A SP-Arte abre na quarta-feira a temporada das feiras de arte do País. A ARPA, no Pacaembu, vai tentar repetir em maio o sucesso de 2021, com uma proposta menor e elegante, e a animada ArtRio atrai em setembro um grande público para a Cidade Maravilhosa.

Desta vez, as três feiras vão enfrentar um ambiente mais desafiador do que no ano passado, que já não havia sido fácil. A inflação persistente e seu amargo remédio – os juros altos – impactam as vendas porque afetam o apetite de risco do comprador.

Fora do Brasil, as vendas em leilões e de artistas já consagrados seguem incólumes: este tipo de arte passou a ser vista como ativos seguros (mais do que bancos suíços ou californianos, ao que parece). Já os artistas mais jovens ou iniciantes são os mais prejudicados nesta busca por uma alocação mais segura.

O jovem Antonio Tarsis é uma exceção.

Antonio TarsisNascido em 1995, ele abriu no início do mês sua primeira individual na galeria Fortes D’Aloia Gabriel – toda vendida antes da abertura e com lista de espera por novas obras.

Antonio Tarsis de Jesus Miranda nasceu em um dos bairros mais violentos de Salvador e estudou formalmente até a 5ª série do ensino médio. Amante da leitura,  pensou em ser escritor ou músico até descobrir a pintura em 2009, o mesmo ano em que perdeu sua mãe.

Sem contato com o pai, ficou sozinho com os irmãos mais velhos. Entre tantas adversidades e falta de recursos, não havia como comprar telas, tintas e pincéis. Antônio passou a coletar e acumular papéis, objetos e resíduos que encontrava pelas ruas.

“Andando pelas ruas de Salvador eu via os viciados em crack largarem suas caixas de fósforos no chão.” Cada caixa tinha um tom diferente de roxo, que variava em função do tempo de exposição ao sol ou a chuva. “Percebi que poderia usá-los como material de pintura. Foi também uma forma de dar visibilidade às pessoas invisíveis que os largaram,” o artista disse ao Financial Times no ano passado.

O olhar sensível para o entorno degradado fez surgir colagens monocromáticas, transformando as caixa de fósforos roxas em geometria abstrata ou paisagens. Um conjunto dessa série foi exposto no show solo que o artista fez para a ArtRio no ano passado.

Na adolescência, sua rotina incluía ir diariamente à biblioteca pública para ler sobre história da arte. Acabou conhecendo entre os livros outros artistas, que lhe apresentaram oportunidades para exibir seus trabalhos. Com essa visibilidade, ganhou uma residência no Museu de Arte Moderna de Salvador em 2014 e no Parque Lage, no Rio de Janeiro.

A partir daí foi ganhando confiança, e a carreira pegou tração. Em 2016, Antônio foi finalista da 5ª edição do EDP nas Artes, um prêmio para artistas jovens apresentado no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo.

Atualmente, Antonio mora em Londres, onde é representado pela galeria Carlos/Ishikawa, da brasileira Vanessa Carlos. Ano passado teve uma individual na Alemanha, em parceria com a Akademie Schloss Solitude e estreou na Bienal do Mercosul, em Porto Alegre.

As caixas de fósforo expandiram sua experiência, que derivou para outros trabalhos, como suas recentes colagens criadas a partir de recortes cirúrgicos de embalagens de frutas e produtos industrializados, que fora do contexto assumem outro significado.

Antonio foi influenciado por Jac Leirner, Bispo do Rosário e Laercio Redondo; outros artistas baianos também foram fundamentais em sua formação.

“Meu maior aprendizado foi ter passado por essas experiências sem embrutecer. Longe de mim romantizar esse lugar, mas ter vivido ali me trouxe um olhar diferente sobre muitos aspectos da vida. Especialmente no contexto da arte e cultura, ocupado geralmente por grupos de pessoas privilegiadas,” disse em uma entrevista há alguns anos.