre e se perguntaram se esta margem, gorda como um peru de Natal, acabaria fazendo um vôo de galinha.
O CEO da JBS Foods, Gilberto Tomazoni, é um executivo respeitado e com profundo conhecimento do setor. Seu currículo inclui 27 anos na Sadia e três na Bunge.
Mas, dizem os investidores, nem a competência de Tomazoni seria suficiente para explicar o aumento de mais de 70% da margem EBITDA da empresa, que pulou de 7,9% no quarto trimestre (tipicamente, o melhor do ano, por causa do Natal) para 13,7% no primeiro trimestre (supostamente o mais fraco do ano).
A JBS explicou que conseguiu reduzir custos e reposicionou os preços dos produtos Seara assim que fechou a compra da empresa, mas isso não convenceu o mercado.
Para entender a crítica dos investidores, é preciso comparar a JBS Foods com a BRF, sua principal concorrente e dona das marcas Perdigão e Sadia. As duas empresas fazem basicamente a mesma coisa: vendem frango no Brasil e no mundo.
No primeiro trimestre, enquanto a JBS Foods reportou aquela margem EBITDA de 13,7%, a BRF, cuja escala é muito maior, reportou uma margem de apenas 11,7%.
Os investidores que analisaram a JBS Foods basicamente não acreditam que ela possa ser mais eficiente que a BRF.
Do ponto de vista dos custos, eles dizem que a JBS Foods paga bem mais caro pelos grãos — o principal insumo de ambas as empresas, usado para alimentar os frangos e porcos — do que a BRF, cujas maiores plantas industriais estão em Goiás e Mato Grosso, onde os grãos são mais baratos. As plantas da JBS Foods estão quase totalmente localizadas na região Sul. Ali, os grãos custam mais.
O milho, por exemplo, custa quase 28 reais (o saco de 60kg) em Santa Catarina, mais do que o dobro do preço no Mato Grosso: 13 reais. Já na soja, a diferença é de 70 reais em Santa Catarina para 56 reais no Mato Grosso — 25% a mais.
Além disso, do ponto de vista do faturamento, os investidores notam que os produtos Seara são vendidos a preços inferiores aos da marca Sadia.
Um levantamento feito por VEJA Mercados no site do Pão de Açúcar (veja fotos nesta página) mostra que a Sadia vende sua caixa de nuggets de 300 gramas por 6,99 reais, ou 40% a mais do que a Seara consegue cobrar pelos seus nuggets, os Tekitos, vendidos a 4,99 reais.
No presunto cozido, a Sadia consegue cobrar 26,4% a mais: 5,07 reais comparados com 4,01 reais da Seara.
“Como é que essa empresa vende 20% mais barato e compra os grãos pagando até duas vezes mais caro, e ainda assim tem margem bem maior?” diz um investidor que estudou os números da empresa.
Comprada pela JBS no ano passado, a Seara já esteve na mão de três outros controladores: a Cargill, a Bunge e a Marfrig. Não fez nenhum deles feliz. A Marfrig, por exemplo, falava maravilhas da empresa, mas nunca conseguiu rentabilizar a operação.
A JBS acha que seus executivos sabem gerir o negócio melhor que todos os donos anteriores, que a margem gorda do primeiro tri demonstra esta “capacidade de execução” e que vai se provar uma margem recorrente.
No geral, o mercado concorda que o time da JBS é “infinitamente” superior aos anteriores, mas questiona como a empresa melhorou as margens.
Para a JBS, este tipo de feedback dos investidores indica que, se fosse adiante com o IPO, o mercado iria penalizar a empresa — pagando menos pelas ações — por não acreditar na sustentabilidade das margens.
“Este é um negócio de altíssimo crescimento, mas é um trimestre”, diz uma fonte próxima à JBS. “A questão é quanto o mercado vai aceitar pagar pela empresa tendo só um trimestre de resultados disponível. Qual é o nível de conforto do investidor?”
Para a JBS, a conta do que ela deixou de ganhar — por enquanto — é simples. Numa métrica chamada de “valor da firma dividido por sua geração de caixa”, o mercado aceita pagar pelas ações da JBS entre cinco e seis vezes este número. Já pela BRF, o mercado paga mais: 12 vezes.
Como a JBS Foods é mais parecida com a BRF do que com a própria JBS (que só processa carne bovina), ao levar a JBS Foods para a Bolsa a um múltiplo mais alto, a JBS mostrará que é dona de um negócio que vale muito. Logo, poderá argumentar que sua própria ação deveria valer mais.