Pouco antes do Natal, o Presidente Lula disse que seu Governo não precisa de puxa-sacos, porque pode errar pensando que está acertando.

“Um governo não precisa de tapinha nas costas. Um governo tem que ser cobrado todo santo dia para que a gente consiga aprimorar a nossa capacidade de trabalho. Cobrem, cobrem e cobrem.”

Se a conclamação foi genuína, Lula deveria ficar alerta de que a Presidência da República cria um campo gravitacional próprio – um ímã para os baba-ovos e um repelente para quem fala verdades.

Só isso explica a impressionante quantidade de bobagens e declarações hostis que o Governo recém-empossado comete a cada dia contra o setor privado, que é quem gera a riqueza e os empregos do País.

Compreende-se, é claro, que o PT é um partido com diversas alas – das mais racionais às mais retrógradas – o que sempre vai gerar algum grau de cacofonia. Até aí, está no preço.

Compreende-se ainda que, mesmo pessoas que não possuem cargo executivo no Governo – como a presidente do partido, Gleisi Hoffmann – continuam sendo convidados a opinar nas GloboNews da vida sobre assuntos sobre os quais não possuem nem jurisdição nem competência.

Ainda assim, mesmo entendendo isso tudo, a quantidade de feridas auto-infligidas deste Governo convida à analogia com o personagem de quem ele diz ser a antítese: Jair Messias Bolsonaro, um Presidente que defenestrou seus críticos e afundou ao se entrincheirar com seus puxa-sacos.

É até difícil acompanhar e enumerar as declarações, atos e entrevistas que neste início de Governo transpiram irracionalidade econômica ou simplesmente uma volta ao passado – como se a catástrofe econômica da era Dilma fosse algo que dá saudade.

Uma hora, o novo ministro do Trabalho defende uma “revisão parcial” da reforma trabalhista – um avanço em relação à revogação completa que o PT propunha na campanha, mas ainda assim, preocupante.

Em seguida, o Governo tropeça numa medida provisória que parecia retirar atribuições da agência que regula o saneamento, trazendo insegurança jurídica ao setor e às demais empresas reguladas. Neste caso, o Governo se corrigiu hoje, pelo que deve ser aplaudido.  Não haveria nada mais desumano que dificultar – em nome de uma tara estatista – que o brasileiro tenha água tratada e esgoto encanado.

No mais recente devaneio, o Ministro da Previdência disse hoje querer discutir “a antirreforma da Previdência.” Carlos Lupi garante que a Previdência “não é deficitária, e vou provar com dados e informações.”

Como o déficit é uma questão matemática, e não de perspectiva, fica claro que o Ministro sofre do mesmo negacionismo que acometia o Governo anterior. Quem sabe, vai resolver o déficit com ivermectina.

Esse festival de besteiras que assola o País é ainda mais deprimente porque o Governo atual foi eleito com os votos decisivos do eleitor de centro, completamente fora do espectro petista, mas ainda assim indignado com posturas arrogantes e descabidas do mandatário anterior.

Tudo que o novo Governo fez até agora foi trair este voto de confiança, com propostas e ideias que só manterão os juros altos e desincentivarão o investimento.

Ou o Governo compreende isto e trabalha para reverter o jogo, ou arrisca jogar a economia num ciclo vicioso de pessimismo, desvalorização cambial e inflação – que certamente prejudicará o próprio Lula, com ou sem Bolsa Família.

Hoje de manhã, o Ministro Fernando Haddad disse que “está caindo a ficha” sobre a herança do Governo Bolsonaro, e que por isso os mercados estavam reagindo mal. Balela.

A ficha que está caindo é outra: a de que o Governo atual está longe do pragmatismo que se costumava atribuir a Lula, e que o rumo atual vai custar caro ao País.

“Se vocês não cobram, a gente pensa que está acertando. E muitas vezes a gente tá errando – e continua errando – porque as pessoas não reclamam,” Lula disse quando alertou sobre os puxa-sacos.

O Governo tem apenas três dias, mas por enquanto eles estão vencendo.