Dilma RousseffPara uma campanha na qual o medo venceu a esperança, o discurso de vitória da Presidente Dilma Rousseff veio num tom melhor que o esperado.

Onde se antecipava o triunfalismo partidário, prevaleceu o chamamento pela unidade nacional, o básico nas democracias maduras. Onde poderia haver uma boa dose de autocongratulação, houve o reconhecimento explícito de que se espera um governo melhor no próximo mandato. Não foi um discurso petista. Foi um discurso dilmista.

A humildade na vitória foi proporcional ao tamanho dos problemas que aguardam o novo velho Governo.

Os dados econômicos que devem sair a partir de agora muito provavelmente vão garantir uma lenta, gradual e segura erosão do capital político recém confirmado nas urnas, e o culminar desta sequência de manchetes infelizes será o aumento do desemprego, encomendado para o primeiro semestre de 2015.

Como se a economia já não prometesse fortes emoções, o novo Governo terá que gastar muita energia, tempo (e, de novo, capital político) apagando as chamas do escândalo do petrolão, na medida em que as investigações continuarem e o novelo da corrupção for desenrolado. Parece improvável que a Presidente consiga se distanciar o suficiente desta pauta sem comprometer sua capacidade de negociar com o Congresso as reformas que pretende fazer.

E como a política é brutal não só com derrotados mas também com os vitoriosos, Dilma terá que lidar agora com uma oposição reenergizada, sem motivos para colaborar — a menos, claro, que a agenda de reformas interesse à sociedade em geral e o setor privado sinalize querer ver cooperação com os neoleitos. Está no dicionário: “cooperação”, aquela palavra que o PT sempre negou à situação.

A presença simultânea no Senado de José Serra, Antonio Anastasia, Tasso Jereissati, Álvaro Dias e Aécio Neves deve produzir uma oposição mais afiada, estridente e vigilante do que o PSDB jamais conseguiu erigir desde que a Era Lula se instalou no País.

E sempre que os votos de sua valorosa (e valiosa) bancada se fizerem necessários, o PMDB, que não trai sua genética, continuará mandando suas faturas para o Planalto, nesse ‘House of Cards’ da vida real.

(Como alguém pode querer se eleger para mais quatro anos disto?)

Em suma, sairá muito caro fazer qualquer coisa no Brasil nos próximos anos. Proibitivamente caro.

Todas essas variáveis — a vulnerabilidade da economia, as circunstâncias do xadrez político e o risco crescente de um impasse institucional — entram no preço dos ativos hoje, agora, já, numa espécie de reação reflexo dos agentes financeiros.

Mas a pergunta básica que definirá a direção da Bolsa, do dólar e do emprego nos próximos meses é: a política econômica se tornará mais racional, ou Dilma vai dobrar a aposta?

Na ausência de sinais de uma ‘glasnost’ no complexo ideológico ‘Fazenda-Tesouro-BNDES’, o roteiro do caos pode se instalar rápido.

Técnicos do Governo diziam na semana passada não haver nenhum plano de contingência preparado para o evento de uma deterioração aguda nos mercados — o evento mais provável, diga-se.

O voto em Dilma foi, em grande parte, o voto de quem agradece e pede a manutenção de benefícios materiais que mudaram para melhor a vida das pessoas: a doméstica que hoje faz faculdade com o FIES, o adolescente sem aspirações acadêmicas e que preferiu seguir carreira técnica, e a família que se financiou com o Minha Casa Minha Vida.

Não se pode tirar destas pessoas o que lhes foi dado.

Ao mesmo tempo, o orçamento da União não é suficiente para manter os benefícios, investir em infraestrutura, e ainda assim fazer a dívida pública retomar sua trajetória declinante.

Qual será a variável de ajuste?

Se a Presidente insistir na contabilidade criativa, ou fizer o ajuste em cima do capital, o desânimo do setor privado aumentará (como se isso parecesse impossível) e o investidor externo passará a enquadrar o Brasil naquele grupo de países que convém evitar.

Nos anos 80, o então Ministro da Fazenda, Delfim Netto, foi execrado ao dizer que era preciso esperar o bolo crescer para depois dividi-lo. Hoje, o problema do Governo Dilma é que o fermento foge do bolo.

Mas como estamos todos no mesmo PIBinho, a partir de hoje o mercado financeiro torce para Dilma Rousseff. Mais precisamente, para a conversão de Dilma Rousseff. Torce para que a presidente demonstre ter o instinto de sobrevivência que lhe serviu durante a ditadura. Para que a presidente encontre um caminho ao centro, ouça as vozes ponderadas de sua equipe e reconheça as insuficiências do modelo atual.

Um sinal nesta direção, ainda vago e genérico, foi dado ontem à noite, mas não está claro se o “espaço de diálogo” se estenderá à gestão da economia. Nos próximos dias, a mensagem terá que ser afinada, e rápido.

Os nomes do novo Ministro da Fazenda e substituições no Tesouro e no Banco Central podem enviar uma mensagem poderosa aos mercados e transformar o vinagre em vinho, pelo menos no curto prazo.

Até lá, para os empresários cujo espírito animal foi abatido nos últimos quatro anos e hoje de manhã se sentem desolados, o único conforto talvez seja aquele conselho do velho Churchill, um homem forjado na adversidade: “Se você estiver atravessando o Inferno, continue caminhando.”