Enquanto o Rio de Janeiro continua lindo — mas sofrendo com uma crise fiscal e de segurança sem precedentes — um de seus vizinhos goza de situação bem diferente.

Niterói — a cidade ‘do outro lado da poça’, com pouco mais de 500 mil habitantes e que já foi capital do Estado — fechou o ano passado com um superávit de mais de R$ 200 milhões, teve seu rating elevado pela Standard & Poor’s para o nível mais alto na escala nacional (brAAA) e vem se destacando em rankings de gestão e atratividade de investimento.

Num estudo da Urban System, que elencou as 100 melhores cidades brasileiras para se fazer negócios, o município subiu impressionantes 43 posições de 2017 para 2018, passando da 49ª para a 6ª colocação.

Os principais motores da disparada: um aumento expressivo no índice de desenvolvimento econômico e a evolução da infraestrutura local.

Nas mãos do PDT desde 2012, a prefeitura tem feito mudanças importantes na gestão. Já nos primeiros anos elaborou um plano de longo prazo para o desenvolvimento da região, aproximou-se da iniciativa privada e melhorou o controle fiscal.

A cidade vinha de anos consecutivos de déficits, e só conseguiu acertar as contas públicas efetivamente em 2014.

Mas a melhora abrupta nos resultados contou principalmente com um fator externo: há dois anos, Niterói começou a receber uma enxurrada de recursos dos royalties do petróleo.

Além disso, o sucesso da gestão está longe de ser consenso: críticos apontam um inchaço da máquina são 48 secretarias, ante menos de 20 na capital e problemas em alguns serviços públicos. Os índices de criminalidade seguem altos, apesar dos investimentos constantes da prefeitura, e a saúde ainda deixa a desejar, com filas em hospitais e postos médicos.

Com o início da exploração do Campo de Lula, localizado na Bacia de Santos e próximo da costa da cidade, o volume de royalties destinados a Niterói mais do que dobrou de um ano para o outro.

Em 2017, os recursos adicionaram cerca de R$ 800 milhões a receita líquida do município e no ano passado o montante chegou a R$ 1,2 bilhão.

Para se ter uma ideia: até 2015, os royalties respondiam por cerca de 10% da arrecadação total de Niterói; no ano passado, a fatia superou os 35%. Para 2019, a projeção da cidade é de que o montante continue na faixa de R$ 1 bilhão.

“Estamos muito focados na gestão dos royalties, porque temos o exemplo de outros municípios do Rio que não souberam usar esses recursos”, Giovanna Victer, a Secretária de Planejamento, Orçamento e Gestão de Niterói disse ao Brazil Journal.

A cidade quer evitar a ‘maldição do petróleo’ dos municípios do norte fluminense, que ficaram famosos por esbanjar os royalties com projetos supérfluos — e, quando viram a fonte mingar, sofreram pela falta de planejamento.

O poder executivo já enviou um projeto de lei para a Câmara dos Vereadores, que deve ser votado em breve e que estipula a criação de uma espécie de poupança dos royalties.

O projeto prevê que o percentual de participação especial (o grosso dos recursos) fique reservado numa poupança que só pode ser sacada no caso “de uma frustração inesperada de receitas que afete os serviços da cidade.” A lei proíbe ainda o saque de uma só vez, estipulando um limite de 30% por ano.

Outra medida: na hora de calcular o percentual das despesas com a folha de pagamento em relação à receita corrente líquida, a prefeitura tira os recursos dos royalties da conta. Com isso, consegue ter uma noção mais real do nível dos gastos.

“Quando os royalties diminuírem, não queremos que aconteça como na cidade do Rio, onde o município chegou a ter 120% da receita líquida comprometida com folha de pagamento e aposentadoria”, afirma Giovanna.

Niterói que usar os recursos para investir em projetos que gerem novas fontes de receitas, garantindo a sustentabilidade da cidade mesmo quando a torneira do petróleo fechar.

Um dos exemplos é a dragagem do canal de São Lourenço, que permitirá que grandes embarcações cheguem aos estaleiros de cidade, gerando uma revitalização do setor naval.

A Prefeitura acabou de fazer os estudos de impacto ambiental e deve iniciar em breve as obras.

Além disso, a cidade tem usado uma parte dos recursos para quitar dívidas com a União (nos últimos meses já foram pagos cerca de R$ 50 milhões em dívidas).

“Niterói é um oásis em meio ao caos do Rio de Janeiro”, resume Cláudio Porto, fundador da consultoria de políticas públicas Macroplan.

Mas se a parte fiscal realmente é de dar inveja a qualquer cidade do Rio, no lado político a situação não é tão diferente assim: no início de dezembro, o prefeito Rodrigo Neves foi preso num desdobramento da Operação Lava Jato, acusado de desvio de recursos públicos e formação de quadrilha.

No mesmo dia em que foi levado à prisão, o político de 42 anos se preparava para receber mais um prêmio pela qualidade da gestão de Niterói.