Recibos de reembolso duplicados, pacientes que já faleceram ainda solicitando consultas (assim como médicos mortos que assinam notas a serem ressarcidas) e parentes de segurados fazendo consultas em nome dos clientes.
Fraudes como essas ajudam a causar o rombo bilionário do setor de saúde suplementar, que teve um prejuízo de R$ 12 bilhões no ano passado.
Este também é o mais novo nicho que a Neurotech – uma empresa que utiliza inteligência artificial e big data para otimizar a concessão de crédito – quer atacar.
Usando deep learning e fazendo cruzamento de dados de fontes públicas e privadas, a Neurotech, que foi comprada pela B3 no fim do ano passado, está conseguindo identificar fraudes e fazer com que as operadoras percam menos.
Nos primeiros testes que fez com seguradoras, a empresa conseguiu identificar 60% mais fraudes em um dado cliente, e o montante recuperado cresceu 700%.
“Tivemos casos de clientes que chegaram a devolver R$ 80 mil por fraudes que conseguimos detectar,” o fundador e CEO da Neurotech, Domingos Monteiro, disse ao Brazil Journal.
Um estudo de 2019 do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS) e da PwC aponta que as fraudes custam R$ 20 bilhões/ano ao setor de saúde suplementar.
A indústria estima que 35% dos pedidos de reembolso aprovados a cada ano – que somaram R$ 11 bilhões em 2023 – contêm algum tipo de fraude ou irregularidade.
“No setor de saúde, ‘cada enxadada é uma anaconda’,” disse Marco Antunes, o vice-presidente de inteligência para saúde da Neurotech.
Marco entrou na empresa há três meses para tocar a operação. Ele conheceu Domingos durante a fase de testes da ferramenta na SulAmérica, onde foi o vice-presidente de operações.
Foi ele que ajudou Domingos a entender onde a tecnologia da Neurotech poderia ser aplicada na saúde.
Antes, a empresa queria atuar na saúde preventiva: cruzando os resultados de exames dos pacientes com a base de dados da seguradora, seria possível identificar a propensão individual a desenvolver doenças crônicas.
Desta forma, a operadora conseguiria agir de maneira preventiva para evitar que essas doenças se desenvolvessem mais rápido – uma maneira também de conter a sinistralidade.
“Apesar de resultados muito bons na identificação, percebemos que essas áreas têm uma curva longa para gerar resultado,” diz Domingos. “E aí apareceu a oportunidade de atuarmos mais na eficiência operacional.”
Como o setor teve 1,5 bilhão de atendimentos, 700 milhões de internações e 235 milhões de consultas (dados de 2022), é impossível que as operadoras consigam identificar as fraudes sem algum tipo de tecnologia – o que torna esse tipo de ferramenta altamente escalável.
A entrada na saúde faz parte de um esforço de diversificação da Neurotech, que nasceu voltada para os serviços financeiros.
A B3 pagou R$ 620 milhões pela companhia de tecnologia, mas há mais R$ 520 milhões em earnouts se a Neurotech atingir certas metas de desempenho.
Mesmo não sendo mais o dono do negócio, Domingos disse que crescer virou uma obsessão ainda maior.
“O pessoal aqui brinca que nunca me viu tão sharp com essa compra da B3. Pela primeira vez na história, nós temos prazo, meta e um incentivo de longo prazo, que é o earnout,” disse.