O economista Gustavo Franco anunciou ontem à noite que está deixando o PSDB para se filiar ao Partido Novo, marcando o fim de um casamento de 28 anos e sublinhando o papel que as ideias pró-mercado terão na eleição de 2018.
 
Na nova agremiação, Gustavo presidirá a Fundação Novo, o que o deixará encarregado de elaborar o programa de governo para a campanha do ano que vem.
 
10151 fba527aa 929f 0000 0000 f8afb6addf10O desembarque de Gustavo, um dos pais do Plano Real, vem depois de anos de hesitação do PSDB em abraçar decididamente a agenda de reformas pela qual (ironicamente) o partido ficou conhecido, o que inclui a defesa da moeda como instrumento redutor da desigualdade e privatizações como o principal caminho para a racionalização do Estado brasileiro.
 
Nos últimos anos, deputados, senadores e até vereadores do PSDB, quando forçados a escolher entre propostas reformistas e causas clientelistas, ficaram com as últimas.
 
Há três dias, Gustavo disse que a crise na Petrobrás abriu uma janela para a retomada das privatizações no País, e que o Banco do Brasil seria uma estatal ‘pronta para a venda’.  “Depois desse episódio (as descobertas da Lava Jato), é muito fácil entender que uma empresa estatal é vulnerável à captura por políticos corruptos. Não há assunto de liberalismo nisso. Há assunto de código penal,” disse.
 
A filiação de Gustavo deve abrir a porta para que outros de seus colegas na órbita da PUC-Rio — o núcleo duro que concebeu o Plano Real e deu a cara econômica ao Governo Fernando Henrique Cardoso— mudem de partido, e é a mais importante vitória do Novo desde sua fundação.
 
Abaixo, o email de despedida que Gustavo enviou a colegas do Instituto Teotônio Vilela, o órgão de formação política e doutrinária do PSDB.
 
 
 
Data: qua, 27 de set de 2017 às 21:57
Assunto: Novo rumo

 

Aos colegas do Conselho do ITV,

Amanhã pela manhã, ressalvados os vazamentos, se tornarão públicas duas decisões que já venho amadurecendo faz tempo: a de deixar o PSDB e a de filiar-me ao NOVO.

A primeira, devo confessar a vocês muito especialmente, está praticamente tomada desde 18.06 quando o Paulo Faveret comunicou a este grupo a sua desfiliação. Os motivos eram sólidos e apenas ficaram mais concretos no período que se seguiu.

Deixar o PSDB é uma decisão que, no meu caso, interrompe um vínculo de 28 anos (filiei-me em agosto de 1989), talvez por isso tenha sido contaminado pela hesitação, condição já crônica entre nós, infelizmente.

Deixar o PSDB, contudo, de modo algum significa abdicar da paixão que me trouxe ao partido em 1989 – a prosperidade do país a partir de um “choque de capitalismo” – e menos ainda a de afastar-me do legado do Plano Real, este extraordinário empreendimento de que resultou a reconstrução da moeda nacional e em devolver ao país o futuro que havia perdido. Na verdade, o Real trouxe consigo uma agenda que vou carregar comigo para onde for, pelo resto dos tempos.

Não posso deixar o PSDB sem compartilhar com os colegas o orgulho e a satisfação de ter participado de tudo o que participei como filiado e como servidor em cargo público em governos tucanos. Fizemos História e construímos patrimônios de valor inestimável para o país, e mudar de partido não altera nada disso.

Mas o país é muito dinâmico, o partido, como cada um de nós individualmente, precisa se renovar. São os desafios do país, dos filhos que crescem, netos que aparecem, da tecnologia que muda o modo de se acordar de manhã.

Quando o PSDB se constituiu, o Muro ainda existia em Berlim e as ideias pró-mercado não tinham outra alternativa razoável no sistema partidário que pudesse acomodá-las. Mas, dentro do PSDB, ficavam submetidas a toda sorte de disfarces e condicionantes, embora mais retóricos do que práticos. Com o tempo, foi ficando cada vez mais despropositado reafirmar tantas ressalvas às “leis do mercado”, quando esta disciplina se mostrava francamente em falta no Brasil e seu fortalecimento e desenvolvimento vinha sido o centro conceitual da maior parte das reformas importantes que o partido apoiou e realizou, aí incluído o Plano Real.

As hesitações em abraçar a novidade sempre foram incômodas. A diversidade de visões sobre a economia sempre existiu dentro do PSDB, mas com os ditos “liberais” em franca minoria.

Entretanto, em tempo recentes, os horizontes se ampliaram extraordinariamente para novas ideias pró-mercado. É tolo buscar enquadrá-las em velhos esquemas. É um mundo novo e nesse cenário, elas já podem caminhar com suas próprias pernas com o apoio de uma variedade de organizações, partidárias ou não, desafiando antigas clivagens políticas. Como o PSDB não as assumiu por inteiro, mesmo depois de todos esses anos, é natural que essas bandeiras e seus formuladores migrem para outras agremiações.

O PSBD não é hostil a essas ideias, bem ao contrário a julgar por este grupo. Mas a organização é reticente, às vezes omissa, por isso mesmo hesita demasiadamente diante de conceitos considerados “disruptivos”, e já por tempo demais.

São muitos os grupos, movimentos, coletivos, ONGs e partidos hoje empenhados no aprofundamento das teses e princípios reformistas trazidos pelo Plano Real. Todos os ventos sopram nessa direção e a cada dia mais depois do colapso do capitalismo de quadrilhas introduzido pelo PT.

E o nosso partido, como organização, ou através de alguns de seus quadros, hesita diante dessas bandeiras ou mesmo as renega e, sobretudo e mais grave, se encolhe diante de “erros” de seus líderes.

O NOVO é um projeto muito recente, ainda jovem e com muita estrada a percorrer, mas possui alguma coisa muito parecida com o PSDB de 1989, uma ideia ainda para ser desenvolvida, sem passado apenas futuro.

Os colegas sabem que não tenho ambição nem interesse em concorrer a cargo público, e a oportunidade se apresentou em diversas vezes no passado, e novamente agora, sempre pelo PSDB. Mas este nunca foi meu interesse nem vocação. Meu campo de atuação é o das ideias e é por aí se explica a minha filiação ao NOVO como dirigente: no NOVO, dirigentes não se confundem com candidatos.

Despeço-me, portanto, sem queixas, esperando manter os vínculos e o cuidado com o patrimônio comum, apenas olhando para o futuro diante do qual todos somos responsáveis. Seja qual for o partido, nosso dever é com o que certo, para começar. Sem o imperativo ético não dá para sair de casa pela manhã, quanto mais promover o crescimento e as reformas econômicas.

Espero que ainda possamos caminhar juntos no bom caminho no futuro.

Saudações tucanas, ainda mais uma derradeira vez

GF

 

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