É verdade que os números da Petrobras sempre foram superlativos — mas, com o dólar a R$3,10, passaram a ser imponderáveis.

Entre 2015 e 2018, a Petrobras precisará de 484 bilhões de reais para executar seu plano de investimentos atual. Dilma Rousseff 

(A empresa recentemente cortou em cerca de 30% sua meta de investimento para este ano apenas, de US$39 bilhões para US$32 bilhões. Um novo plano de investimento, provavelmente com mais cortes, deve ser anunciado em junho.)

No mesmo período, a estatal também vai gastar 210 bilhões de reais amortizando sua dívida bruta, que, com o câmbio atual, chega a 330 bilhões de reais.

Assumindo que a estatal consiga rolar 100% da sua dívida (o que é razoável), que o dólar não suba mais (o que é improvável), e que a gasolina não sofrerá reajuste em quatro anos (uma estimativa conservadora), a Petrobras terá um ‘fluxo de caixa negativo’ de 190 bilhões de reais nos próximos quatro anos, ou seja, precisará levantar essa cifra para fechar suas contas ao longo do período.

Esta necessidade de financiamento pode ser atendida com um dos seguintes remédios (ou uma combinação deles):

1) uma garantia do Tesouro para novas emissões de dívida da empresa (o que complicaria ainda mais o quadro fiscal);

2) uma venda de ativos maior do que o pacote já anunciado;

3) aumentos de preço na gasolina e do diesel (que geram desgaste ao Governo);

4) um baita aumento de capital (seja com uma injeção direta de caixa ou uma conversão da dívida da empresa com os bancos estatais em novas ações).

A cada 1% que o real se desvaloriza, a Petrobras precisa aumentar os combustíveis em 2,5% — ou que o petróleo caia 5% — só para manter a situação atual (que já é muito apertada).

Em outras palavras, para compensar cada 10% de desvalorização do real, a Petrobras teria que aumentar os preços na bomba em 25% para não abrir um novo rombo em seu casco.

Tem mais: se o dólar passar um ano inteiro no patamar médio de R$3,25 e não houver aumento de gasolina durante aquele período, a Petrobras teria, naquele ano, um lucro próximo de… zero.

Qualquer pessoa de bom senso entende que um aumento de capital é parte da equação para fechar a conta, a despeito do novo CEO da empresa ter descartado a medida.

O problema é que o momento para uma emissão de ações é o pior possível, tanto pelos danos que a corrupção causou à empresa quanto pelo preço do barril, por volta de 55 dólares.

Além disso, qualquer pessoa de bom senso também sabe que o Governo preferiria enfiar um revólver na boca e puxar o gatilho do que privatizar a Petrobras — não só porque as razões do partido são maiores que as razões de Estado, mas porque falta a este governo o pragmatismo de outros regimes.

Mas há um jeito de fazer a coisa certa e ainda assim manter as duas aparências que interessam ao Governo: o compromisso com a propriedade do Estado e a fantasia, pueril e popular, de que o petróleo é nosso.

A Petrobras pode continuar estatal, mas tem que encolher.

EMPRESAS-BR

A tabela acima mostra três áreas de negócio da Petrobras que poderiam ser vendidas, para o bem da empresa e com consequências positivas para toda a economia.  Como neste momento talvez seja difícil encontrar compradores entre as grandes empresas internacionais, a Petrobras poderia simplesmente separar estas áreas e abrir seu capital na Bolsa, vendendo, digamos, 49% de cada negócio e ainda assim mantendo o controle.

Para evitar que estas empresas fiquem sujeitas às mesmas ingerências políticas que colocaram a Petrobras de joelhos, elas deveriam ser listadas no Novo Mercado (“uma ação, um voto”), e seus acionistas minoritários deveriam ter não apenas representação máxima no conselho como também poderes de veto.

Estas três áreas — a Gaspetro, a Transpetro e a BR Distribuidora — não são parte do negócio principal da Petrobras de achar e extrair petróleo, e sua venda ou IPO seria uma fonte de recursos que a Petrobras, hoje, não conseguiria achar em lugar nenhum. Conversando com analistas e investidores, VEJA Mercados tentou estimar o valor de cada negócio usando múltiplos de venda iguais aos de empresas parecidas. Assim, a BR Distribuidora foi comparada com a Ultrapar; a Gaspetro, com a Comgás; e a Transpetro, com uma mistura de empresas americanas donas de navios e oleodutos. (É evidente que as comparações são imprecisas, mas elas fornecem uma ordem de grandeza.)

A venda de 100% destas três empresas poderia levantar cerca de 90 bilhões de reais para a Petrobras — quase o seu valor de mercado atual, que está em 111 bilhões.

Mas haveria benefícios adicionais.

A Petrobras é hoje uma empresa verticalizada. Isso significa que ela controla toda a cadeia de petróleo: ela é dona do poço ao posto BR, passando pelo oleoduto, pelas refinarias e pela petroquímica. É tudo dela.

A Petrobras também é uma empresa horizontalizada. Isso significa que ela está não apenas no petróleo, mas também no gás natural e no etanol. E, em todos estes mercados, quando ela não é o único participante (caso do gás), ela é o gorila que determina preços e condições de mercado, impedindo que uma fonte de energia concorra com a outra, o que levaria a preços mais baixos ao longo do tempo.

Em outras palavras, a Petrobras ‘vertical’ faz mal a si mesma, e a Petrobras ‘horizontal’ faz mal ao País.

Simplesmente vender uma Gaspetro ou Transpetro para uma empresa internacional equivaleria a privatizar um monopólio que a Petrobras exerce de fato. O Governo deveria, antes, dividir cada uma delas em duas ou três empresas, para com isso fomentar a concorrência. (A venda da BR inteira não criaria um problema concorrencial.)

O Governo Dilma 2 está apenas no começo, e está claro que não conseguirá atravessar quatro anos preso a uma narrativa de consertos marginais para um modelo que está errado no atacado.

Governos vivem de vender sonhos e entregar conquistas. No passado, o Planalto fazia o brasileiro sonhar com programas como o PAC, o FIES, e o Minha Casa Minha Vida.

Esse ciclo se esgotou, porque o dinheiro do Estado acabou. Para um recomeço — que é a chave de sua própria sobrevivência — o Governo vai precisar encantar o setor privado e mobilizar sua capacidade de investimento.

Um redesenho profundo da Petrobras quebraria a narrativa atual — sem prejuízo das investigações e do trâmite dos processos criminais em curso — e traria benefícios difusos para a economia, aumentando sua competitividade.

A “nova Petrobras” teria um balanço mais leve e mais capacidade de se financiar. Os negócios vendidos teriam capacidade de investir e de manter ou gerar empregos. Seria um ganha-ganha num jogo onde hoje todo mundo está perdendo.

Mas para isto, o Planalto precisa sair do imobilismo e ter a coragem de testar novas ideias.

Para os observadores mais céticos, isto vai parecer quase impossível — mas neste momento, o que, exatamente, essa Presidente tem a perder?