Todo dia, empresários do mundo inteiro leem nos jornais sobre como a Inteligência Artificial (IA) será transformacional para a sociedade. No entanto, apesar de todo o entusiasmo em torno do assunto, poucos aqui no Brasil estão de fato se mexendo o suficiente para explorar o potencial dessa tecnologia.

Fizemos uma pesquisa com mais de 400 empresas de tecnologia da América Latina. O resultado: 38% delas – que deveriam liderar esse movimento – dizem ainda não fazer uso algum de IA em suas atividades. 

Essa inatividade não é por falta de reconhecer o impacto transformacional da IA no desenvolvimento de software. 80% dos mesmos CEOs e CTOs acreditam que a IA é a maior mudança computacional desde a internet, e 75% deles avaliam que ela vai transformar definitivamente o desenvolvimento de software. 

Essa revolução em software não é mais uma mera opinião. É um fato. Um estudo da GitHub, uma das principais ferramentas usadas por desenvolvedores de software, avaliou a produtividade de desenvolvedores com e sem o uso do assistente IA da empresa, o “Copilot”. Na média, aqueles com auxílio do Copilot completaram suas tarefas em menos da metade do tempo que seus pares sem a ferramenta.

Incomodado com a velocidade da mudança, o fundo Atlantico decidiu organizar um fórum de discussão trazendo figuras como Sam Altman, o CEO da OpenAI (a empresa por trás do ChatGPT) para falar para centenas de CTOs e CEOs latino-americanos. 

Durante esse fórum, conversamos sobre as oportunidades para as empresas saírem da inércia e aplicarem IA para sair na frente da competição. Sam Altman destacou a necessidade de experimentação contínua nessa fase incipiente da tecnologia e de envolver todos os colaboradores nesse processo de descoberta desde o início, e fazê-lo o quanto antes.

No evento, líderes técnicos de startups apresentaram casos práticos implementados com sucesso em suas empresas. João Duarte, CTO da Trybe, a maior escola digital de tecnologia do Brasil, discutiu casos de uso do GitHub Copilot. O conteúdo inclusive já é parte da formação de desenvolvimento de software da Trybe, que também utiliza o ChatGPT para suporte ao aprendizado dos estudantes.

Já Marcelo Sales, fundador da Cyberlabs, discutiu a criação de “agentes inteligentes” e robôs personalizados. Durante sua demo ao vivo, Marcelo demonstrou como um bot criado para assistência em seguros simplificava o processo de atendimento ao cliente. Mandando mensagens de áudio por WhatsApp, o bot entendia a mensagem e respondia às necessidades do cliente.

Com essa crescente capacidade de impacto, o debate sobre as possíveis implicações de IA para a nossa sociedade é inadiável. As tensões geopolíticas entre EUA e China devem continuar se agravando com a busca pela supremacia em IA. Para emergentes como o Brasil, a dependência dos modelos fundacionais criados por esses países em um ambiente polarizado deve trazer implicações importantes de diplomacia e autonomia, para as quais ainda não temos respostas.

Enquanto competir em infraestrutura e modelos fundacionais é improvável, inovar em aplicações é um desafio em que o nosso ecossistema de tecnologia certamente pode triunfar. Se tivermos sucesso, a IA tem potencial para entregar soluções para problemas estruturais do nosso país. 

Imagine um mundo em que toda criança brasileira terá acesso a um professor particular virtual 24/7, personalizado para as suas necessidades. Ou em que todo brasileiro em zona rural ou remota poderá acessar instantaneamente um assistente médico virtual para cuidados básicos.

Para concretizar tudo isso, não podemos nos dar ao luxo de adotar regulações prejudiciais que limitem nosso ritmo de inovação, como as que têm sido discutidas em projetos que avançam pelo nosso legislativo. Devemos dar ao tema prioridade máxima e ser parte ativa da discussão de regulação a nível mundial. Avaliar riscos, claro, mas garantindo a preservação da capacidade transformacional da IA para o bem.

Nessa linha, Sam Altman exortou os governos a pensar tanto em mitigar as ameaças quanto em maximizar o potencial positivo da nova tecnologia. 

O novo paradigma de IA é uma realidade inexorável, e qualquer país ou empresa que não esteja priorizando desde já sua adoção está atrasado. É uma janela de oportunidade única, e os frutos dessa onda de disrupção caberão às nações e companhias que perseguirem posições de protagonismo nessa nova era.

Julio Vasconcellos é sócio-fundador do fundo de venture capital Atlantico.