Nem ‘Crooked Hillary’, nem ‘Tricky Trump’: há delegados falando em eleger um terceiro candidato a Presidente dos EUA no dia 19 de dezembro.
Como se sabe, os EUA têm eleição indireta, que será decidida na reunião do Colégio Eleitoral daqui a duas semanas. As 51 entidades da federação americana (os 50 Estados e mais o Distrito de Colúmbia) enviam seus 538 delegados, que realizam uma nova votação e declaram vencedor o candidato que receber, no mínimo, 270 votos.
Pois neste conturbado momento político pós-eleições, já há quem fale em mudar seu voto: sete delegados recentemente vieram a público apoiando a controversa ideia de apontar um outro candidato para a presidência. A ideia ventilada por estes delegados – até agora, todos Democratas – seria escolher um terceiro candidato, extraído (sim) das fileiras republicanas, mas que seja visto como mais moderado e conciliador; nomes como John Kasich, Mitt Romney e Colin Powell foram citados.
A idéia é improvável de acontecer, mas não impossível. A Constituição confere aos Estados o controle sobre como seus votos no Colégio Eleitoral devem ser dados. Apenas 29 Estados (mais o Distrito de Colúmbia) têm leis que controlam os seus votos, em geral exigindo que seus delegados votem em bloco para o candidato vencedor no Estado. Essas 30 entidades da federação totalizam 302 delegados no Colégio Eleitoral, de modo que os 236 eleitores restantes são absolutamente livres para votar em quem quiserem.
Para além disso, as penalidades para um delegado que decida votar diferentemente do que as leis de seu Estado exigem são brandas, geralmente envolvendo uma acusação de contravenção ou o pagamento de uma multa na casa de mil dólares. Há precedente para isso: em 2000, Barbara Lett-Simmons, delegada do Distrito de Colúmbia, decidiu votar em branco no Colégio Eleitoral a despeito do voto no Estado exigir que seus 3 delegados votassem no democrata Al Gore (que perdeu aquela eleição por 5 votos no Colégio Eleitoral, mesmo ganhando o voto popular). Delegados que votam em dissonância com a posição esperada pelo voto popular no Estado são chamados de ‘faithless electors’ (eleitores sem fé).
Por mais estranho que pareça, os fundadores dos EUA criaram o Colégio Eleitoral justamente para permitir um ‘golpe parlamentar’ deste tipo. Alexander Hamilton, o primeiro Secretário do Tesouro americano (e tido por muitos como o inventor do sistema financeiro mundial), acreditava que o sistema serviria de salvaguarda contra os excessos da democracia direta.
“O talento para a baixa intriga e as pequenas artimanhas da popularidade podem por si só ser suficientes para elevar um homem às maiores honras em apenas um Estado; mas serão necessários outros talentos, e um outro tipo de mérito, para estabelecê-lo na estima e confiança de toda a União,” Hamilton escreveu nos Federalist Papers. Ou seja, com o Colégio Eleitoral, os Founding Fathers queriam proteger o país dos populistas e aproveitadores.
Para que o plano dos ‘faithless electors’ tenha alguma chance de dar certo, é imprescindível que ao menos 37 delegados de Donald Trump mudem seu voto (projetam-se 306 delegados apoiando sua eleição no Colégio Eleitoral).
A lei americana estabelece que, caso nenhum candidato obtenha 270 votos no Colégio Eleitoral, o novo presidente deverá ser definido por votação da Câmara de Deputados, que decidirá entre os três candidatos mais votados no Colégio Eleitoral (e não na eleição direta). Nesta nova votação, cada Estado teria um voto. O presidente John Quincy Adams foi eleito desta maneira em 1824.
Alguns mercados de apostas já oferecem um meio para que os investidores se posicionem. O site PredictIt oferece títulos que pagam hoje US$ 1 em caso da existência de ‘faithless electors’ ao preço de US$ 0,83. A chance de uma reviravolta nas eleições continua baixa, no entanto: segundo as apostas no site, a probabilidade do vencedor no Colégio Eleitoral receber 279 votos ou menos é de apenas 2%.
Para quem investe em estratégias de alta volatilidade, 19 de dezembro pode se provar um dia e tanto.