O Itaú Unibanco provisionou 100% de seus créditos com a Americanas e ainda assim conseguiu reportar um retorno patrimonial de 19,3% no quarto trimestre – um balanço que o mercado recebeu com um suspiro coletivo de alívio agora à noite.
“O tema do momento é o ‘credit crunch‘,” disse um analista. “Se o Itaú, que vinha apresentando ótimos resultados e é conservador nos guidances, tropeçasse, o mercado teria razões para temer 2023.”
Ao lançar a Americanas direto no ‘H’ – a letra infame do BC para créditos irrecuperáveis –, o Itaú reconheceu uma perda de R$ 1,3 bilhão antes de impostos e R$ 719 milhões after tax, o que encolheu o lucro do trimestre em menos de 10%.
A exposição total do Itaú a Americanas é de cerca de R$ 3 bilhões. Além do R$ 1,3 bi que transitou pelo resultado, o banco se apropriou de outro R$ 1,7 bi em provisões adicionais feitas ao longo do ano.
Sem a provisão de Americanas, o lucro no quarto tri seria de R$ 8,4 bilhões, um pouco superior à projeção média do mercado segundo a Refinitiv. No ano, o lucro cresceu 14,5% para R$ 30,8 bilhões, e o ROE ficou acima de 20%.
“O Itaú decidiu antecipar todo o impacto de Americanas no quarto tri, o que não precisaria ter feito. Isso teve reflexos no resultado, mas moderados, e com a vantagem de deixar o caminho livre para 2023,” disse Renan Manda, o analista-chefe do setor financeiro na XP.
“Não existe mais aquela dúvida de qual vai ser a perda com a empresa.”
O destaque de 2022 foi a margem financeira de clientes, que cresceu 27,2% (acima do projetado pelo banco) e chegou a R$ 89,6 bilhões. Isso se deveu principalmente ao crescimento de linhas de crédito mais rentáveis, de pessoas físicas e PMEs.
Diferentemente de concorrentes como Bradesco e Santander, o Itaú tem conseguido expandir esses empréstimos mais rentáveis mantendo a inadimplência relativamente sob controle – segundo analistas, em razão do uso de tecnologias que permitem uma análise mais assertiva do perfil de crédito dos clientes.
A dúvida, agora, é se isso vai se sustentar em 2023.
O guidance para este ano gerou mixed feelings. Do lado positivo, o banco continua prevendo crescimento da carteira de crédito de 6% a 9%, um patamar inferior à expansão de 11% em 2022, mas ainda relevante.
Também projeta aumento da margem com clientes e da receita com seguros e prestação de serviços.
Carlos Macedo, da Ohm Research, nota que cerca de um terço da carteira de crédito do Itaú foi contratada no quarto trimestre, um período de juros altos, o que deve gerar uma receita forte ao longo deste ano.
O que ligou o sinal de alerta no guidance foi a estimativa de provisão para devedores duvidosos, de R$ 36,5 a R$ 40,5 bilhões. Em 2022, esse número já havia sido alto: R$ 32,3 bilhões.
No call de amanhã com o CEO Milton Maluhy e o CFO Alexsandro Broedel, “o mercado vai querer entender as premissas que levaram a esse guidance e saber se alguns desses devedores problemáticos já foram identificados ou se o banco está apenas prevendo uma piora,” disse um analista.
Para Macedo, os pontos de atenção para 2023 são a inadimplência e a receita de serviços.
“A inadimplência do atacado está bastante baixa, em 0,2%. Isso não é sustentável. Deve haver um retorno à média, em torno de 0,5% a 1%”, diz.
O comportamento das pessoas físicas e empresas de menor porte também preocupa.
Do lado dos serviços, o aumento da concorrência com os bancos digitais e fintechs torna mais difícil ganhar dinheiro. “A receita com conta corrente, por exemplo, que responde por cerca de 20% do total de receitas com serviços, caiu em 2022”, diz Macedo.
No BTG, Eduardo Rosman estima que o Itaú terá um lucro recorrente de R$ 35,5 bilhões este ano, o meio da faixa de guidance dada pelo banco e uma alta de 15% em relação a 2022.
Se o banco ficar no piso do guidance, calculam os analistas, o lucro de 2023 deve repetir o do ano passado.