Era uma vez uma empresa monopolista nos mercados de gás e refino de petróleo. Esta empresa — gigantesca e tentacular, cujos preços e ineficiências moldam e distorcem toda a economia do País que supostamente a controla — sofria diversos processos que a acusavam de conduta anticoncorrencial naqueles dois segmentos.
Cinco anos atrás, esta empresa propôs ao órgão antitruste de seu País dois acordos (tecnicamente, Termos de Compromisso de Cessação).
Num, ela se comprometia a vender 50% de sua capacidade de refino. No outro, prometia vender ativos na área de gás, o que poria fim à sua verticalização naquele mercado. Especificamente, os ativos a ser vendidos eram os três maiores gasodutos brasileiros, bem como uma participação na Gaspetro, a holding pela qual a grande empresa participava das distribuidoras de gás nos estados.
O significado daqueles dois acordos para a economia brasileira foi tal que eles chegaram a ser comparados à quebra do monopólio da Standard Oil em 1911, que gerou concorrência e o nascimento de outras gigantes como a ExxonMobil, Texaco e Chevron.
Acordo assinado, a vida seguiu.
Dos três gasodutos, dois foram vendidos para grandes players internacionais, que demonstraram mais uma vez confiança no Brasil. Já a Gaspetro foi vendida a um grupo nacional que busca a consolidação do setor.
No refino, o progresso foi bem menor: apenas três das oito refinarias foram vendidas: duas tinham market share irrelevante, e a terceira, a da Bahia, foi vendida a um fundo soberano.
Mas no Brasil, o país onde corriqueiramente até o passado se mostra incerto, o regulador antitruste também muda de ideia ao sabor do governo do dia – e eis que um governo pró-mercado foi substituído por um governo pró-estado.
E a estatal voltou com tudo.
Na semana passada, o CADE anunciou um acordo para alterar e suavizar os dois TCCs, devolvendo à estatal sua “legitimidade” como monopolista.
Em outras palavras, o CADE achou por bem rever sua posição pró-concorrência e substituí-la por uma visão pró-monopólio, assumindo a feição estranha de um órgão antitruste que, em vez de advogar pelo consumidor, advoga para a grande empresa. Em suma, um antitruste que não se dá ao respeito.
Curiosamente, o CADE não disse se os processos que acusavam o poder de monopólio da grande empresa (todos arquivados cinco anos atrás em troca dos compromissos assumidos nos TCCs) serão agora desarquivados – ou se tudo ficará no esquecimento.
Um investidor estratégico que monitore essa situação de seu escritório em Nova York, Londres ou Berlim chegará à conclusão que todos já conhecemos: o Brasil é um lugar inóspito à livre concorrência, e as regras mudam o tempo todo.
Além de fortalecer o monopólio neste momento (o que encarece as cadeias de produção), este vai-e-vem regulatório cobrará um preço adicional. Se e quando um próximo Presidente – ou uma próxima gestão da estatal – decidir de novo vender refinarias ou gasodutos, quem terá confiança para colocar uma oferta?
Além de pró-monopólio, a postura do CADE é retrógrada. Enquanto todas as grandes economias buscam se posicionar na era da inteligência artificial, o “xerife da concorrência” se mostra subserviente aos que pensam o Brasil olhando pelo retrovisor.