Depois de toda a turbulência causada pela guerra da Ucrânia e a explosão do preço do barril, o governo federal saiu da letargia e apresentou, digamos, saídas.
Que estas saídas resolvam o interesse eleitoral do Planalto – e não o problema conjuntural do setor – talvez seja apenas um detalhe.
O coelho que o Governo tirou da cartola para “resolver” a alta dos combustíveis, que pressiona a inflação e mina sua popularidade, é uma saída política digna de Maquiavel – afinal, quem pode ser contra baixar impostos? Sem falar no bônus adicional da narrativa: o Presidente Bolsonaro é “o cara que quer resolver”, e os governadores, esses caras “chatos” que não querem cooperar.
Acontece que a distância entre o expediente político e as soluções reais costuma ser um abismo.
Num duplo twist carpado fiscal, o Presidente e o Ministro Paulo Guedes anunciaram um “subsídio” – sem chamar a coisa pelo nome.
A base do pacote é o PLP 18, que fixa a alíquota do ICMS (o imposto estadual) em no máximo 17% para todos os combustíveis.
Na sequência, o Governo quer aprovar uma PEC zerando o ICMS sobre o diesel e o gás de cozinha e ressarcindo a perda de arrecadação dos estados até o limite dos 17% com recursos da União – noves fora a chance de calote. Além disso, a PEC zera o PIS/Cofins e a CIDE da gasolina e o PIS/Cofins do etanol.
Como boa parte dos anúncios feitos pelo Ministério da Economia, as previsões retumbantes sobre uma redução dos preços podem não passar de quimeras eleitorais. (Quem não se lembra da promessa de que o preço do gás iria cair 50% quando fosse aprovada a Nova Lei do Gás?)
Aprovar uma PEC exige um capital político enorme: 3/5 dos votos em dois turnos na Câmara e no Senado. Se tudo for aprovado, poderia haver uma redução do preço para o consumidor final de algo como 10% na gasolina e de 13% no diesel – isso se tudo for repassado ao consumidor. (Vale lembrar: no Brasil, o preço dos combustíveis é livre.)
Como sempre, o Governo focou em gerar a headline mas não pensou nos detalhes. Qual seria o limite desse ressarcimento? Segundo o Ministro da Economia, o programa deve custar algo em torno de R$ 25 a R$ 50 bilhões (nada como a precisão da estimativa).
Outro ponto que parece ter sido jogado para debaixo do tapete é o etanol. Ao zerar o PIS/Cofins e a CIDE da gasolina – que juntos representam 90 centavos – e ao mesmo tempo zerar o PIS/Cofins do etanol (que é de 24 centavos), o governo tira a competitividade do etanol.
A situação é bizarra: em meio a uma das maiores crises energéticas da História, um Governo pega um combustível renovável amplamente disponível e escalável, e, em vez de incentivá-lo, mata-o no berço. É o contrassenso do ano.
Mas haveria outra saída?
Ao invés de reduzir impostos de forma generalizada, o Governo poderia fazer programas sociais focalizados nos setores mais expostos: caminhoneiros, motoristas de aplicativos, e as famílias que recebem o auxílio-gás.
Infelizmente, essa solução focalizada (mais barata para o Tesouro) não teria o efeito midiático de redução dos preços na bomba e não transferiria a culpa para os governadores. Seria mais justo? Claro que sim.
Ao atacar a consequência e não as causas da alta dos preços, o governo federal subsidia não só os mais pobres, mas todos de forma indiscriminada.
A Faria Lima vai andar nos SUVs a diesel com combustível mais barato, enquanto em Angra uma lanchaciata vai comemorar o mais novo subsídio à indústria náutica.