“Tempo é dinheiro,” ensinava Benjamin Franklin no século 18. O uso racional do tempo, porém, exige uma compreensão dos limites humanos que parece ter se perdido nesta era de multitelas e multitarefas.

O hábito de esticar as horas de trabalho em noitadas sem fim, por exemplo, não só faz mal à saúde como pode ser contraproducente. É o que demonstra o neurocientista inglês Russell Foster, em O Ciclo da Vida (tradução de André Fontenelle; Objetiva; 432 páginas).

Ao longo do livro, Foster, que é professor em Oxford e dirige o Instituto de Neurociência do Sono e Ritmos Circadianos, insiste na importância de horários regulares de trabalho e descanso. O sono inadequado aumenta os riscos de desenvolver diabetes, obesidade, Alzheimer e até alguns tipos de câncer, entre outras doenças.

O impacto econômico da falta de sono ainda não está tão bem documentado, mas já há estudos indicando problemas de desempenho entre junior traders da Goldman Sachs e banqueiros do Reino Unido submetidos a rotinas de trabalho extenso.

Uma pesquisa mais ambiciosa realizada na Austrália, entre 2016 e 2017, estimou o custo que o sono deficiente teve para a economia nacional: 26 bilhões de dólares australianos, em um ano no qual o PIB do país foi de 1,5 trilhão.

Os “ritmos circadianos” que Foster estuda em seu laboratório são mecanismos que regulam várias funções corporais ao longo do dia. “Circadiano” vem de circa, palavra latina para “cerca de”, pois esses ciclos biológicos não são exatos – duram em torno de 24 horas.

Foster explica os complexos mecanismos moleculares que permitem que as células do corpo regulem, por exemplo, a secreção apropriada de hormônios para cada hora do dia.

Temos não só um, mas vários relógios biológicos. Diferentes órgãos, como fígado e pâncreas, têm sua própria marcação de tempo. Há, no entanto, um relógio mestre que coordena todos os demais, localizado em uma região do cérebro chamada de núcleos supraquiasmáticos (NSQ). 

O Ciclo da Vida traz matéria farta para o interessado em ciência aprender sobre os ritmos biológicos e as diferentes fases do sono. Também ensina formas simples de aproveitar melhor o dia e preservar a hora do descanso.

Abaixo, o leitor encontrará um apanhado das principais dicas de Foster. Talvez nem todas sejam adaptáveis à sua rotina. Mas vale tentar algumas mudanças, por uma vida melhor, mais longa e mais produtiva.

Tempo, afinal, não é só dinheiro.

RESOLVENDO PROBLEMAS

Os mercados não funcionam de acordo com seu ritmo circadiano, infelizmente. Se possível, porém, tente concentrar as decisões mais difíceis entre o fim da manhã e o início da tarde. 

É nesse período que as capacidades cognitivas dos adultos estão mais afiadas – na média, claro: há diferenças de um indivíduo para o outro.

Já a inteligência do adolescente só desperta plenamente algumas horas mais tarde. A maioria das escolas, no entanto, começa suas atividades de manhã cedo – o que é, argumenta Foster, um equívoco.

EVITE O CORUJÃO

Nossa retina tem receptores especializados que medem a luz solar para ajustar nosso relógio biológico – e não estão relacionados à nossa visão.

A não ser que o trabalhador noturno consiga evitar completamente a luz da manhã, seu ritmo biológico não vai se ajustar à rotina. 

Há medidas paliativas, como instalar luz forte no local de trabalho. A longo prazo, porém, haverá estrago. Obesidade, depressão, problemas cardíacos, derrames são algumas condições que afligem com maior frequência quem faz o turno da noite.

Foster é taxativo: “nosso relógio biológico não se adapta às exigências do trabalho noturno”. 

JET LAG

Em viagens de longa distância, o ideal é reservar alguns dias para se aclimatar ao novo fuso horário. Como isso nem sempre cabe na agenda ou no orçamento, a alternativa é se ajustar ao novo fuso regulando a exposição à luz solar: quando viajar para o oeste, busque a luz matinal; se viajou para leste por mais de seis ou sete fusos, evite sair de manhã e procure a luz da tarde.

PREPARAÇÃO PARA O SONO

O sono é essencial para a consolidação das memórias do dia que passou e para a boa disposição no dia seguinte. Foster dá dicas bem simples para manter uma cultura do bom sono.

À noite, só refeições mais leves, e sem cafeína. Também se deve evitar o exercício físico muito perto do horário de dormir. Na conversa de alcova com o parceiro ou parceira, só assuntos triviais – nada de discutir problemas profissionais ou financeiros. 

O celular deve ser deixado de lado meia hora antes da hora de dormir. A luz não chega a ser alta a ponto de alterar o ajuste do relógio biológico – mas vídeos, emails, redes sociais e jogos eletrônicos excitam o cérebro, favorecendo um estado de vigília.

A luz ambiente, esta sim, deve ser suave. E isso vale não só para o quarto, mas para o banheiro, que costuma ser o último cômodo que visitamos antes de ir para a cama.